Catadores no rio lidam com informalidade e más condições de

Catadores no Rio lidam com informalidade e más condições de trabalho

Brasil

Luiz Carlos Santiago, de 70 anos, começou a trabalhar com coleta de material reciclável em 2000. No início, buscava material de forma autônoma no Multíplice da Maré, na Zona Setentrião do Rio de Janeiro, até que, em 2002, tornou-se um dos fundadores da Cooperativa dos Trabalhadores do Multíplice de Bonsucesso (Cootrabom), iniciativa associada à Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Universidade Federalista do Rio de Janeiro (UFRJ).


Rio de Janeiro (RJ), 12/06/2025 - Luiz Carlos Santiago, um dos fundadores da Cooperativa dos Trabalhadores do Complexo de Bonsucesso (Cootrabom). Foto: Cootrabom/Divulgação
Rio de Janeiro (RJ), 12/06/2025 - Luiz Carlos Santiago, um dos fundadores da Cooperativa dos Trabalhadores do Complexo de Bonsucesso (Cootrabom). Foto: Cootrabom/Divulgação

Luiz Carlos Santiago, um dos fundadores da Cooperativa dos Trabalhadores do Multíplice de Bonsucesso (Cootrabom). Foto: Cootrabom/Divulgação

Hoje, além de recolher material em empresas públicas e privadas, a cooperativa recebe recicláveis da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) em seu galpão no bairro de Cascadura. É neste sítio que realizam a separação e comercialização do material, conseguindo receptar murado de R$ 1,6 milénio por mês para cada associado da Cootrabom. 

“Não considero suficiente o que conseguimos ratear, tendo em vista o trabalho que prestamos à sociedade. Às vezes, conseguimos um pouco mais pela prestação de serviços para empresas”, diz Santiago à Sucursal Brasil. 

O fundador da Cootrabom também critica a falta de espaços cedidos pelo poder público para armazenar o material coletado e os casos de discriminação. 

“Muitas situações de preconceito acontecem por culpa do nosso trabalho, que é confundido com o trabalho da população em situação de rua”, explica.

O responsável do livro A vida com direitos: recta do trabalho inclusivo e trabalho decente para catadores de resíduos, Dieric Guimarães Cavalcante, pontua que os catadores são responsáveis pela coleta seletiva, triagem, classificação, processamento e comercialização dos resíduos reutilizáveis e recicláveis. 

“Essa atividade só foi reconhecida pelo Ministério do Trabalho e Ofício em 2002, ocasião em que foi inserida na Classificação Brasileira de Ocupações, embora os estudos sobre o tema apontem que o trabalho de catador acompanha o processo de urbanização do Brasil”, explica.

Conforme o Guia Brasílico de Ocupações do Ministério do Trabalho, o Brasil conta com 3.848 catadores de material reciclável registrados. Os homens representam a maioria (70,97%), enquanto as mulheres correspondem a 29,03%. 

A jornada dessas pessoas, relata Cavalcante, depende diretamente do regime de trabalho, que pode ser classificado de duas formas: catadores não cooperados ou autônomos, que atuam nas ruas ou em lixões, e os catadores cooperados, que trabalham em cooperativas ou associações.

“Se autônomos, as jornadas de trabalho diárias podem passar de 16 horas, sem qualquer pausa ou de menos de 30 minutos. Já quando inseridos em cooperativas ou associações, a jornada, em regra, obedece ao limite de oito horas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e é guardado pausa de uma hora”, explica Cavalcante, que também é rabi em sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Recta da Universidade Federalista Fluminense (UFF). 

“O trabalho dos catadores, quando exercido no contexto das cooperativas e das associações, tende a ser mais protegido e, consequentemente, mais digno”, continua. 

Organizados em associações ou cooperativas, os trabalhadores tendem a ter condições melhores de trabalho, graças ao base de governos locais, doações de equipamentos e financiamento para treinamentos, apesar de muitas associações lutarem para sobreviver em razão da falta de reconhecimento formal e padrões de trabalho decentes, uma vez que descreve o livro A vida com direitos: recta do trabalho inclusivo e trabalho decente para catadores de resíduos.


Rio de Janeiro (RJ), 12/06/2025 - Integrantes da Cooperativa dos Trabalhadores do Complexo de Bonsucesso (Cootrabom). Foto: Cootrabom/Divulgação
Rio de Janeiro (RJ), 12/06/2025 - Integrantes da Cooperativa dos Trabalhadores do Complexo de Bonsucesso (Cootrabom). Foto: Cootrabom/Divulgação

Integrantes da Cooperativa dos Trabalhadores do Multíplice de Bonsucesso (Cootrabom). Foto: Cootrabom/Divulgação

Cooperativa de mulheres 

Também na Zona Setentrião do Rio de Janeiro, desde 2005, a Cooperativa de Trabalho CoopQuitungo realiza a coleta de material reciclável na comunidade do Quitungo, em Brás de Pina. Formada unicamente por mulheres e com 14 famílias associadas, a iniciativa foi fundada por Maria do Carmo Barbosa de Oliveira, de 70 anos. 

“A cooperativa foi criada para atender a comunidade, porque as pessoas não tinham condições de ir para o mercado de trabalho”, explica Oliveira. 

Porquê a Cootrabom, a CoopQuitungo realiza coleta de materiais recicláveis em empresas públicas e privadas, além de condomínios, apesar de não terem um espaço próprio para armazenar o material retraído. 

“Na maioria das vezes, nós não temos tanta liberdade. Mesmo posteriormente esses anos todos, trabalhamos em um espaço emprestado por uma igreja católica. Não temos estrutura para muita coisa”, lamenta a fundadora da cooperativa.

Quando surgiu, a cooperativa contava com um grupo de 30 mulheres, mas esse número foi reduzido com o passar do tempo pela falta de infraestrutura, que também afetou a eficiência do trabalho. 

“Começamos com muita deficiência. Não tínhamos sege, trabalhávamos puxando o burrinho sem rabo (carrinho de fardo) na rua pleno. Isso era muito difícil para nós, mulheres, mas com o percurso do tempo ganhamos um caminhão, o que já facilitou. Foi quando tivemos a urgência de colocar os homens para guiar”, conta.  


Rio de Janeiro (RJ), 12/06/2025 - Maria do Carmo Barbosa de Oliveira, fundadora da Cooperativa de Trabalho CoopQuitungo. Foto: CoopQuitungo/Divulgação
Rio de Janeiro (RJ), 12/06/2025 - Maria do Carmo Barbosa de Oliveira, fundadora da Cooperativa de Trabalho CoopQuitungo. Foto: CoopQuitungo/Divulgação

Maria do Carmo Barbosa de Oliveira, fundadora da Cooperativa de Trabalho CoopQuitungo. Foto: CoopQuitungo/Divulgação

Mesmo com a recente inclusão de homens na cooperativa, Maria do Carmo reforça que são unicamente as mulheres que saem para coletar material, com base do Decreto nº 5.940, de 2006, que institui a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e entidades da gestão pública federalista.

Apesar da chegada de um caminhão para facilitar na coleta, a fundadora destaca que os desafios ainda são muitos. O principal deles, ela reforça, é a falta de um galpão para a cooperativa e a urgência de deixar o material na passeio muitas vezes. 

“Somos procuradas para tanta coisa, para palestra, para limpeza, para ações na praia. A CoopQuitungo faz de tudo um pouco, logo por que não somos vistas pela urgência que estamos pleiteando já há tanto tempo?”, questiona. 

Valorização da categoria

O professor Ronei de Almeida, do Departamento de Engenharia Sanitária e Meio Envolvente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), observa que os principais desafios enfrentados por catadores de materiais recicláveis estão relacionados à remuneração e às condições adequadas de trabalho. 

“Entre os principais problemas, destaco a informalidade e a consequente carência de direitos trabalhistas. A maioria desses trabalhadores opera na informalidade, o que dificulta o aproximação a benefícios básicos, uma vez que seguro-desemprego e previdência social. Soma-se a isso as condições precárias de trabalho, marcadas pela falta de infraestrutura e de equipamentos adequados. Esse cenário impacta negativamente a saúde física e mental dos catadores, comprometendo sua qualidade de vida e honra profissional”.

Embora a Política Vernáculo de Resíduos Sólidos (PNRS) estabeleça prioridade para parcerias com cooperativas de catadores de materiais recicláveis, em privativo na implementação, estruturação e operacionalização do sistema de logística reversa, Almeida destaca que o caminho mais eficiente para a valorização dessa categoria é a formalização do trabalho, por meio da estruturação de associações e cooperativas. 

“Essa medida permite retirar o trabalhador individual da informalidade e da situação de vulnerabilidade social em que muitos se encontram no estado do Rio de Janeiro. Outrossim, é fundamental investir na infraestrutura das cooperativas, ampliar o parque de reciclagem e capacitar os profissionais, promovendo qualificação técnica e organizacional”, avalia. “Outro vista que destacaria é a remuneração direta, por secção dos municípios, às cooperativas e associações, reconhecendo o papel estratégico que essas organizações desempenham no gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos”.

Comlurb

Questionada sobre as ações para catadores de material reciclável no Rio de Janeiro, a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) informou que promove o serviço de coleta seletiva, atendendo atualmente 117 bairros da cidade. De convenção com a companhia, todo o material é entregue gratuitamente a 30 cooperativas de catadores, que fazem a separação e comercializam os produtos. 

“O lixo reciclável garante assim trabalho e renda aos cooperativados, beneficiando murado de 450 famílias. O recolhimento porta a porta é feito uma vez por semana, em dias alternados aos da coleta domiciliar. Atualmente, a Comlurb coleta murado de 1.300 toneladas de materiais recicláveis por mês, considerando tanto a coleta feita pela frota própria quanto o volume retraído pelos recicladores autônomos, que reportam mensalmente a quantidade coletada”, afirmou em nota. 

 

*Estagiária sob supervisão de Gilberto Costa

Fonte EBC

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