A procura no Brasil por minerais usados na transição energética acelera a crise climática no Pará (PA), na Bahia (BA), em Goiás (GO) e em Minas Gerais (MG), os principais produtores de minérios do país, com “mudanças consideráveis nos padrões climáticos em pequeno prazo (até 2030)”.
Essa é a peroração de estudo inédito divulgado nesta quarta-feira (23) pelo Observatório da Mineração a partir de dados elaborados pela consultoria TMP, que analisa eventos climáticos extremos.
“Uma empresa de mineração de lítio chegou no Vale do Jequitinhonha [MG] e derrubou milénio árvores em uma região semiárida porquê a nossa. O impacto para qualidade do ar e da chuva é muito grande. O Rio Araçuaí e o Rio Jequitinhonha estão quase desaparecendo”, alertou a indígena Cleonice Pankararu, de 58 anos.
A liderança do povo Pankararu vive em uma localidade no município de Araçuaí (MG) próxima a áreas de extração de lítio – um dos mais procurados minerais da indústria da transição energética, usado para produção de baterias de carros elétricos.
Calor e chuvas fortes fora de quadra, aumento dos dias secos consecutivos, perda anual de chuvas e temperaturas extremas são alguns dos efeitos climáticos esperados com a expansão da mineração nesses estados.
“A mineração tem se vendido porquê uma ‘solução’ virente sustentável para a transição energética. Estamos saindo de uma sujeição fóssil para outra ainda maior de base mineral que requer a exórdio de centenas, talvez milhares, de minas em áreas sensíveis, porquê a Amazônia e o Encerrado”, explicou o diretor do Observatório da Mineração, Maurício Angelo.
A consultora do observatório, Gabriela Sarmet, destacou que o relatório mostra que a segurança climática está em risco pela disputa geopolítica por esses minérios da transição. “Estamos criando zonas de sacrifício no Brasil para atender à demanda de descarbonização do Setentrião”, disse, referindo-se aos países mais desenvolvidos, localizados principalmente no Hemisfério Setentrião.
Da base fóssil à base mineral
O profissional Maurício Angelo, doutorando em ciência ambiental pela Universidade de São Paulo (USP), alertou à Sucursal Brasil que uma mina sempre vem acompanhada por gigantescas obras de infraestrutura com consideráveis impactos ambientais e sociais.
“Ancoradas nas melhores bases científicas, nossas previsões mostram que as emissões de gases da mineração para transição energética serão enormes. Não dá para expressar que a transição energética está assegurada com a troca de uma base fóssil por uma base mineral. Estamos trocando um problema por outro”, disse Angelo.
Para o profissional, é preciso superar o atual protótipo de desenvolvimento para amenizar a crise climática. “Temos que questionar o padrão de consumo que importamos para o Brasil, muitas vezes, dos Estados Unidos. Esse padrão de produção e consumo é incompatível com os limites do planeta”, avaliou.
O estudo lembra que o Brasil tem se posicionado porquê um dos principais fornecedores de minerais para a transição energética. São previstos investimentos de US$ 64 bilhões até 2028 para a expansão do setor mineral no país.
Vale do Lítio
O território indígena onde fica a localidade de Cleonice Pankararu, no Vale do Jequitinhonha, tem sido chamado de Vale do Lítio devido às grandes reservas do mineral usado na transição energética.
A liderança indígena disse à Sucursal Brasil que a extração do mineral na região começou em 2017 e que, desde logo, as explosões com dinamite, a poeira das minas e a contaminação dos rios têm causados problemas de saúde na população lugar.
“Antes do lítio, não tinha tanto problema de saúde. A gente gripava e demorava a gripar de novo. Agora, a gente gripa continuamente e temos muito problemas gastrointestinais. É muito mesmo. As pessoas estão com muita diarreia”, contou Cleonice Pankararu.
Minas Gerais detém 80% das reservas nacionais de lítio, e o principal polo de extração é o Vale do Jequitinhonha. “Com mais sete projetos em curso, espera-se que a produção de lítio aumente cinco vezes até 2028 e atraia US$6 bilhões em investimentos na próxima dez”, diz o estudo.
Chuva e luz
Na avaliação dos pesquisadores, o uso intenso de chuva pela mineração deve exacerbar a escassez das bacias hidrográficas. “A extensão dos rios já diminuiu em grande secção de Minas Gerais, Goiás e Bahia, apontando para a redução da disponibilidade de chuva e o aumento da competição por recursos”, diz o levantamento.
Porquê a maioria secção da vigor brasileira vem das hidrelétricas, a pesquisa considera que a mineração pode prejudicar o fornecimento de vigor elétrica no Brasil.
“A siderúrgica e a mineração usam quantidade desproporcional de eletricidade, consumindo tapume de 11% da produção pátrio em 2021, apesar de contribuírem somente com tapume de 3% do PIB [Produto Interno Bruto]”, acrescentou.
A estudo hidrológica do estudo revelou que de 32% a 39% das sub-bacias de Minas Gerais, Goiás e Bahia registraram um declínio na extensão dos rios em um nível considerado de “cimalha risco” (ou seja, um declínio de mais de 10%), entre o final do século 20 e o início do século 21.
“Isso provavelmente é resultado da crescente demanda de chuva devido ao desenvolvimento populacional e à expansão associada de atividades industriais porquê cultivação, geração de vigor (mormente hidrelétrica) e mineração”, diz o documento.
Pará
O Pará – sede da Conferência para Mudanças Climáticas das Nações Unidas (COP30) deste ano – é a unidade da federação com mais riscos de eventos climáticos extremos decorrentes da ampliação da mineração. O estado é responsável por tapume de 90% da produção de alumínio no Brasil.
“Enquanto o mundo se prepara para a COP30 em Belém, a corrida pelos chamados minerais críticos está acelerando a crise climática na Amazônia”, disse Gabriela Sarmet.
Recomendações
O estudo traz uma série de recomendações para os governos, agências de fiscalização e empresas para mitigar os efeitos climáticos causados pela expansão de mineração nesses quatros estados brasileiros.
“O gerenciamento dos impactos adversos da mineração exigirá das empresas uma abordagem proativa para a gestão de riscos, estruturas políticas sólidas para prometer incentivos eficazes, supervisão robusta por secção das autoridades”, diz o documento.
Maurício Angelo, diretor do Observatório da Mineração, pondera que as recomendações terão pouco efeito se o Estado não assumir seu papel de fiscalizador do setor mineral. “Não é razoável que o Estado se comporte porquê sócio das mineradoras e abra mão do seu papel de ser um fiscalizador e regulador da atividade mineral”, completou.
Horizonte
No Vale do Jequitinhonha, em Minas, enquanto aguarda a demarcação da terreno hoje ocupada pelos pataxó e pankararu, em Araçuaí, a liderança Cleonice Pankararu, que tem três filhas e uma neta, teme que a expansão do lítio inviabilize o modo de vida dos povos indígenas e tradicionais da região.
“Nossa preocupação é a mineração porque ela está indo muito rápido. Os licenciamentos ambientais em Minas estão soltos demais. É muito fácil pegar uma licença para desmatar, para minerar. E temos um Congresso que não apoia os povos indígenas nem o meio envolvente. E aí a mineração avança”, lamentou.