Quarenta anos depois de um desportista paraolímpico disputar uma Olimpíada pela primeira vez, o Brasil terá seu representante nesta lista com Bruna Alexandre, 29, jogadora da equipe feminina de tênis de mesa em Paris.
A participação nas duas versões das Olimpíadas joga luz sobre mais de duas décadas de curso da catarinense, vencedora de uma medalha de prata e três de bronze nas Paraolimpíadas de Tóquio-2020 e do Rio-2016, todas conquistadas na classe 10, para atletas com deficiência física que competem de pé.
Com Bruna Alexandre e as irmãs Bruna e Giulia Takahashi, o time feminino tentará ao menos repetir o desempenho exibido no Mundial por equipes, disputado na Coreia do Sul, em fevereiro, quando o Brasil chegou às oitavas de final, um resultado inédito. Na temporada de grupos, elas só foram derrotadas pelo Japão, que terminou o torneio uma vez que vice, e, no mata-mata, superaram a Hungria e caíram para a Coreia do Sul.
Os reveses para japonesas e sul-coreanas refletem o domínio asiático no esporte, sobretudo dos chineses, no feminino e no masculino. Desde que o tênis de mesa se tornou uma modalidade olímpica, em Seul-1988, todas as medalhistas de ouro no individual foram do país, e só por duas vezes, em Atlanta-1996 e Atenas-2004, as vices não foram chinesas, embora fossem da região: Taiwan e Coreia do Setentrião, respectivamente.
“No Brasil, as crianças nascem e já ganham uma esfera de futebol. Na China é uma raquete”, compara Bruna Takahashi, 23, número 20 do ranking. “Lá, desde muito cedo você desenvolve uma técnica certinha, e as condições de treino são muito melhores”, completa a desportista, que de 2021 até nascente ano defendeu o clube teutónico TTC 1946 Weinheim —na próxima temporada ela jogará pelo Alliance Nîmes-Montpellier, da França.
Diante do histórico asiático, as brasileiras são contidas ao projetarem o desempenho nos Jogos em Paris. Bruna Takahashi, por exemplo, fala em não produzir expectativas e ir “passo a passo, com os pés no soalho”. Ela cita, animada, a chance de apresentar uma boa performance na dupla mista, que fará com Vitor Ishiy. “São poucos jogadores, e a disputa ocorre no primórdio, logo é para se soltar. É uma oportunidade para prender.”
Giulia, por sua vez, quer terminar as partidas com “o sentimento de que conseguiu realizar tudo o que poderia fazer”, enquanto Bruna Alexandre, mais pragmática, afirma esperar que o time feminino passe das duas primeiras rodadas. Já a perspectiva dela para as Paralimpíadas é muito dissemelhante, com a esperança de ocupar a medalha de ouro não unicamente na disputa individual, mas também na dupla feminina e na mista.
A catarinense teve de decepar o braço recta aos três meses de idade, depois uma emprego incorreta da vacina BCG, o que provocou uma trombose —há murado de quatro anos, conta a desportista, a Justiça condenou o hospital responsável pelo caso a indenizá-la. A jeito para atividades físicas, uma vez que bicicleta e futsal, fez com que aos sete anos de idade ela começasse a jogar tênis de mesa, modalidade que o irmão já praticava.
“No início, tive bastante dificuldade para sacar, mas depois me adaptei muito. E hoje o saque é um dos meus pontos mais fortes”, diz ela. “Coloco a bolinha em cima da raquete, seguro com o dedão e solto.” Outro tropeço foi o estabilidade do corpo, o que Bruna Alexandre procura gratificar com o skate, que pratica desde a puerícia, além de exercícios na ateneu. “Principalmente no Olímpico, as meninas me jogam muito para os lados, para eu perder o estabilidade. No Paraolímpico eu também uso essa arma, né? Mas hoje, depois de muitos anos, tanto eu quanto outras atletas paraolímpicas quase não temos mais dificuldades nessa segmento.”
Outra novidade do time feminino brasílico é a presença de irmãs na competição individual. Diferentemente de Bruna Takahashi, que participará das Olimpíadas pela terceira vez, Giulia, 20, estreará de indumento nos Jogos em Paris, já que foi a Tóquio uma vez que suplente, vaga agora da paulistana Laura Watanabe, também de 20 anos.
Questionadas sobre quais vantagens a relação próxima pode ter na preparação, as Takahashis mencionam o companheirismo que pode permitir um diálogo maior para emendar erros, “mas tudo numa boa, sem bancar a superior”, afirma Bruna, primeira brasileira a entrar no top 20 do mundo. Giulia ocupa hoje a 90ª posição, e Bruna Alexandre é a número 180 —no ranking de para atletas, ela está na terceira colocação na classe 10.
Além do Mundial, essa formação da equipe feminina disputou o Pan-Americano de tênis de mesa, torneio no qual a vaga para Paris foi conquistada. A integração, afirma a catarinense, deve-se ao projeto da CBTM (Confederação Brasileira de Tênis de Mesa), que realiza os treinos de todos os atletas de forma conjunta.
Para as irmãs, que destacam a performance de Bruna Alexandre na Coreia do Sul, o indumento de uma para desportista integrar o time que vai à Olimpíada é um tanto a ser comemorado. Já a mesa-tenista vê a sua participação além do paisagem esportivo. “Gostaria que pensassem que não somos coitados. A gente consegue fazer tudo.”
Para permanecer de olho
- Medalha de prata em Tóquio, a chinesa Sun Yingsha, apelidada carinhosamente de Shasha, chega uma vez que favoritíssima para o ouro em Paris. O aproveitamento da atual número 1 neste ano é de 91%
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Além das Takahashi, há outros irmãos na disputa do tênis de mesa nos Jogos: os japoneses Miwa e Tomokazu Harimoto e os franceses Alexis e Felix Lebrun. Para jogar a competição por equipes, Miwa, de unicamente 15 anos, desbancou Mima Ito, medalhista de ouro nas duplas mistas em Tóquio
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A única jogadora não asiática a figurar no top 10 é a romena Bernadette Szocs, que realizou a façanha de derrotar a chinesa Chen Meng, ouro em Tóquio, em um torneio da WTT no ano pretérito. Além da boa performance, chamam a atenção as celebrações efusivas da mesa-tenista, com gritinhos e pulos