Bruce Dickinson não para: além de viajar o mundo todo uma vez que vocalista da orquestra Iron Maiden, o sujeito escreve livros e roteiros, apresentou programas de rádio e TV, e é piloto de avião.
Nesta sexta (1°), ele lança seu sétimo disco solo, “The Mandrake Project”, o primeiro desde 2005, e no mês seguinte inicia uma turnê solo de 50 shows por México, América do Sul e Europa, com sete apresentações no Brasil. “Minha vivenda é uma mochila de viagem”, diz o cantor de 65 anos.
“The Mandrake Project” traz canções novas, além de algumas que Dickinson e seu leal parceiro músico, o guitarrista e compositor Roy Z, tinham guardadas há tempos. “A mais antiga delas, ‘Immortal Beloved’, tem pelo menos 25 anos”, diz o cantor.
“Gravei a letra da versão original de uma vez, de improviso, em uma tomada, numa vaga de fluxo de consciência em que as palavras simplesmente saíram da minha cabeça. Já a música ‘Shadow of the Gods’ tem 20 anos, estava concluída em 2014, mas ficou guardada até agora”.
Nos últimos dez anos, Dickinson passou por maus bocados: em 2014, foi diagnosticado com cancro na gasganete —causado, segundo ele mesmo, pela prática do cunnilingus—, mas felizmente foi salvo pela quimioterapia. Depois, pegou Covid, mesmo estando vacinado. “Foram anos complicados com o cancro, depois a Covid e todo o trabalho com o Iron Maiden, portanto deixei minha curso solo um pouco de lado.”
Agora, Dickinson está numa de suas fases mais produtivas. Além do disco novo, escreveu uma revista em quadrinhos com o mesmo nome do disco, que será dividida em 12 edições agrupadas em três graphic novels, a primeira delas com lançamento em dezembro de 2024.
“Quando pensei na história de ‘The Mandrake Project’, minha primeira teoria era fazer um filme”, diz o cantor. “Escrevi o tratamento, mas concluí que fazer um filme daquilo ficaria absurdamente dispendioso, teria de ser uma megaprodução hollywoodiana. Um camarada sugeriu fazer uma revista em quadrinhos.”
Dickinson conta que escreveu canções a partir da história do gibi, que, ouvidas em determinada ordem, levam o ouvinte numa jornada músico e emocional, do início ao término do álbum.
Os dois videoclipes já lançados com faixas do disco, “Afterglow of Ragnarok” e “Rain on the Graves”, evidenciam o desvelo visual com que Bruce Dickinson trata sua arte.
O primeiro é um verdadeiro filme de ação, referto de efeitos especiais criados por computação gráfica, enquanto o segundo, filmado em preto e branco, é um tributo ao cinema de horror dos anos 1950 e 1960, do qual Dickinson é fã. Ele próprio interpreta um pastor que encontra uma mansão assombrada.
“Filmamos na Cornualha, numa antiga propriedade que parecia mesmo um cenário de filme da Hammer [antiga produtora britânica de filmes de terror]. O lugar tinha até um cemitério, que decoramos com mais cruzes e lápides.” O “novo” cemitério incluiu a sepultura de um responsável que Dickinson nutriz: o poeta britânico William Blake.
Dickinson adora incluir em suas músicas e clipes citações a livros e filmes. Tanto no Iron Maiden quanto na curso solo, Dickinson é um contador de histórias.
“Em ‘Many Doors to Hell’ [canção do álbum ‘The Mandrake Project’] raconto a história de uma vampira que deseja voltar a ser uma pessoa de músculos e osso, para que, em vez de tomar o sangue de seus amantes, possa fazer paixão com eles. Ela quer sentir o que é ter um orgasmo, sentir o que é ter susto da morte e, portanto, valorizar a vida. Mas a única maneira de fazer isso é durante um eclipse”, conta.
Sobre os shows da turnê solo, Dickinson se diz muito entusiasmado, mas avisa que os concertos não terão os cenários complexos a que os fãs do Iron Maiden se acostumaram.
“Não teremos, propositadamente, cenários, monstros, zero disso, o show é sobre a música. Teremos um telão com um visual para cada música, mas não é um show coreografado, a música vai movimentar tudo. Zero de playback, zero de bateria eletrônica, zero de samples. Teremos uma orquestra incrível tocando tudo que sabe.”
Perguntado sobre artistas que admira fora do cenário da música heavy metal, o músico surpreende: “Sabe quem me inspira? Leonard Cohen [cantor e compositor canadense]. Eu simplesmente senhoril as letras dele. Uma vez que era inteligente, e uma vez que fazia letras engraçadas e profundas. Também tinha uma voz muito privado”, diz.
“Quando tive cancro de gasganete, me perguntaram o que aconteceria se eu perdesse totalmente a voz. E eu respondia: Ninguém perde completamente a voz! Ela pode mudar, mas veja Leonard Cohen: ele canta uma vez que Pavarotti? Não. E ele precisa trovar uma vez que Pavarotti? Não. Ele tem a voz dele, e com ela está contando uma história. E isso é inspirador para mim.”