Na semana passada, falamos nesta poste sobre Oxóssi, o orixá da independência, regente das matas e da caça farta. Já nesta semana, falaremos dela, a dona das cachoeiras, que tanto nos ensina sobre o poder do autoamor: Oxum. Muitas histórias são contadas sobre essa grande feiticeira, que se destaca sempre quando aparece.
Um de seus itãs mais conhecidos fala sobre seu poder de fazer prosperar o mundo. Uma vez que está exposto na obra “Mitologia dos Orixás”, logo que o mundo foi criado, todos os orixás vieram para a Terreno e começaram a tomar decisões e dividir encargos entre eles, em assembleias nas quais somente os homens podiam participar.
Oxum não se conformava com essa situação. Ressentida pela exclusão, ela se vingou dos orixás masculinos e condenou todas as mulheres à esterilidade, de sorte que qualquer iniciativa masculina no sentido de fertilidade estava fadada ao fracasso. As águas secaram, e a terreno se tornou árida. Por justificação disso, os homens foram consultar Olodumare, pois estavam muito alarmados e não sabiam o que fazer. Estavam sem filhos para fabricar, nem herdeiros para quem deixar suas posses, sem novos braços para fabricar riquezas e fazer as guerras e sem descendentes para não deixar morrer suas memórias.
Olodumare soube, logo, que Oxum fora excluída das reuniões. Ele aconselhou os orixás a convidá-la, e às outras mulheres, pois, sem Oxum e seu poder sobre a feracidade, zero poderia ir adiante. Os orixás seguiram os sábios conselhos de Olodumare e, assim suas iniciativas, voltaram a ter sucesso. As mulheres tornaram a gerar filhos, e a vida na Terreno prosperou.
Na sociedade brasileira, as mulheres não estão sendo convocadas para se sentar às mesas de decisão, inclusive sobre temas relacionados aos direitos sexuais e reprodutivos. O monstruosidade é criminalizado e, mesmo nos casos de monstruosidade lícito, mulheres e meninas estão tendo seus direitos violados —um juízo de homens decidindo o rumo de tudo. Homens com temor que mulheres possam escolher parir ou não, pois o controle da sexualidade está diretamente ligado à produção de mais mão de obra para fazer funcionar as engrenagens do sistema numulário.
Não nos enganemos. Descriminalização do monstruosidade não é uma tarifa de costumes, porquê querem nos fazer crer. É um debate sobre economia, sistema previdenciário, um debate fundamentalmente político. Só que, inversamente ao itã de Oxum, as mulheres seguem sendo enclausuradas em um rumo imposto por homens. Sejam eles de esquerda ou de direita, as mãos se unem para fechar acordos que seguem violando a nossa liberdade.
As mulheres seguem confinadas em uma situação, parafraseando Simone de Beauvoir, que impede suas transcendências. São forçadas a parir, mesmo quando vítimas de estupro, morrem em clínicas clandestinas de monstruosidade, sofrem com a violência doméstica e sexual. E o país não prospera. Não há prosperidade verosímil quando mais da metade da população, salvo raras exceções, segue fora dos conciliábulos e sendo tratada porquê cidadãs de segunda classe.
A taxa de feminicídio e violência sexual no Brasil é tão subida que deveria pautar as políticas em todos os níveis. Mas não é o que vemos. No Brasil, Oxum segue sendo ignorada pelos homens que estão no poder. E os fantasmas do retrocesso estão assombrando e voltando, banhando-se no sangue entornado. Os homens seguem não ouvindo Olodumare.
Mas nós, mulheres, podemos aprender com a sabedoria de Oxum e assumir o poder que temos, ao contrário do que querem nos fazer crer. A união das mulheres sempre foi vista porquê perigosa por uma ótica patriarcal, pois aí está a base de um poder úbere. Assim porquê Oxum, devemos nos olhar no espelho para trabalhar o autocuidado. Oxum, antes de cuidar de seus filhos, limpa as suas joias.
Devemos ter a coragem para olhar no mais profundo de nossos seres e isso significa proferir ter a coragem de enxergar o que é mal-parecido, porquê a reprodução do machismo. Há de se ter coragem para assumir as nossas sombras e não repassar dores. Uma mulher ferida fere outras mulheres. Já uma mulher que procura a tratamento vai olhar com nobreza e paixão para as outras.
Podemos nos concordar e aprender a levantar da mesa quando nossas vozes não são ouvidas, romper com o pacto da agradabilidade e docilidade que nos separa entre as que são bem-vindas e as que são “non gratas”. Cria-se a rivalidade, um final estreito em que poucas conseguem passar para que não nos esbaldemos na saciedade das águas que caem das cachoeiras. Os homens sempre temeram as trombas d’chuva.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul aquém.