O Festival de Cannes chega à sua 78ª edição, nesta terça-feira (13), com os holofotes apontados para o Brasil. Além de ser o país de honra no Marché du Film, um mercadão de filmes no evento, o recifense Kleber Mendonça Rebento volta a disputar a Palma de Ouro, principal competição do festival, com “O Agente Secreto”, seis anos depois de ter levado o prêmio do júri por “Bacurau”.
Passar pela Riviera Francesa tem um gostinho mais privativo depois do último Oscar. Em março, “Ainda Estou Cá” trouxe pela primeira vez ao Brasil a estatueta mais cobiçada do cinema, enquanto Fernanda Torres se tornou uma espécie de embaixadora da cultura brasileira na Europa e nos Estados Unidos —logo ela, a primeira dessas bandas a ser coroada melhor atriz em Cannes, em 1986.
O rosto principal de “O Agente Secreto”, aliás, também já é querido lá fora. Wagner Moura interpreta um professor que abandona uma vida de violência em São Paulo para reiniciar em Recife, mas percebe que carrega o caos consigo. O ator protagoniza o longa um ano depois de estrelar o blockbuster americano “Guerra Social” ao lado de Kirsten Dunst.
A potente presença brasileira acontece em uma edição menos americanizada se comparada à do ano pretérito, quando o júri foi presidido por Greta Gerwig, diretora de “Barbie”. Agora, é a atriz francesa Juliette Binoche quem está avante de um time de jurados heterogêneo, constituído pelos americanos Halle Berry e Jeremy Strong, o indiano Payal Kapadia, a italiana Alba Rohrwacher, a marroquina Leila Slimani, o congolês Dieudo Hamadi, o mexicano Carlos Reygadas e o célebre diretor sul-coreano Hong Sang-soo.
Mas a safra que desembarca em Cannes nesta terça-feira também é farta em produções americanas, que carregam os nomes mais pop da edição. É o caso de “O Esquema Fenício”, de Wes Anderson, que volta à Riviera Francesa depois de ter lançado, há dois anos, “Asteroid City”. A novidade trama parece querer voltar às nuances de violação e mistério que rodeavam seu grande sucesso, “Grande Hotel Budapeste”, de 2014, e conta a história de um magnata que se torna objectivo de espionagem e ameaças.
Já Ari Aster, diretor do perturbador “Midsommar”, apresentará “Eddington”. A trama se desenrola a partir de um impasse entre o xerife e o prefeito de uma pequena cidade do Novo México, vividos por Joaquin Phoenix e Pedro Pascal.
Richard Linklater, que há mais de dez anos impressionou a indústria com “Boyhood” —a produção demorou 12 anos para ser feoita, tornando-se uma das mais longas da história do cinema— e no ano lançou o jocoso “Hit Man”, apresenta em Cannes “Nouvelle Vague”. A ocasião parece ideal, já que o filme contará os bastidores da produção de “Breathless”, de Jean-Luc Godard, um dos maiores e mais prestigiados diretores franceses de todos os tempos.
Dos americanos, Kelly Reichardt é a que representa o cinema independente. Ela apresenta “The Mastermind”, filme policial envolvendo o roubo de obras de arte com Josh O’Connor. O galã britânico protagoniza também outro filme na corrida pela Palma de Ouro —”The History of Sound”, de Oliver Hermanus, um romance gay que se passa na Primeira Guerra Mundial. Paul Mescal será o par romântico de O’Connor.
Já a francesa Julia Ducournau volta à competição principal depois de faturar a Palma de Ouro em 2021, com o seu body horror “Titane”, sobre uma mulher que tem fetiche por carros. Seu novo filme, “Alpha”, também é um terror. A história gira em torno da relação entre uma mãe e uma filha que azeda depois que a rapariga volta da escola com uma tatuagem.
Os belgas Luc e Jean-Pierre, que já triunfaram duas vezes em Cannes, apresentam “Young Mothers”, enquanto o iraniano Jafar Panahi lança “A Simple Accident” um ano em seguida o seu conterrâneo Mohammad Rasoulof precisar fugir do Irã para apresentar seu filme no festival. Lynne Ramsay, do perturbador “Precisamos falar sobre o Kevin”, mostrará “Die My Love”, e Joachim Trier, diretor do prestigiado “A Pior Pessoa do Mundo”, chega ao festival com “Sentimental Value”.
Outros filmes que estarão na competição são “Renoir”, da japonesa Chie Hayakawa, “Romería”, da espanhola Carla Simon. A sátira costuma ver com bons olhos a inclusão de diretores menos estabelecidos na competição principal, não só para ventilar o volta, mas também uma vez que uma prova de que o evento não se guia por escolhas seguras, sustentadas por grandes nomes.
Fora da corrida pela Palma, Spike Lee apresenta “Highest 2 Lowest”, inspirado em “Firmamento e Inferno”, do célebre diretor nipónico Akira Kurosawa, com Denzel Washington e o rapper ASAP Rocky. Atores uma vez que Kristen Stewart, Scarlett Johansson e Harris Dickinson estreiam uma vez que diretores na mostra paralela Um Claro Olhar.
Se estúdios costumam evitar a exibição de seus blockbusters hollywoodianos em Cannes para driblar críticos afiados, “Missão Impossível 8” parece não ter zero a temer em seguida a boa recepção de seu predecessor e fará sua estreia no festival.
O Festival de Veneza, que acontece em setembro, costuma ser um termômetro melhor para o Oscar, por exibir filmes que agradam mais a Liceu de votantes. Mas, no ano pretérito, o vencedor da Palma de Ouro, “Anora”, triunfou também na premiação americana —um pouco que aconteceu pela última vez com “Verme”, em 2019. Além do prestígio esperado, é provável que os olhos no Festival de Cannes estejam mais atentos neste ano.
Veja a lista completa dos filmes em competição:
- “After” (Oliver Laxe)
- “Alpha” (Julia Ducournau)
- “The Eagles of the Republic” (Tarik Saleh)
- “Eddington” (Ari Aster)
- “Dossier 137” (Dominik Moll)
- “Fuori” (Mario Martone)
- “The History of Sound” (Olivier Hermanus)
- “It Was Just An Accident” (Jafar Panahi)
- “The Mastermind” (Kelly Reichardt)
- “Nouvelle Vague” (Richard Linklater)
- “O Esquema Fenício” (Wes Anderson)
- “O Agente Secreto” (Kleber Mendonça Rebento)
- “Renoir” (Chie Hayakawa)
- “Romeria” (Carla Simon)
- “Sentimal Value” (Joachim Trier)
- “Sound of Falling” (Mascha Schilinski)
- “Two Prosecutors” (Sergei Loznitsa)
- “The Youngest Daughter” (Hafsia Herzi)
- “Young Mothers” (Luc and Jean-Pierre Dardenne)
- “Die, My Love” (Lynne Ramsay)
- “Mother and Child” (Saeed Roustaee)
- “Resurrection” (Bi Gan)