Passados pouco mais de nove anos do rompimento da barragem da mineradora Samarco, a Justiça Federalista absolveu todos os réus que respondiam no processo criminal. A decisão, de primeira instância, foi publicada nesta quinta-feira (14). Ela foi assinada pela juíza Patrícia Alencar Teixeira de Roble, do Tribunal Regional Federalista da 6ª Região (TRF-6).
O rompimento da barragem, localizada no município de Mariana (MG), aconteceu no dia 5 de novembro de 2015. Na ocasião, muro de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos escoaram pela Bacia do Rio Guloseima. Dezenove pessoas morreram e uma mulher que estava pejada, resgatada com vida, sofreu um monstro. Houve impactos às populações de dezenas de municípios até a foz no Espírito Santo.
Ninguém chegou ser recluso, nem mesmo em caráter preventivo ou temporário. O processo criminal começou a tramitar em 2016 com a denúncia do Ministério Público Federalista (MPF). Para 21 pessoas ligadas à Samarco e às suas duas acionistas Vale e BHP Billiton, foram atribuídos o transgressão de homicídio qualificado e diversos crimes ambientais.
Um 22º réu respondia por emissão de laudo enganoso. Trata-se do engenheiro da empresa VogBr que assinou documento garantindo a segurança da barragem que se rompeu. A Samarco, a Vale, a BHP Billinton e a VogBR também eram julgadas no processo e podiam ser penalizadas pelos crimes ambientais.
No entanto, em 2019, uma decisão da Justiça Federalista já havia beneficiado os réus. Foi determinado o trancamento da ação penal para o transgressão de homicídio. Prevaleceu a tese de que os indícios incluídos na denúncia apontavam as mortes uma vez que consequências do transgressão de inundação. Dessa forma, o processo continuou a tramitar envolvendo somente os crimes ambientais. Mas, ao longo do tempo, foram concedidos habeas corpus a alguns acusados. Ou por outra, com a tramitação lenta da ação penal, alguns crimes ambientais prescreveram.
Com a novidade decisão, ficam absolvidos todos os sete que ainda figuravam no processo, incluindo o ex-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi. A sentença também absolve as três mineradoras e a VogBr. Segundo a juíza, a decisão foi tomada diante da “pouquidade de provas suficientes para estabelecer a responsabilidade criminal”. Em sua visão, a diretoria encarregou profissionais qualificados para as operações das barragens e não foi informada sobre eventos que agravaram os riscos. Ou por outra, considerou não ter sido provado que atos ou omissões levaram ao rompimento da barragem. O Ministério Público Federalista (MPF) já anunciou que pretende recorrer.
Esfera cível
Além do processo criminal, tramitam na esfera cível diversas ações envolvendo a reparação dos danos causados na tragédia. Há três semanas, um novo tratado buscando equacionar essa situação foi assinado entre as mineradoras, o governo federalista, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, o MPF e outras instituições de Justiça.
Até logo, o processo de reparação vinha sendo transportado com base no Termo de Transação e Ajuste de Conduta (TTAC), firmado em 2016. Leste tratado, no entanto, vinha sendo considerado insatisfatório. A Instauração Renova, criada para governar todas as medidas reparatórias, se tornou ao longo do tempo cândido de milhares de processos judiciais questionando sua atuação em temas variados uma vez que indenizações individuais, reconstrução de comunidades destruídas, recuperação ambiental, etc. Sua falta autonomia diante das mineradoras também era questionada.
O novo tratado foi fruto de três anos de negociações, em procura de uma repactuação do processo reparatório que fosse capaz se solucionar um passivo de 80 milénio ações judiciais.
Ele estabelece a extinção da Instauração Renova, cria um novo padrão de governança do processo reparatório, fixando novos desembolsos que totalizam R$ 100 bilhões em moeda novo.
Com o término das negociações e a repactuação do processo reparatório, todas as ações movidas pelos governos e pelas instituições de Justiça envolvendo o tema serão arquivadas. Poderão prosseguir ações movidas pelos atingidos, embora para receber valores indenizatórios previstos no novo tratado será preciso dar quitação integral à Samarco.
Entidades que representam às vítimas apontam alguns avanços, mas criticam a falta de participação popular nas tratativas. Também foram ao Supremo Tribunal Federalista (STF) para impugnar cláusulas envolvendo o programa indenizatório, a premência de quitação integral e a falta de reconhecimento de algumas comunidades, entre outras questões. O tratado, no entanto, foi homologado pelo STF sem alterações.
Justiça estrangeira
Paralelamente, o processo reparatório também está em debate na Justiça inglesa, onde mais de 600 milénio atingidos e dezenas de municípios buscam reparação em uma ação contra a BHP Billiton . A mineradora anglo-australiana acionista da Samarco é o cândido do processo porque tem sede em Londres. O escritório Pogust Goodhead, que representa as vítimas, estima que uma pena possa chegar à R$ 260 bilhões, resultando em indenizações mais elevadas do que as previstas no tratado firmado no Brasil. Mas com a exigência do termo de quitação final, cada atingido poderá ter que fazer uma opção entre receber agora ou esperar o resultado do processo inglês.
Na atual lanço do processo inglês, que deve persistir até março do próximo ano, os juízes irão estabelecer se há ou não responsabilidade de a anglo-australiana BHP Billiton. A mineradora sustenta que o processo duplica questões que já estão sendo equacionadas no Brasil. Há um tratado entre as duas acionistas da Samarco – BHP Billiton e Vale – para que, em caso de pena, cada uma arque com 50% dos valores fixados. O processo ainda deve se impelir. Mesmo que a responsabilidade da minerador anglo-australiana seja reconhecida, o cronograma do tribunal inglês indica que a estudo dos pedidos de indenização individual poderá ocorrer somente no término de 2026.