Beija Flor Vai Homenagear Laíla, Mestre Dos Carnavais

Beija-Flor vai homenagear Laíla, mestre dos carnavais

Brasil

Um dos carnavais da Beija-Flor de Nilópolis que causaram maior impacto foi o de 1989, quando a escola da Baixada Fluminense desfilou com o enredo Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia. Uma das alegorias, que viria com um Cristo de braços abertos e com vários componentes aos pés, representando mendigos, provocou, antes do desfile, possante polêmica com a Igreja Católica, que não aceitou a imagem no sege umbrátil. Aí, surgiu a teoria de o Cristo passar pela avenida vestido por plástico preto e com uma tira extensa onde se lia: Mesmo Proibido, Olhai por Nós!. Até hoje não se sabe se a autoria é de Joãosinho Trinta, carnavalesco da escola na estação, ou de Laíla que era diretor de carnaval.

“É uma discussão que não tem término. Para mim, o que interessa é que a Beija-Flor fez o maior carnaval da história e que o Joãosinho Trinta é o maior carnavalesco de todos os tempos, assim uma vez que o Laíla é um dos maiores sambistas de todos os tempos”, disse à Dependência Brasil, o atual carnavalesco da escola, João Vitor Araújo. Segundo o carnavalesco, naquele ano, Laíla retornou à escola a pedido de Joãosinho, que precisava deste suporte para o enredo que considerava importante para a Beija-Flor. O esforço foi recompensado pelo vice-campeonato em 1989.

Esta é uma das histórias da azul e branco de Nilópolis que têm o envolvimento de Laíla, morto em 18 de junho de 2021. O artista é o homenageado da escola em 2025, com o enredo Laíla de Todos os Santos, Laíla de Todos os Sambas. Para relatar essa história, o Cristo não poderia faltar. “Faremos aí uma encenação muito lítico. É um carnaval revolucionário”, adiantou João Vitor. 

Enredo


Rio de Janeiro (RJ), 07/02/2025 - João Vitor Araújo, carnavalesco da Beija-Flor de Nilópolis, no barracão da escola, na Cidade do Samba, zona portuária. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Rio de Janeiro (RJ), 07/02/2025 - João Vitor Araújo, carnavalesco da Beija-Flor de Nilópolis, no barracão da escola, na Cidade do Samba, zona portuária. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O carnavalesco João Vitor, no barracão da escola – Tânia Rêgo/Dependência Brasil

A Beija-Flor vai mostrar na Sapucaí a trajetória do menino pobre do Morro do Salgueiro, na zona setentrião do Rio. Nascido Luiz Fernando Ribeiro do Carmo, se tornou Laíla quando começou a enxergar o carnaval de outra forma. “O Laíla demorou muito a ser reconhecido, por conta do sistema, por conta do racismo. Era para ter sido reconhecido no meio de toda aquela turma [de carnavalescos], que foi lançada no final da dez de 60, uma vez que [Fernando] Pamplona, Maria Augusta, Rosa Magalhães, Arlindo [Rodrigues], Joãosinho [Trinta], Viriato. Ele estava lá com eles, mas o racismo não deixou ele ser reconhecido. Era muito mais interessante, com reverência a todos esses mestres, mas o Laíla estava ali, até porque ele foi o suporte de todos. Ele lançou aqueles mestres e não teve o reconhecimento que merecia”, lembrou o carnavalesco.

Durante o desenvolvimento do enredo, João Vitor teve uma entrevista com Maria Augusta, carnavalesca responsável por apresentações memoráveis no carnaval carioca, uma vez que Domingo e O Amanhã, ambas na União da Ilhéu do Governador. Na entrevista, Maria Augusta enfatizou a relevância de Laíla naquele grupo de grandes carnavalescos.

“Emocionadíssima, ela disse que quem escolhia os tecidos, os materiais para o Salgueiro, era Laíla. Não eram esses artistas. Era ele quem saía para as ruas para ver o que era melhor esteticamente para o carnaval, e ele não teve esse reconhecimento. Talvez pelo autodidatismo, porque foi a [época da] febre dos alunos oriundos da Escola de Belas Artes [EBA – da Universidade Federal do Rio de Janeiro]. Portanto foi esse embranquecimento artístico do carnaval que acabou dando uma espécie de crachá para o evento dizendo: ‘opa! o carnaval não é mais o oba-oba. Ele agora é assinado, tem direção artística de alunos da EBA, e o Laíla ficou jogado para o lado”, completou.

“Ele foi o Laíla com todas essas qualidades de forma autodidata. Ele não teve chance de estudar, não teve tempo. Não teve esse aporte familiar e teve que trabalhar. Essa é a verdade de muita gente. Portanto, a escola de samba para ele, o Salgueiro, foi um refúgio de incremento, e acho que até de autoconhecimento”, acrescentou.

Questões sociais

Foi o reforço da cultura preta, de críticas sociais e religiosidade, temas que Laíla gostava de ver desenvolvidos nos enredos da escola e que estarão presentes também em 2025. “A genialidade do Laíla é irrefragrável e, a partir daí, era sempre o rostro que estava avante da escolha dos enredos e sempre pautando o protagonismo preto dentro dos enredos e sempre enredos ligados às raízes nilopolitanas, de uma cidade da Baixada Fluminense, predominantemente, e a religiosidade”, afirmou.

João Vitor comentou que, diferentemente da estação em que Laíla começou a inserir a religiosidade nos enredos da Beija-Flor, hoje é frequente as escolas trazerem esse tema. “É preciso lembrar que, quando o Laíla começou a trazer oriente tipo de enredo para o carnaval, todo mundo dizia que a Beija-Flor era uma escola que só falava de macumba, só falava de África. Hoje todo mundo [nas escolas] faz o que Laíla fazia. Acho maravilhoso, na era da intolerância religiosa, o carnaval é uma forma de protesto, é um ato de resistência. Quando se pegam as 12 escolas [do Grupo Especial] e dez estão com enredo de temática África, trazendo religiosidade para a avenida, muita gente está reclamando. Ah! é só enredo afro, é só orixá. Não, isso é maravilhoso. Essas pessoas não estão enxergando o que está acontecendo aí fora, e o carnaval tem voz.”

“O Laíla tem esse histórico de pioneirismo social dentro de uma escola de samba, principalmente, dentro da Beija-Flor de Nilópolis. Tem uma outra coisa também muito importante sobre o Laíla. Olha o tamanho da Beija-Flor de Nilópolis. É a terceira escola com mais títulos no carnaval carioca. Enquanto o Laíla esteve na Beija-Flor, ele tinha todas as ferramentas e epístola branca para trazer quem ele quisesse e sempre trazia artistas profissionais novos, desconhecidos. Ele nunca fez questão, nunca quis trazer medalhões para dentro da Beija-Flor. Tanto na segmento de geração na percentagem de carnaval e na segmento artística, uma vez que nos outros segmentos”, destacou João Vitor.

Segundo o carnavalesco, Laíla começou a ter a projeção devida a partir da dez de 90, quando isso deveria ter realizado nos anos 60. Nessa estação, ele adota o esquema de percentagem de carnaval no lugar de um único carnavalesco e dá oportunidade a diversos profissionais em início de curso e pouco conhecidos uma vez que Fran Sérgio, Amarildo de Mello e Cid Roble.

Partilha do enredo


Laíla, diretor de carnaval da Beija-Flor: a organização da escola faz a diferença e garante títulos
Laíla, diretor de carnaval da Beija-Flor: a organização da escola faz a diferença e garante títulos

Laíla é o homenageado deste ano na Beija-Flor, terceira escola com mais títulos no carnaval do Rio de Janeiro – Cristina Indio do Brasil/Dependência Brasil

Para João Vitor, o enredo da Beija-Flor é um dos mais fáceis de compreender neste carnaval de 2025. “Por que Laíla de Todos os Santos? Porque eu pego ali três setores falando da religiosidade do Laíla, da fé. Tenho ali o ori ancião, já que ele era um fruto de Xangô com Iansã; segundo setor, a múltipla fé do Laíla, porque ele dizia que era católico apostólico romano, candomblecista e umbandista; e terceiro setor, a África uma vez que fundo de conhecimento e origem da ancestralidade. Portanto, eu fecho Laíla de todos os santos.
No quarto, quinto e sexto setores, são o Laila de todos os sambas, quando falo do Laila produtor músico, muita gente não sabia. O Laíla responsável pelo sucesso de outras escolas de samba fora Beija-Flor e o último setor, o Laíla da Beija-Flor de Nilópolis e o reencontro dele com Joãosinho Trinta”, adiantou o carnavalesco.

João Vitor disse que chegou a ouvir o questionamento se Laíla poderia ser o tema de um enredo. “É porque as pessoas têm preguiça e, infelizmente, vivemos em um país preconceituoso. E é terrificante quando uma pessoa olha para você e pergunta: ‘o Laíla dá enredo?’ Para mim, isso é puro preconceito. Elas associam à imagem rústica do Laíla, aquela rostro fechada, semblante pouco amigável uma vez que uma pessoa que não merecia estar ali. Parece que a Beija-Flor é demais para o Laíla. Tudo que ele fez pelo carnaval e pela Beija-Flor de Nilópolis é digno de um, dois, três, quatro enredos. A Beija-Flor tem 14 títulos, 13 com Laíla. É muita coisa”, concluiu.

Um traje que muitas pessoas não devem saber é que, mesmo sendo um grande sambista, Laíla era um amante da música clássica, e essa segmento da vida dele será representada por uma parábola que mostrará uma orquestra. “Prodígio com o dom de um ouvido integral – habilidade fenomenal que é a percepção único da musicalidade, tinha a música clássica uma vez que manadeira de inspiração e estudo para o aperfeiçoamento de seu talento exacerbado”, definiu o texto que explica o enredo.

Repercussão

O pregão do tema para 2025 funcionou uma vez que uma forma de acalmar os ânimos dentro da escola. João Vitor contou que a escola vinha de um oitavo lugar e havia uma vaga de protesto grande pelas redes sociais. Alguns componentes chegaram a ameaçar não participar do tradicional desfile que ocorre depois das apresentações no Sábado das Campeãs, na Estrada da Mirandela, via importante de Nilópolis com integrantes fantasiados. “Foi muito difícil, foi um momento horroroso para a gente, o pós-carnaval. Quando a gente anuncia um enredo logo depois do desfile e do resultado do carnaval de 2024 é uma vez que se você estivesse entrando ali com uma UPP na Beija-Flor, Unidade de Polícia Pacificadora. A coisa se acalmou de uma tal forma, porque pegou no coração”, avaliou.

“A notícia de que o enredo seria o Laíla foi uma notícia que chegou na hora certa. Tinha que ver a Mirandela lotada. Os componentes todos lá. Aqueles boatos, aquelas ameaças já não existiam mais. Virou o jogo”, dpontuou.

Samba

Segundo João Vitor, o clima de empolgação se deu também na disputa do samba-enredo. “Foi uma das melhores disputas que eu já participei na vida, nessa minha curso. O samba era unanimidade na quadra. Tínhamos dois, três sambas. É muito bom quando as semanas vão passando, e as pessoas vão apontando para um determinado samba. A gente vai prestando atenção e não pode esboçar nenhum tipo de sentimento, embora tenha preferência.

“Quando é um samba que a torcida e a comunidade abraçam, não tem jeito. O outro samba que perdeu era muito bom, era o famoso sentido do tanto faz. Samba 1 ou samba 5. Só que, quando o samba 5 entrou para se apresentar, a quadra toda começou a trovar antes. Você percebia nitidamente que aquilo não era torcida. Era Beija-Flor”, acrescentou.

Também não é à toa que na letra do samba há uma referência de Laíla uma vez que um griô, que, na cultura africana, é a pessoa mais antiga de uma comunidade responsável por passar todo o seu conhecimento para os mais jovens. “Exatamente. Ele parece de traje um griô, não só fisicamente, porque parece de traje, mas por todo o conhecimento que tinha. O melhor de tudo é que ele ensinava tudo. Exatamente o que o griô fazia, sentava-se aos pés do baobá e contava histórias para os mais novos”, afirmou.

Barracão


Rio de Janeiro (RJ), 07/02/2025 - Confecção de fantasias para o carnaval no barracão da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis, na Cidade do Samba, zona portuária. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Rio de Janeiro (RJ), 07/02/2025 - Confecção de fantasias para o carnaval no barracão da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis, na Cidade do Samba, zona portuária. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Artesão confecciona fantasia da Beija-Flor – Tânia Rego/Dependência Brasil

O esforço está nos mínimos detalhes. Dentro do barracão, Mauro de Oliveira, chamado no mundo do carnaval de Rostro Preta, trabalha na realização de esculturas. O paixão pela função não vem de agora. Faz 33 anos que ele cumpre a sua função onde o desfile é prestes. Saber que está fazendo tudo isso para relatar a história de Laíla, com quem trabalhou durante muito tempo, é motivo de orgulho. “É uma emoção muito grande. Eu acompanhei a trajetória dele de 89 pra cá e é uma coisa que estou esperando muito. Acho que é o carnaval mais esperado da escola. É sobre o rabino Laíla. É gratidão por tudo que ele fez pela escola”, dividiu a sua memória, destacando que o tentativa técnico que a Beija-Flor fez na Sapucaí no dia 1º de fevereiro já deu uma mostra do que vem pela frente. “A gente espera uma explosão de alegria”.

João Vitor também está esperançado em um bom desfile, com possibilidade de lucrar o título. “O Laíla nos abençoou. Quando esse enredo foi apresentado para mim, eu não sei o que eu senti, se era um sentimento de felicidade, de temor. Só sei que saí daqui glacial. Fui para lar e, quando dormi, sonhei com ele, sonhei com ele na Terreiro da Divinização. Ele me olhava, sorria e fazia um gesto de amplexo. Portanto eu falei: ‘isso vai dar evidente’. É o que ele quer e quer que eu faça. Ele veio confirmar. Foi o único sonho que tive com ele”, revelou.

Fonte EBC

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