Em seu oitavo ano na China, o jogador brasílico Oscar, 32, se prepara para ir embora. “Eu senhor cá, senhor Xangai, mas é muito longe, não tem porquê a gente permanecer cá”, diz ele, em seu apartamento no província de Pudong, diante do rio Huangpu.
“Minha mãe está ficando mais velha, minhas irmãs estão tendo filhos, a gente quer estar perto.” Ele e sua mulher são de Americana, no interno de São Paulo, onde vivem as mães de ambos.
Há outros motivos. Seu contrato com o Shanghai Shanggang (em inglês, Shanghai Port) termina no término do ano, com pouca chance de renovação. “Agora tem limite salarial, portanto é mais difícil”, diz.
Estrela da liga chinesa de futebol, vencedor no ano pretérito e líder neste, Oscar foi um dos últimos estrangeiros contratados pelas regras anteriores, que não limitavam salário. Na quadra, trocou o Chelsea, de Londres, por Xangai e pelo terceiro maior salário de jogador no mundo, segundo a prelo inglesa –em 2020, a Forbes apontou que seu salário era de US$ 25 milhões por ano (R$ 141 milhões).
“Tem outros clubes, do Brasil, da Europa, do Qatar. Vou esperar o término do ano e sentenciar.” Deve fazê-lo em novembro, quando acaba a temporada chinesa, no dia 2. Está sob expectativa. “Eu e minha esposa ficamos ansiosos para ver para onde a gente vai. A gente está cá há sete, oito anos, é uma mudança grande. Quando antes a gente souber é melhor.”
O Shanggang passou a oferecer um posto na governo do clube, para quando fechar a curso, o que Oscar vê ainda distante. “Tenho carinho com o clube, já ajudei em outras coisas cá. Quando concluir [o vínculo atual] eu fico em contato com o time cá. Pode ser um projecto para o horizonte.”
Deu indicação de estar entre Brasil e Europa, sem referir os clubes que apresentaram interesse ou confirmar a especulação –de anos– sobre uma transferência para o Flamengo. Tem esperança de, mais visto, voltar a ser convocado para a seleção, porquê Lucas Moura, que começou com ele na base do São Paulo.
“Sei que daqui da China é muito difícil”, diz. “Se for falar de qualidade, minha e dos que estão lá, não perco zero. Mas sei que na China a visibilidade é muito menor, não se transmite. O pessoal não sabe porquê eu estou.” Sua saída para o Campeonato Brasílio ou uma liga europeia ajudaria.
“Na Europa ou no Brasil, que têm mais visibilidade, com certeza teria mais chance. Mas eu conheço muito muito o Dorival [Júnior, treinador da seleção], é um camarada que fiz no futebol.” Ele foi dirigido pelo técnico quando estava no Internacional, de Porto Prazenteiro.
“Conheço também o Lucas [Silvestre], rebento dele, que trabalha junto [como um dos auxiliares técnicos]. Desde o Inter a gente era camarada pessoal, assistia, foi para minha morada quando estava no Chelsea. E depois esse incremento do Dorival, fico feliz que ele está na seleção.”
Sobre Lucas Moura, o jogador, diz que hoje não tem contato, mas que no São Paulo foram “da mesma categoria, sempre, amigos”, e que vê sua convocação porquê um sinal.
“Mostra para a nossa geração que pode, né? Quem está muito, quem estiver num clube bom, volta para a seleção. Porque realmente a qualidade da nossa geração foi muito boa, jogadores muito supra da média. E todos provaram, a curso do Lucas é linda, do Neymar, do Casimiro, a minha, do Danilo.”
Ele volta a confrontar. “Gerações de hoje são diferentes da nossa. Não é que vai ficando pior, o futebol vai mudando, evoluindo. Logo, jogadores que têm aquela arranque formosa do Lucas, o Casimiro que joga com a cabeça erguida, eu com os passes, isso vai cada vez mais diminuindo. Hoje é muita correria, lucrar jogo de um a zero. Acaba tirando o talento um pouquinho de fora e daí faz falta.”
Sua posição em privado, de meia, ele vê sob risco de vanescer. “Não só na seleção, nos times brasileiros, mas nos times em universal no mundo, é difícil ter essa posição. Mas tem grandes jogadores ainda, que fazem papéis incríveis. Um face que jogou comigo e que faz isso muito muito é o [belga] Kevin De Bruyne. O jeito de ele jogar não tem em outros times. Ele joga para dar o passe final.”
Vendendo seu próprio peixe, Oscar diz ser “um meia que gosta de jogar com a globo, mas também sabe tutelar, um pouquinho mais moderninho”.
Questionado sobre o 7 a 1, a rota para a Alemanha na semifinal da Despensa do Mundo no Brasil, em 2014, diz que “aquilo foi um eventualidade, que nunca mais vai ocorrer”. “É difícil até da gente que jogou explicar porquê foi”. Diz que, mais do que marcar o único gol daquele jogo, ficou entre os 11 melhores do torneio –e que aquele time de 2014 foi a única que chegou às semifinais nas últimas Copas.
“Perder do jeito que a gente perdeu foi marcante, mas a maioria conseguiu dar a volta por cima já faz bastante tempo”, acrescenta.
Não é vulgar ele estar até hoje no futebol chinês. O torneio lugar chamou atenção do mundo todo há muro de uma dezena, quando começou a contratar a peso de ouro craques internacionais. Carlitos Tévez, Alex Teixeira e Hulk foram alguns dos atletas atraídos pela liga lugar, além dos técnicos Fabio Capello e Felipão. Nos últimos anos, porém, os investimentos bilionários foram minguando, os grandes astros saíram, e o país deixou de ser um mercado tão chamativo. Oscar, porém, permaneceu.
O legado da quadra de vagas gordas é questionável no futebol do país: a China acaba de perder do Japão por 7 a 0 nas eliminatórias asiáticas, e Oscar diz que “a seleção deles não vem muito”. Os jogadores, avalia, “são bons nos times, mas quando junta na seleção, parece que não se encaixam”.
Daí ele concordar a decisão chinesa, do início deste ano, de investir no futebol de base. “Todos estes anos em que estou cá, dificilmente vejo um menino se primar. Tem chinês muito bom, mas são mais velhos. O principal deles é o número 7, o Lei, que joga no nosso time e é o bombeiro do campeonato. Só que, quando chega lá na seleção, o pessoal quer que ele faça tudo. Ele é para fazer gol. Daí joga mal.”
Já entre clubes “os jogos são bons, tem times em que as torcidas são muito boas, a do Beijing Guoan é uma delas, 40 milénio, 50 milénio pessoas todo jogo, a nossa também, e os estádios são novos, muito bonitos”. Nesta reta final, a disputa do Shanggang é com o outro time da cidade, Shanghai Shenhua, que está a exclusivamente dois pontos. Chengdu e Guoan vêm depois, muito detrás.
O que vai fazer mais falta, saindo de Xangai, é a segurança. “É uma segmento que vai tarar bastante porque, para onde eu for, não vai ser igual cá, não adianta”, diz Oscar. “A qualidade de vida que tem na China não tem no mundo, eu nunca vi, nem na Europa.”
Ele tem uma filha de 10, um rebento de 8 e outro de um ano e meio, os três falando mandarim. “Meus filhos vão e voltam da escola de ônibus, tranquilo. A gente pode transpor cá duas, três da manhã, ir a qualquer lugar e zero vai ocorrer. Não tem droga cá. É uma coisa de outro mundo, só quem está cá, vive cá, sabe porquê é.”
Na China, Oscar se sente livre.