Alok Foge Do Manifesto Político Em Disco Com Indígenas

Alok foge do manifesto político em disco com indígenas – 18/04/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Há quase dez anos, em 2015, Alok saiu de São Paulo e viajou por 28 horas até a povoado dos indígenas yawanawá, no Acre. Ele sofria de depressão e buscava respostas sobre o sentido da vida. Seis anos depois o DJ passou por outra crise existencial, se perguntando para onde apontava seu direcção.

O horizonte é avito, foi a resposta que alcançou. Alok transformou isso num mantra e também no título do seu primeiro disco, lançado nesta sexta-feira (19), quando é festejado o Dia Internacional dos Povos Indígenas. O álbum reúne nove faixas que mesclam as batidas de Alok aos cantos entoados por representantes de oito etnias.

“Porquê produtor, consigo ser uma plataforma para potencializar as vozes dos indígenas e fazer exatamente o que eles querem. O disco é uma forma de reflorestar as mentes das pessoas e de ressignificar o imaginário coletivo. Quero semear ideias”, diz o músico por videoconferência.

Estão no álbum vozes das tribos huni kuin, kariri xocó, guarani mbyá, xakriabá, guarani-kaiowá, kaingang, guarani nhandewa, além dos yawanawá, que provocaram uma epifania em Alok no pretérito.

“Enquanto eu trabalhava para chegar às paradas de músicas mais tocadas, eles estavam fazendo canções com intenção de sanar e levar sua espiritualidade adiante. Perceber isso me transformou.”

É justamente um poema dos yawanawá que abre o disco. “Sina Yaishu” fala sobre a dedicação da tribo em vincular a ancestralidade às novas gerações. Na filete seguinte, “Pediju Kunumigwe”, são os guarani nhandewa quem fazem apelo aos jovens, pedindo que se unam por um horizonte de sossego. Suas vozes ecoam por cima da mixagem de Alok.

Estas e outras faixas do álbum são cantadas nas línguas dos indígenas, desconhecidas da maioria dos brasileiros. O DJ discorda que isso possa tornar o disco cifrado e atrapalhar seu desempenho —o problema para Alok seria forçar os indígenas a trasladar os cânticos para o português.

“Eu criaria uma intervalo entre eles e o que querem expressar, que é a origem da paragem. Porquê não estou preocupado com a questão mercadológica, fiquei mais próximo das raízes indígenas.”

“O Porvir é Ancião” de vestuário tangencia exigências do mercado. Não só pelas línguas pouco conhecidas, mas também porque trata de temas filosóficos e de dores que atravessam grupos específicos. Em zero se parece às composições simples e repetitivas que viralizam hoje em dia, feitas a toque de caixa —e que já integraram o catálogo do próprio Alok no pretérito.

Não é que ele esteja despreocupado com sucesso ou alheio à indústria pop, mas agora seu ansiedade é outro. “Estou fazendo músicas que sejam atemporais, não me importa se vão para no top 10 ou não.”

É um movimento perigoso para o primeiro disco de alguém que passou anos colado às tendências, apostando em músicas com potente apelo mercantil. Alok explodiu há oito anos, com a filete “Hear Me Now”, e a partir dali enfileirou hits. Mas nunca se preocupou em fechar álbuns.

“Rapnativo” parece ser a filete com mais potencial de furar a bolha pela sonoridade próxima ao que figura nas principais playlists de rap das plataformas de streaming. A voz é do rapper O͛werá, indígena da tribo guarani mbyá.

Há ainda outra música de rap, com “flow” mais pesado e versos de caráter político entoados pelo grupo Brô Mc’s, considerado o primeiro grupo de rap indígena do país. Cantada em guarani, eles fazem uma súplica pela preservação das terras.

Há um recado em português. “A gente grita e ninguém nos ouve/ aprendi a sua língua, não indígena, essa é pra você/ quanta tristeza e pobreza andam lado a lado dentro de um barraco caindo aos pedaços/ passando lazeira, sem perdão, bebendo só chuva suja, com a roupinha furada.”

O disco é repleto de temas políticos. Em “Manifesto Porvir Ancião”, por exemplo, a deputada federalista Célia Xakriabá, que também é professora e ativista, discursa sobre a vexação da cultura indígena. “Nós estamos sendo sufocadas pelo Congresso Vernáculo/ antes do Brasil da grinalda, existe o Brasil do cocar/ o horizonte é avito”.

Alok recusa a teoria de que o disco seja um manifesto político, embora diga ter incentivado os indígenas a cantarem suas aflições. “Toda vez que se toca nessa paragem [política], você cria muros e separa cada vez mais. Tenho lugar na pluralidade, não quero mais repartição. Um dia eu toco com os indígenas na sede da ONU e no outro estou em rodeios. Se é dito que aquilo é uma sintoma política, o outro vai se recusar a ouvir, e isso é tudo o que não quero.”

Ele evita tomar lados. Ainda que tenha ido a Brasília reivindicar contra o marco temporal em 2021, ele nunca criticou o ex-presidente Jair Bolsonaro, que afirmava ser contra a demarcação de terras indígenas. No ano pretérito, o DJ publicou um vídeo para desmentir o rumor de que teria discursado contra o político num show.

À era das eleições, quando artistas se dividiram entre Lula e Bolsonaro, ele também se absteve. “Tento deixar as pessoas livres para se expressarem. Quando a Célia lançou a Frente Parlamentar Mista em Resguardo dos Povos Indígenas, no Congresso Vernáculo, ela me convidou para ir lá. Mas eu não queria ir. Aí ela me disse ‘Alok, eu ainda preciso de varão branco para falar com quem é branco.’”

O cantor e ator Mapu, que é líder místico dos huni kuin, faz coro à deputada, e diz ver Alok porquê uma ponte entre a floresta e a humanidade. Ele, que canta sozinho em “Yube Mana Ibubu”, a quarta filete do disco, vê progressão na forma porquê a cultura indígena é tratada hoje em dia, apesar de ter ressalvas.

“Às vezes a gente chega em qualquer lugar e as pessoas falam ‘vocês são canibais’. Poxa, essa história está muito distorcida, tem muita desinformação ainda. Mas agora estamos quebrando barreiras com nossa tradição.”

Ele foi um dos 50 indígenas que Alok reuniu em um estúdio de gravação em Minas Gerais. O DJ conta ter desembolsado mais de R$ 4 milhões com todas as despesas do projeto, e diz que vai doar aos indígenas todo o quantia arrecadado com os royalties do disco.

“Fazer o álbum é o mais barato. Mas há os custos de levar a galera toda para a ONU duas vezes, depois para o Grammy Museum, dar trator, dar lar. Porque não adiantava a gente investir num projeto e não cuidar das pessoas que cantam. O rosto iria ao palco da ONU sem ter uma lar para morar?”

Alok é um dos poucos DJs brasileiros que pisam em espaços de tanto prestígio mundo afora. É hoje o principal nome do gênero do país.

Para Paul Manzon, agente músico que trabalhou com Alok no início da sua curso, o sucesso dele se deve a vários motivos.

A debutar que Alok gravava vídeos para descrever sua história, o que gerou identificação imediata no público. Segundo, ele fez remixes de artistas populares, porquê Chitãozinho e Xororó. Por termo, o DJ tocou em muitas festas de sertanejo do Villa Mix, espalhadas pelo interno do país, conquistando um público desacostumado à música eletrônica.

“No meio, dizem que o Alok se vendeu ao que é mercantil, mas não. Ele traçou um objetivo e alcançou”, afirma Manzon. “Antes dele, muitas pessoas não sabiam quase zero sobre DJs, achavam que era coisa de gente drogada. Hoje elas entendem.”

Folha

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