Pouco sabido no Brasil pelo nome, o bushcraft já ganhou um final de semana para invocar de seu. Promovido pelo grupo Guerreiros Bushcraft, que organiza desde 2015 o ENGB (Encontro Vernáculo de Grupos de Bushcraft), o evento Bushday pretende mobilizar os praticantes entre os dias 5 e 7 de abril, de um modo dissemelhante: cada um em seu esquina, em diversos estados do país, trocando experiências que vão de uma vez que fazer lume primitivo a torneio de estilingue, lançadura de machados e construção de abrigos rústicos.
Mas, enfim, o que é bushcraft? Para quem gosta de testemunhar realities de sobrevivência, pode-se expor que é neles que o bushcraft é levado ao extremo. Para quem nunca viu um incidente do seriado Largados e Pelados, que tem sido líder de audiência do Discovery Channel no Brasil por anos, é só imaginar um punhado de pessoas que se dedica a sobreviver no mato com o mínimo de tralhas —e peladas, para delícia de mosquitos, carrapatos, muriçocas e outros seres daqueles que a natureza criou para nos atazanar.
Embora muitos adeptos de trilhas e montanhismo sejam, objetivamente falando, praticantes de muitas das técnicas do bushcraft, até há pouco as tribos não se misturavam. No imaginário dos malucos por perrengues, bushcrafteiros seriam seres que, inspirados nos norte-americanos (por sua vez emulando práticas herdadas dos antigos pioneiros) se dedicam a derrubar árvores por onde passam, inflamar fogueiras com pauzinhos para cozinhar os animais que caçam, carregar ameaçadores machados, facões e transfixar clareiras e erigir abrigos com o sumo de mato que conseguirem juntar antes da próxima chuva.
Na verdade brasileira, entretanto, a coisa não é muito assim. Porquê conta o jurista Angelo dos Santos, um dos organizadores do Bushday, que reclama de que a prática ainda não é muito compreendida no Brasil, o foco da sobrevivência por estas bandas tropicais é a sustentabilidade —e não o vale-tudo no mato.
“A origem do bushcraft no Brasil é resgatar o conhecimento do que rola na natureza e usar as práticas ancestrais, dos nossos índios mesmo”, diz seu colega de grupo e ex-militar Ney Fagundes. A caça e a derrubada aleatória de árvores, típicas dos praticantes estrangeiros, estão fora do cardápio pátrio por totalidade incompatibilidade com a legislação ambiental. A pioneiria, que é a arte de erigir cabanas e mobília com os recursos da natureza, por cá, só deve utilizar pedaços de madeira encontrados já caídos ou troncos mortos na superfície onde se pretende aterrar acampamento —sim, porque ao contrário do que buscam os trilheiros, ou seja, transpor de um ponto e chegar a outro, o bushcrafteiro raiz quer se instalar em um sítio remoto e se virar para sobreviver por lá mesmo.
Se o bushcraft, ou arte mateira na versão sítio, parece bruto a olho nu, ele costuma encantar quem acaba de desenredar as possibilidades de seu universo. Porquê os alunos do professor de história e geografia Cristiano Ricardo Cardoso, que ele costuma levar para o mato para se familiarizarem com a natureza e, de quebra, com algumas práticas do conhecimento antigo.
Didaticamente, Cardoso conta que há diferença entre sobrevivência e sobrevivencialismo. “Sobrevivência é o que você faz quando está numa situação em que não queria estar, uma vez que um acidente de avião, por exemplo, onde você tenta se virar com o que tem à mão”, explica. “Sobrevivencialismo é aprender, saber e praticar técnicas de sobrevivência, é ir para um lugar impor o que você conhece de forma 90% sustentável, tentando agredir o mínimo a natureza”, completa.
E é com esse espírito que Cardoso motiva seus alunos. “Comecei a transpor da sala de lição e praticar na floresta”, afirma. “Porque se eu falava de mata atlântica, os levava lá, mostrava uma vez que fazer lume, uma vez que arrumar um maná que a natureza vai te proporcionar, uma vez que fazer um cesto, um banco, e depois, na avaliação, as notas acabavam sendo muito maiores, deu muito claro e acabei descobrindo que aquilo era bushcraft, que não conhecia”, explica.
Se o professor praticava bushcraft sem saber, o mesmo pode-se expor de um personagem que recentemente apareceu em pelo, facão e (muita) vasa na segunda temporada do Largados e Pelados Brasil, Juliano Hoja. Engenheiro agroflorestal que mora num sítio só e se dedica à produção rústico agroecológica, ele conta que foi parar no programa quase por eventualidade, porque uma amiga disse que as inscrições estavam abertas e resolveu aventurar se pôr à prova.
“Mas toda a minha curso me levou para essa situação”, conta, dedicando “grande segmento desse conhecimento às comunidades tradicionais com que eu trabalhei, indígenas, quilombolas, caiçaras, de quem fui absorvendo desde sempre todo esse conhecimento antigo”.
Quem viu Haro no programa, tentando arrancar uma colmeia de abelhas do cumeeira (muito cumeeira) de um coqueiro sedento em meio a um mangue —e sendo muito sucedido— pôde contemplar um dos mais perfeitos casos de bushcraft do programa, famoso por derrubar grandes especialistas do sobrevivencialismo em todo o mundo. Mas nem ele sabia que o que fazia era o tal do bushcraft.
“Só depois do programa fui saber o nome do que eu sempre fiz”, conta ele risonho.
Quem quiser saber e participar do Bushday, conta o videomaker e gestor do Guerreiros Bushcraft, Daniel DeLucca, só precisa ir para o mato mais próximo. Ou para a serra. Ou à praia. “Queremos invitar todo mundo para fazer o que gosta, se a pessoa é da canoagem, pegue sua canoa, se é da trilha, vá caminhar, o importante é se relacionar com a natureza e compartilhar com a gente nas redes sociais, porque a teoria é reunir e integrar o maior número de pessoas e atividades verosímil desde que se relacionem com a natureza”.
E aí, animados?