A Substância Espelha Vida De Demi Moore E Ataca O

A Substância espelha vida de Demi Moore e ataca o etarismo – 17/09/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Era uma vez uma diva, sinônimo de formosura e sensualidade, que se frustra ao ver sua juventude vangloriar, enquanto uma mulher mais jovem toma o posto da mais bela do reino não tão seduzido de Hollywood.

Porquê acontece com a feitiçeira de “Branca de Neve e os Sete Anões”, basta uma olhada no espelho para a protagonista de “A Substância” perceber que seus anos áureos ficaram para trás. Num aproximação de raiva, ela esfrega o batom vermelho pela face, repuxa as maçãs do rosto e prende o cabelo com força, antes de tomar uma medida drástica.

Novamente uma vez que a vilã do raconto de fadas, Elisabeth Sparkle decide recorrer a um estranho tipo de veneno para retomar seu posto, no aguardado filme de Coralie Fargeat. Mas a moral cá é outra, já que no universo feminista da diretora francesa, bruxas e princesas poderiam conviver em simetria, não fosse a violência do patriarcado à sua volta.

“Fazer um filme uma vez que nascente é uma experiência catártica”, disse ela posteriormente a aplaudida estreia de seu filme no último Festival de Cannes, em maio. “É uma mistura de muitas coisas que quero expor, de uma raiva que sinto, de tudo o que vivi enquanto mulher. E o cinema de gênero foi o que me permitiu mostrar isso, ao mesmo tempo em que proporciono uma experiência de entretenimento.”

Na sarau VIP que encerrou o evento, Fargeat comemorou o prêmio de melhor roteiro que venceu dançando noite adentro, balançando seu pequeno troféu numa mão e o copo de bebida em outra. Um grande feito para uma cineasta que ainda está em seu segundo longa, sete anos depois do também elogiado “Vingança”, outro violento manifesto feminista.

“A Substância”, que chega nesta semana aos cinemas antes de estrear na Mubi, narra a história de Elisabeth Sparkle, estrela do cinema e da TV que, de polainas, acaba comandando um programa de ginástica aeróbica, uma vez que os que ganharam popularidade nos anos 1980, conforme Hollywood deixa de procurá-la para novos papéis.

Ela não está infeliz, mas isso muda quando o diretor da emissora para a qual trabalha decide trocá-la por uma apresentadora mais jovem. Com raiva, ela atende o telefone para ouvir uma voz misteriosa que oferece a ela a tal substância do título, capaz de deixá-la mais jovem, mas com um porém –seu corpo é o mesmo, e se alterna entre a versão novinha e a mais velha toda semana.

Não lentidão muito até ela permanecer obcecada com a novinha, que a leva a desrespeitar a bula do “ativador” e fazer do filme um “body horror” –um terror a partir de violações gráficas do corpo humano, uma vez que os de David Cronenberg, uma de suas influências e com quem competiu em Cannes.

Mas não é só a trajetória de Branca de Neve que “A Substância” emula. A presença de um retrato seu reluzente, na parede da sala, remete a “O Retrato de Dorian Gray”, e a relação tóxica entre fundador e indivíduo ecoa “Frankenstein”. “É um filme que bebe de muitos mitos que criamos para mourejar com o roupa de que vamos todos rematar um dia, de que nossa exigência fundamental enquanto seres humanos é sermos mortais”, diz Fargeat.

E há paralelos também com a vida real –no caso, a de Demi Moore. Objeto de libido na Hollywood dos anos 1980 e 1990, a estrela de “Ghost” caiu no ostracismo nas últimas duas décadas, e viu sua aspecto ser criticada pelo público, aos 61 anos de idade.

Cirurgias plásticas mudavam seu rosto diante das câmeras, enquanto Moore claramente cedia à pressão de uma indústria que, historicamente, espalha o machismo e o etarismo por meio de produções que reforçam padrões de formosura inatingíveis e papéis de gênero engessados.

Seu retorno triunfal não poderia ser mais significativo, portanto. “A Substância” é uma vez que “Birdman” ou “Ocaso dos Deuses”, filmes sobre Hollywood em que a arte imita a vida de seus protagonistas –no caso, Michael Keaton e Gloria Swanson.

Apesar da poderosa torcida, Moore ficou sem o troféu de atriz do Festival de Cannes, que acabou nas mãos do quarteto feminino do músico “Emilia Pérez”. Uma indicação ao Oscar, porém, não parece delírio, ainda mais para um nome tão querido pela indústria e nunca lembrado pela premiação.

A história de subida e queda de Elisabeth Sparkle e também de Moore é comparável à de muitas divas hollywoodianas que, ao envelhecer, viram os bons papéis desvanecer. Isso tem mudado, graças à decisão de nomes uma vez que Nicole Kidman e Viola Davis de abrirem suas próprias produtoras, mas o machismo e o etarismo ainda são ameaças, uma vez que repetem frequentemente.

Em “A Substância”, o tratamento diferenciado oferecido a elas é mostrado com afetação, por meio do personagem de Dennis Quaid, o sórdido diretor de emissora que demite a protagonista. Na mesma fita etária, ele não se preocupa com a própria aspecto, é antipático e tem hábitos de vida longe de saudáveis. Já ela está com o skin care em dia, sorri para todos e tem na ginástica a sua profissão.

“Leste filme é qualquer coisa menos convencional, logo eu precisava de alguém disposto a decorrer riscos, a se expor. Quando li a biografia de Demi Moore, vi o quão poderoso, pioneira e inteligente ela precisou ser para velejar nessa indústria. Era a escolha perfeita”, diz Fargeat sobre a novidade musa.

Folha

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