Funcionando em uma zona cinzenta da legislação desde 2018, o mercado de apostas esportivas online explodiu em publicidade e já figura entre os maiores anunciantes de mídia do país.
A Folha mostrou que 15% da população brasileira diz apostar ou já ter apostado de forma online, com um gasto mensal, entre o totalidade de pessoas que apostam, de R$ 263. O fenômeno é disseminado em todo o país, inclusive entre beneficiários do Bolsa Família, mas tem mais força entre os jovens e os homens.
Essa disseminação é acompanhada de um incremento nas mais diversas mídias, com recordes em patrocínios a alguns dos maiores clubes do futebol brasiliano e cada vez mais espaços nas camisas.
Atualmente, 18 dos 20 times da Série A do Campeonato Brasílico estampam em qualquer lugar do uniforme uma marca do setor, que vem galgando cada vez mais espaço na dimensão mais transcendente, a de patrocinador máster.
Só em janeiro deste ano, Flamengo e Corinthians, os dois clubes de maior torcida do país, trocaram seus parceiros principais por casas de aposta.
De 2023 para 2024, saltou de 11 para 14 o número de equipes que estampam casas de aposta no núcleo dos seus uniformes.
O principal ranking sobre o mercado publicitário, elaborado pelo portal Meio & Mensagem a partir de números apurados pela Kantar Ibope, também registra esse incremento.
Em 2018, unicamente uma moradia de apostas figurava entre os 300 principais anunciantes do Brasil. Em 2022, já foram 12, inclusive com empresas entre os primeiros 50 colocados da lista.
A mais muito colocada era a Sportingbet, que investiu mais de R$ 200 milhões e ocupa o 49º lugar da lista universal.
Em 7 de janeiro deste ano, o Corinthians trocou a Hypera Pharma pela VaideBet, anunciada uma vez que o maior patrocínio máster do futebol brasiliano: R$ 370 milhões por três anos de contrato.
Já para o Flamengo, a Pixbet vai remunerar até R$ 225 milhões em dois anos para ocupar o espaço transcendente do uniforme e desbancar o BRB, banco que agora passará à região da omoplata.
O São Paulo já era patrocinado por uma moradia de apostas, a Sportsbet.io, mas não quis esperar o contrato completar e fechou um novo entendimento, agora com a Superbet, que investirá R$ 156 milhões por três anos. A troca foi oficializada em 19 de dezembro.
A oferta de sites de apostas esportivas é liberada no Brasil desde 2018, depois lei aprovada durante o governo Michel Temer (MDB), mas o tema não foi regulamentado pelo Executivo.
A partir disso, propagandas de bets passaram a dominar a grade da TV ocasião, sobretudo em jogos de futebol. As redes sociais também foram inundadas de anúncios de jogos de apostas, viralizados pela atuação de influenciadores famosos.
O governo Jair Bolsonaro (PL) teve quatro anos para regulamentar o mercado, mas não o fez. Assim, o número de casas de apostas voltadas ao público brasiliano explodiu sem que houvesse regras claras para atuação nesse setor, tampouco órgãos fiscalizadores e controladores específicos para a atividade.
O governo Lula (PT) passou a trabalhar na regulamentação desde o ano pretérito. Já foi aprovada novidade lei para definir taxação e funcionamento dessas empresas, que também deverão se credenciar para atuar no Brasil —atualmente, as empresas que oferecem apostas online no país têm sede no exterior.
A regulamentação totalidade deve ser finalizada ainda no primeiro semestre. A partir daí, para funcionar no país, as empresas terão que executar exigências determinadas pelo Ministério da Herdade, entre elas ter sede no Brasil, além de remunerar uma outorga de até R$ 30 milhões.
Com isso, só poderão patrocinar clubes de futebol —ou realizar qualquer tipo de propaganda— as que obtiverem a autorização do governo.
Médicos e especialistas ouvidos pela reportagem veem com preocupação a onipresença de propagandas de apostas nas TVs e redes sociais, com risco de aumento de casos de vício em jogos e de atração de menores.
O Programa Ambulatorial do Jogo Patológico do Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo) tem recebido um público cada vez mais jovem em procura de tratamento. O perfil também mudou, com maior predominância de viciados em jogos online pelo celular.
Hermano Tavares, coordenador do programa, diz que há um risco de “epidemia de um transtorno psiquiátrico”, o que é facilitado pela quantidade de anúncios e pelas facilidades para jogar. “Agora, o chegada é para todo o mundo que tem celular. E praticamente toda a população tem celular.”
Em um momento de definição e regulamentação do mercado, o investimento das casas de aposta em publicidade e propaganda só cresce.
“Todas as casas querem chegar fortes nesse momento e com bases de usuários relevantes que possam depois ser trabalhadas. Isso explica a corrida pelas propriedades e valores sem precedentes”, observa Ivan Martinho, professor de marketing esportivo pela ESPM.
Há quem questione, no entanto, o incremento das cifras pagas pelas empresas e interprete o patamar atingido agora uma vez que um pico.
“Com a regulamentação, vão ser menos anunciantes de apostas no mercado, porque nem todos [que hoje atuam] vão comprar a licença”, afirma Udo Seckelmann, do escritório Bichara e Motta Advogados. Ele acompanha o tema de perto desde 2019.
Na sua visão, a lei aprovada é a melhor versão do texto desde que ele entrou em debate no Brasil, há muro de cinco anos. Ele projeta que agora o mercado deve se solidar, mas pode também enxugar.
“No mercado regulado, talvez o valor para investimento em marketing seja mais seco. Talvez tenha uma estagnação ou redução dos valores exorbitantes de publicidade, até porque vai possuir um regulador travando publicidade não regulamentada”, completa.
Darwin Henrique da Silva Rebento , CEO da Esportes da Sorte, empresa que atualmente patrocina três times da Série A, concorda em secção. Diz que, em um primeiro momento, a regulamentação deve impulsionar ainda mais os investimentos.
“Porém, a maturidade de mercado fará a alocação de recursos permanecer, a médio e longo prazo, mais eficiente e otimizada. Nessa lance, enxergo que a valoração dessas mídias deve vir a decrescer em alguns anos”, aposta.
Atualmente, as casas de apostas patrocinam não só os clubes mas também alguns dos maiores campeonatos do país, uma vez que a Despensa do Brasil, que estampa a marca Betano.
Para Martinho, a tendência é que os investimentos também passem a se variar, em procura de novos públicos.
“Além de esportes, nota-se que casas de apostas buscam a atenção do consumidor associando-se a criadores de teor de grande engajamento, eventos de entretenimento uma vez que o Carnaval, além de mídia convencional”, diz.
“Nesse paisagem, entende-se que o potencial apostador, além de esporte, também consome outros tipos de teor. Logo, se não posso me discursar com tal cliente através do seu time ou esporte do coração que talvez já esteja ocupado pelo concorrente, posso alcançá-lo por meio de outras propriedades que ele também consome.”