O C6 Fest é um festival sem igual no Brasil. Ocupa quatro espaços diferentes do parque Ibirapuera, em São Paulo, com shows de uma maioria de artistas estrangeiros, grande segmento deles nomes alternativos e novidades no cenário músico ao volta do orbe.
O festival nos dá a chance de ver artistas criativos que têm abordagens únicas no jeito de fazer música e que dificilmente passariam pelo Brasil em outras circunstâncias, caso de Paris Texas, Dinner Party, Squid e Young Fathers.
Mas há também outras consequências. Com ingressos de no mínimo R$ 560 por dia, o C6 é frequentado por artistas, celebridades, produtores, gente da música, da voga e das artes ou exclusivamente famosa no Instagram. As plateias são, na maior segmento dos shows, mornas e desinteressadas —em vários momentos, as apresentações parecem trilha sonora de encontros.
Esse ar de indiferença é quebrado nos shows de artistas que reúnem fãs de sua obra, em oposição a admiradores mais passivos. Foi o caso de Pavement, que encheu a tenda MetLife, com capacidade para 5.000 pessoas, em uma apresentação calorosa.
Foi o show com as emoções mais à flor da pele do festival. Em sua segunda turnê de reunião, a entidade do indie americano tocou para fãs dispostos a trovar até os versos mais estranhos de Stephen Malkmus, o vocalista da orquestra.
Ele, aliás, parecia se divertir em poucas ocasiões. Malkmus, o rock star mais desengonçado dos anos 1990, tocou com a guitarra detrás do pescoço, chamou a plateia para trovar junto no refrão e citou o Brasil no meio das letras.
Dava para sentir a força no ar. Desde “Grounded”, que abriu o show, a plateia aplaudiu e berrou o refrão do Pavement, que passou por todos os seus álbuns, com canções uma vez que “Silent Kid”, “Summer Babe”, “Kennel District”, “Shady Lane” e “Range Life”.
A tenda, que é cortada ao meio por árvores, muda totalmente de clima dependendo do show. Se na apresentação de Romy o espaço funcionou uma vez que uma balada, na de Cat Power pareceu menor e intimista uma vez que uma sala de estar.
A artista trouxe seu show fundamentado no álbum gravado ao vivo no Royal Albert Hall, em Londres, em 2022, quando mergulhou no cancioneiro de Bob Dylan e recriou uma apresentação do artista.
Foi um dos momentos especiais do festival, em que o público ficou atipicamente em silêncio para ouvir a voz de uma das grandes representantes da música opção —embora o som do show do outro palco, uma homenagem ao cantor Cassiano, tenha vazado no início do show.
Quem também causou impacto semelhante foi Romy, nome de maior destaque que se apresentou no sábado. A vocalista do grupo The XX, mesmo um tanto tímida no palco, foi se soltando conforme sentia o retorno da plateia.
Ela transformou a tenda numa pista de dança sentimental com as músicas de sua curso solo, lançada no ano pretérito com o álbum “Mid Air”. Os sintetizadores frios, carregados pelas batidas eletrônicas, puseram o público para pular e trovar junto com ela.
A presença dos fãs, de muitas maneiras, moldou a própria performance dos artistas. Romy distribuiu sorrisos e parecia encantada por trovar no Brasil, para gente que a queria muito ver. O mesmo aconteceu com Noah Cyrus, no domingo. Ao contrário de sua mana, Miley Cyrus, headliner do Lollapalooza no ano retrasado, a artista tem um público menor e se emocionou com o carinho dos fãs brasileiros.
Essa força fez falta em outras apresentações. Na extensão externa do auditório, Black Pumas e Raye fizeram shows tecnicamente impecáveis para plateias recheadas, mas que se engajaram pouco. Foi também o caso do Soft Cell, símbolo do synth-pop britânico, com um som que competiu com o fragor das conversas.
A escalação do C6, todavia, se reflete numa experiência tranquila uma vez que em nenhum outro festival. O conforto é traduzido num bom uso do espaço do parque Ibirapuera —embora neste ano a intervalo entre os palcos principais tenha aumentado e criado uma marcha incômoda.
O palco maior, contornado por árvores, aproveita muito os fundos do auditório projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer e usa a parede branca para projetar o show. É um cenário único em festivais de música em São Paulo e contribui para o bom clima do evento.
Outra decisão boa do C6 foi manter seu espaço talhado aos DJs, no Pacubra, o Pavilhão das Culturas Brasileiras, criando uma bela pista de dança num sítio improvável. É mais uma classe na proposta muito executada do festival de ocupar diversos espaços de um parque tão emblemático da capital paulista.
A qualidade de som e de transmissão nos telões foi mantida, e a experiência de chegar e trespassar do parque Ibirapuera em zero se parece com a dos outros festivais, outro lado bom do público reduzido.
Se há um pouco que o festival pode melhorar em termos de organização, são os shows que se atropelam. Além da marcha de muro de dez minutos entre os dois palcos principais, os horários das apresentações se sobrepunham.
Quem quis ver tudo só conseguiu ver um pouco de cada coisa nos dois palcos maiores. Secção do público teve de penetrar mão de apresentações que dava uma vez que certa que veria quando comprou o ingresso.
Estar no C6 é se sentir menos num festival de música, que costuma ter o clima de catarse coletiva uma vez que atrativo, e mais em shows intimistas que poderiam intercorrer em sequência em casas de shows pequenas ou médias.
Essa sensação pode ser um empecilho na hora de gerar um vínculo com o público, que pode voltar para a morada com a memória de ter visto alguns de seus artistas preferidos ao vivo —mas talvez sem a sensação de ter vivido um festival de música memorável.