'cidade; Campo' Encara O Brasil Do Trabalho Precarizado 01/09/2024

‘Cidade; Campo’ encara o Brasil do trabalho precarizado – 01/09/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Trabalhar sempre cansou nos filmes de Juliana Rojas. Seja cuidando de um mercadinho de bairro, em “Trabalhar Cansa”, seja criando um bebê lobisomem em “As Boas Maneiras”. Em meio ao horror, ainda dá para se divertir, simples, uma vez que em “Sinfonia da Necrópole”, um músico no cemitério.

“Cidade; Campo”, o novo longa da campineira de 43 anos, também se reveste do tétrico, delineando um país já exaurido do trabalho precarizado nas metrópoles e do domínio das monoculturas. É uma situação instável que impactou a própria produção, que chega aos cinemas quatro anos em seguida o início da sua gravidez.

“Tivemos duas interrupções, primeiro em 2020, ainda no início do projeto, e depois em 2021, quando a equipe teve uma contaminação [por Covid-19]. Todo mundo ficou muito, mas só retomamos no ano seguinte, e muita gente já não tinha agenda”, diz Rojas, premiada uma vez que melhor diretora na mostra Encontros do Festival de Berlim.

Intempéries também ditam os destinos das personagens nas histórias de transmigração que dividem o filme. Joana (Fernanda Vianna) foge de Brumadinho em seguida o rompimento das barragens da Vale, e se refugia na morada da mana, em São Paulo.

Carrega consigo as memórias do sítio, de seu cavalo branco, das suas plantações, mas acaba entre bicos no Jardim Paulista, bairro sublime da zona oeste da cidade, fazendo limpezas para um Uber de faxineiras.

“O trabalho ocupa grande secção das nossas vidas. E hoje há essas narrativas ilusórias, de que você pode ser seu próprio patrão, mas não tem nenhum recta guardado”, afirma a diretora sobre a personagem, que representa as vítimas em zero indenizadas em seguida o sinistro ambiental.

Ainda assim, Joana cai da leito de madrugada e, uma vez que boa mineira, vê e ensina seu sobrinho-neto a ver o Sol nascer sobre as casas da cidade violenta que parece tão singela nas lentes de Rojas. Entre um serviço e outro, à noite, descansa com as colegas entre cervejas e karaokê.

Em um dos momentos mais tocantes do longa, a personagem de Vianna, atriz veterana do Grupo Galpão, entoa uma cantiga para seu cavalo, Alecrim, criada pela mãe de Rojas em homenagem a um equino de saudosa memória.

A montagem de Cristina Amaral, por meio de fusões, dá conta das mudanças pelas quais Joana passa e do seu luto —não só da morada, mas de um fruto com quem perdeu contato—, enquanto a trama avança para um lado onírico. “Eu palato da transformação da imagem. É importante para estabelecer o tom fantasmagórico”, diz a cineasta.

O enredo muda quando a câmera atravessa uma densa névoa na estrada. De São Paulo, vamos ao interno do Mato Grosso do Sul. Flavia (Mirella Façanha) e Mara (Bruna Linzmeyer) saem da cidade e mergulham na herdade do pai da primeira, morto há pouco. Largam os empregos na esperança de um refúgio, mas se deparam com uma vida imprevisível.

Desfrutam da liberdade rústico, tomam banho de lua de peito destapado. Mas um tanto estranho ronda o lugar, entre lavouras que não dão patente e bezerros natimortos.

“Elas pensam em qualidade de vida, mas na mata habitam muitos mistérios”, diz Façanha. “A violência vai além dos corpos humanos. Quando o colonizador desumaniza o que não se parece com ele, isso se estende à natureza.”

Para transcrever uma progressão e um espelhamento, vemos cá rimas não só com elementos da primeira história —uma vez que uma misteriosa estrela vermelha— uma vez que de toda a curso de Rojas —teatros de sombras, doenças misteriosas, referências folclóricas, duplos.

Destaque ainda para a cena de sexo, uma das mais comentadas durante o Festival de Gramado, onde o filme foi laureado pela sátira. O romance abre ao som do romantismo de “Temporal de Paixão”, de Leandro e Leonardo, mas logo o silêncio preenche o quarto com gestos delicados e muitos planos pormenor.

“Queríamos uma cena com libido, relaxamento. No cinema, a gente tem essa teoria de um sexo sem pausa, sem carinho. Pensamos muito nisso, de a Bruna restringir uma gordurinha nas minhas costas, ou quando eu passo os dedos na ouvido dela”, afirma Façanha. “Mas não foi a cena mais difícil.”

A nudez já faz secção da curso da atriz, que estreia no cinema em seguida o sucesso, no teatro, da peça “Isto É um Preto?”, que rodou o Brasil e a Europa, e na qual Façanha fica nua durante toda a apresentação. “Um corpo preto, gordo, que se movimenta, ele gera ojeriza, nojo. Assim uma vez que em corpos transgêneros, tudo o que não corresponde ao que o padrão espera, gera um desespero. Você se torna um espelho.”

A dificuldade a valer, para Façanha, se deu numa das sequências finais, onde Flavia e Mara começam a se perder na natureza em seguida a chegada de uma amiga do pai, que as conduz pelos mistérios da ayahuasca e, por termo, até o avito.

“Termina em lume, mas não é um termo. O lume regenera, é uma imagem generosa”, diz a atriz. “No dia a dia, há muito a ser feito. Se não, é uma morte por dentro.”

Folha

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