Assassinatos E Guerra Civil Eram Danos Colaterais Aceitáveis No Plano

Assassinatos e guerra civil eram danos colaterais aceitáveis no plano de Bolsonaro – 03/12/2024 – Wilson Gomes

Celebridades Cultura

Agora é solene. Um relatório detalhado da Diretoria de Lucidez da Polícia Federalista, resultado de uma longa e minuciosa investigação, comprova que Jair Bolsonaro planejou manter-se no poder por meios ilícitos e violentos, chegando a colocar o projecto em marcha. Bolsonaro e seu círculo íntimo —por fim, ninguém organiza uma operação dessa magnitude sem uma estrutura muito articulada e posicionada.

O relatório detalha quem foram os Goebbels, Himmler, Göring, Heydrich e Röhm de Bolsonaro. A maioria ostenta altas patentes militares —general, almirante, coronel, tenente-coronel—, mas também havia “juristas”, políticos e até padre e juiz federalista, deixando evidente que o desprezo pela democracia não se restringe aos meios militares deste país.

Uma vez que o círculo íntimo de Hitler, o de Bolsonaro também se dividia em especialidades muito definidas: a propaganda preparava o terreno; os conspiradores construíam pactos de lealdade e alianças estratégicas; os assassinos eliminavam (ou “neutralizavam”, uma vez que preferem expor) os obstáculos; os comandantes de tropas se preparavam para enfrentar ou intimidar a resistência; enquanto o núcleo jurídico fornecia um verniz de legitimidade às monstruosas ilegalidades e corria para fabricar leis para um novo regime levantado sobre talante, cadáveres e sangue. Tudo foi planejado, articulado, posto em movimento e, agora, devidamente investigado e documentado.

Uma conspiração com tantas etapas naturalmente teria várias oportunidades de fracasso. E fracassou. Não, certamente, por omissão da propaganda, que entregou aos golpistas uma base popular extremamente mobilizada e disposta a tudo, uma vez que se viu no 8 de Janeiro, quando o beneficiário do golpe já havia recuado e o projecto militar estava desabilitado. Tampouco falharam os que estavam prontos para legalizar e institucionalizar o golpe consumado, uma vez que atestam os inúmeros planos estratégicos, minutas do golpe e até o exposição de posse do novo ditador encontrados pela polícia.


O elaboradíssimo projecto para “neutralizar” Alexandre de Moraes foi abortado, mas não devido a falhas do núcleo de assassinos, recrutados entre os agora famigerados “kids pretos”, e sim por força das circunstâncias e, posteriormente, por decisão política.

A verdadeira omissão parece ter ocorrido entre os conspiradores, que não conseguiram convencer todos os envolvidos de que os ganhos superavam os riscos. Não foi virtude moral nem apego à democracia o que emperrou a engrenagem golpista, mas cálculos pragmáticos. Alguns conjurados em posição de comando reavaliaram custos, perdas prováveis e riscos presumidos, concluindo que não valia a pena. Finalmente, sequestrar e matar um ministro do Supremo, envenenar o presidente eleito, “neutralizar” o vice-presidente, prender opositores e percorrer o risco de uma guerra social —e tudo isso para quê? Para prometer poderes ditatoriais a Jair Bolsonaro, alguém com perfil mais de golpista de cláusula 171 que de golpista comandante de tropas? Só para lunáticos essa conta fecharia.

Ainda assim, foi uma proeza considerável. Não parece plausível que um varão com tão poucas qualidades tenha convicto tantos a malparar tudo por sua permanência no poder. É mais razoável supor que havia interesses tão determinados a destruir um regime em que esquerda e liberais podem vencer eleições que aceitaram Bolsonaro uma vez que um inconveniente menor. Isso era o de menos para quem considerava a guerra social uma vez que hipótese e achava “danos colaterais aceitáveis” as mortes de Moraes e sua equipe de segurança, os assassinatos de Lula e Alckmin, além de planejar, uma vez que primeira medida estratégica pós-golpe, a prisão preventiva dos juízes do STF “geradores de instabilidade”.

O relatório não unicamente revela as intestino de uma conspiração, mas ilumina a natureza de alguns protagonistas da política pátrio. Mostra o desconforto de boa segmento da escol militar com governos civis, com os freios impostos por uma Constituição democrática e com a dieta de poder político. E o quão longe estão dispostos a ir para mudar essa situação.

Assim uma vez que expõe a completa carência de escrúpulos de Bolsonaro e de seus aliados, mesmo considerando unicamente o siso moral mais rudimentar. Finalmente, o que se pode expor de alguém que, para permanecer no poder, aceita que se elimine o juiz que arbitrou as eleições, mate-se o contendor que o derrotou nas urnas e se arraste o país para uma guerra social? Tal disposição só evidencia a absoluta falta de qualquer limite moral de Bolsonaro e do projeto dominador que ele representou.


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Folha

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