Apoio da netflix à cinemateca ressalta desafios do setor

Apoio da Netflix à Cinemateca ressalta desafios do setor – 13/04/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Ao longo dos anos 1960, em uma série de textos, Paulo Emílio Salles Gomes desenvolveu um pensamento consistente e lúcido sobre a situação do cinema brasiliano, forjado por uma tradição importadora e uma produção sítio com dificuldades de se declarar.

Em “O Possuidor do Mercado”, publicado em 1961, afirma: “Com excessiva frequência, desde 1915, temos lutado contra fantasmas criados pela nossa imaginação ingênua de povo subdesenvolvido, ou contra as máscaras de uma veras totalmente deformada pela nossa ignorância. É mais do que tempo de conhecermos a fisionomia exata da nossa infortúnio”.

Ou seja, há mais de 60 anos, Paulo Emílio passou o obrigação de moradia. Para conseguirmos transpor de “uma situação colonial”, precisamos, antes de tudo, saber as estruturas e estratégias dos grupos hegemônicos do campo.

A expansão internacional dos grandes estúdios de Hollywood, que começaram a penetrar seus escritórios no Brasil em 1915, recebeu um grande suporte do governo americano sobretudo a partir dos anos 1920, por meio de relatórios que forneciam aos empresários informações preciosas.

Um estudo desses relatórios e das revistas da quadra evidencia as principais estratégias que contribuíram para tornar esses grupos hegemônicos —a ocupação do mercado, o controle da informação, a geração de barreiras de ingressão, o lobby contra iniciativas regulatórias, e promessas de parcerias para fortalecer a produção vernáculo, desde que sob suas condições.

O suporte governamental à expansão dos grandes estúdios se deu de forma indireta, por meio de relatórios produzidos pelos consulados dos Estados Unidos, encomendados pelo Departamento de Estado e encaminhados à Motion Pictures Producers and Distributors of America, representante internacional dos interesses dos grandes estúdios. Ou seja, desde muito cedo, a expansão do cinema hollywoodiano contou com uma política de Estado, independente dos governos que passavam pela Mansão Branca.

Naquele momento, a força dos filmes americanos no mercado brasiliano não era monitorada pela aferição de público e renda, mas pela quantidade de filmes e presença nas salas. Ou seja, antes dos resultados, havia uma preocupação de prometer a ocupação.

Qualquer progressão de outras cinematografias —porquê a alemã, no término dos anos 1920— era apontada porquê ameaço. Primeira prelecção das estratégias da supremacia —ocupar espaços, antes de tudo. Paralelamente, movimentos legislativos de caráter regulatório eram combatidos e inibidos, solene ou extraoficialmente.

A estratégia da Netflix de concordar a Cinemateca Brasileira zero mais é do que um movimento de ocupação de espaços negligenciados. Os campos da preservação, formação e disseminação, representados pela Cinemateca, foram ao longo de décadas deixados à margem das políticas públicas e pelo próprio setor. Esse é um debate vivo que tem ganhado força em alguns fóruns de discussão. As plataformas de streaming estão atentas a esses movimentos e miraram nesses campos.

Não é um contingência que essa iniciativa ocorra em um momento em que se procura um progressão da regulação do setor de streaming no Brasil. A argumentação usada pela Netflix para justificar o investimento em preservação contém um recado para o setor, pois vem acompanhada pela ênfase de que a Netflix não vive só de originais e que a maior segmento de seu teor é licenciado.

No entanto, são os originais que recebem mais investimento e proeminência e que, em universal, são objetos de contratos que transformam as produtoras independentes brasileiras em prestadoras de serviço, sem aproximação à propriedade intelectual da obra e aos dados gerados pela sua exibição.

Precisamos de investimentos urgentes na preservação. Mas é preciso ter um olho no peixe e outro no gato. As grandes plataformas ocupam uma posição privilegiada que vem construindo a formação do olhar, criando hábitos de consumo e construindo uma novidade supremacia. Permitir que a Netflix se aproxime de instituições de interesse público contribui para alguns passos na direção de uma cooptação do setor em um momento de disputa política.

Sabemos que esse governo tem muitas outras preocupações e enfrenta limitações no Congresso, mas também é uma veras que não entendeu o papel estratégico da cultura, e particularmente do setor audiovisual, para o fortalecimento social, simbólico, econômico e social do Brasil —um movimento posto em prática nos mandados de Lula 1 e 2.

O atual olhar economicista, que parece incontornável, é incapaz de compreender as especificidades da enxovia de valores do audiovisual e não enxerga a influência da cultura e da economia criativa.

O próprio setor audiovisual tem seu quinhão de responsabilidade nesse processo. Depois de um rápido período de união posteriormente a devastação promovida pelo governo Bolsonaro, dividiu-se e enfraqueceu sua capacidade de pronunciação.

Assim porquê os grupos de decisão do governo observam o “povo da cultura” e, principalmente, o “povo do cinema” porquê um grupo privilegiado e reclamão, o setor audiovisual se divide, em uma simplificação malcriada, entre “industrialistas” e “culturalistas”, incapazes de entender que, “em cinema, de forma mais clara que em outros terrenos da atividade humana, há uma solidariedade totalidade entre as tarefas mais prosaicas e as construções mais finas”, voltando a Paulo Emilio.

Lúcido e implacável, Paulo Emílio demonstrou porquê a situação colonial e importadora forjou nos produtores brasileiros uma mentalidade corporativa: “Não sentiam até que ponto a produção, distribuição e exibição de filmes são atividades solidárias”. O mundo mudou, o cinema se desdobrou em vários outros formatos audiovisuais, mas determinados aspectos seguem parecidos.

Os grupos hegemônicos recorrem às mesmas táticas, enquanto o pensamento do setor audiovisual e do poder público no Brasil caminharam pouco em uma compreensão mais profunda das complexidades e da interconexão entre os elos do campo audiovisual.

Precisamos de um giro conceitual e prático protagonizado pelo Estado brasiliano, pelos trabalhadores do audiovisual e pelos pesquisadores. Exclusivamente remendos e revisões não vão solidificar a soberania imaginativa de que o Brasil precisa e merece.

Folha

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