Flutuando sobre a chuva em um vetusto núcleo de produção naval em Veneza, uma série de neons coloridos estampa a frase “estrangeiros em todo lugar” em vários idiomas. A imagem desta instalação, obra que dá título à Bienal de Veneza deste ano, circulou amplamente nos últimos meses e tornou conhecidos do público os autores do trabalho, o coletivo francesismo Claire Fontaine.
Formada em Paris em 2004 pela italiana Fulvia Carnevale e pelo britânico James Thornhill, Claire Fontaine atende no feminino e produz trabalhos que lidam com temas contemporâneos —a exemplo dos neons em Veneza, um observação sobre a imigração— ou que refletem sobre o sistema da arte, questionando a noção de autoria ao se apropriar de obras de outros artistas.
Em um vídeo de Claire Fontaine exposto até o próximo domingo em São Paulo, vemos a filmagem da projeção do vídeo “Empire”, de Andy Warhol, que mostra de maneira estática o Empire State Building, em Novidade York. Em outro, o coletivo recuperou das profundezas da internet uma lição sobre porquê fazer ferramentas para perfurar fechaduras —e deu a oriente trabalho o debochado título de “Instruções para a Partilha da Propriedade Privada”.
Os dois vídeos fazem segmento de uma exposição de trabalhos audiovisuais de Claire Fontaine e do coletivo Bernadette Corporation na Vivenda de Cultura do Parque, na capital paulista, uma mostra de curta duração que merecia permanecer mais tempo em papeleta e ter mais destaque no espaço onde está —se expandindo para além de um pequeno galeria apertado—, por se tratar de um nome tão em subida no giro internacional.
“Vivemos nos passos dos outros e passamos nossas vidas lendo os mortos e olhando para a sua arte. O erudito à novidade e originalidade vem da mercadoria que, porquê o colonialismo, é inimiga do vetusto e adora extinguir a história”, diz por escrito Fulvia Carnevale, do coletivo Claire Fontaine, ao ser questionada por que a apropriação é tão importante no trabalho do coletivo.
O próprio nome da dupla vem de apropriações. “Clairefontaine”, escrito em uma só vocábulo, é uma tradicional marca de cadernos e materiais escolares francesa, e “fontaine”, natividade, é uma referência ao urinol que Marcel Duchamp expôs, para espanto do mundo da arte, que se viu frente a um objeto cotidiano tratado porquê peça de museu. Afora isso, há uma cantiga do folclore francesismo do século 17 intitulada “À la Claire Fontaine”, na natividade clara, que versa sobre amores perdidos.
Levante cabedal de interpretações se estende do nome para os trabalhos de Claire Fontaine, que em casos porquê o dos vídeos precisam de explicações para fazer sentido. Se não, o testemunha se questiona porquê entender um outro filme da exposição, uma lição de 30 minutos sobre métodos de resguardo pessoal. Isto é arte? Por que isso está num espaço de cultura?
Mas talvez procurar uma explicação seja em vão, oferecido que, para Claire Fontaine, a arte entra no lugar de coisas que não podem ser expressas com palavras. “A arte tem a possibilidade de expressar o que as disciplinas discursivas, humanísticas e científicas não podem expor ou explicar. Sua função é nos dar a experiência e representação mais completas da vida, investigar o significado e a dificuldade do que sentimos”, afirma Carnevale.
Em paralelo à exposição na Vivenda de Cultura do Parque, e editora Glac coloca nas prateleiras uma crestomatia com todos os textos de Claire Fontaine. São 46 ensaios escritos de 2004 a 2024, oito dos quais inéditos, que cobrem, por exemplo, o papel dos curadores no mundo da arte, os alugueis estratosféricos dos apartamentos em Paris e até amores perdidos.
O tom dos textos alterna entre o desencanto com a economia de mercado, que tende a transformar tudo e todos em mercadorias, e a esperança de que um pouco possa ser feito diante disso. De um modo ou de outro, a publicação é uma utopia anticapitalista.
Seu título, “Greve Humana”, vem de um noção de mesmo nome mediano na prática de Claire Fontaine, e que é abordado sob diversos aspectos em vários ensaios da publicação.
A greve humana, inspirada pelo movimento feminista italiano da dezena de 1970, seria a greve das greves, capaz de tornar seus participantes uma espécie de tela em branco desligada da rede numulário e repleta de potencial para gerar um pouco novo. O sujeito porquê senhor de si é um noção custoso à psicanálise, embora esta extensão do conhecimento não seja abordada no livro.
“O que é principal nessa prática [da greve humana] é a consciência do indumentária de que estamos trabalhando não exclusivamente quando exercemos nossa profissão remunerada, mas também e principalmente quando, sem saber, estamos engajados na reprodução social. A greve humana desfaz nossa cumplicidade subconsciente nas dinâmicas que nos oprimem e nos prendem a uma posição subalterna”, diz Carnevale.
“Por meio da greve humana, damos um passo para longe de nossa subjetividade, olhamos para ela de fora e nos ‘desidentificamos’ daquilo que nos condena a depender de pessoas e crenças que nos prejudicam e nos impedem de nos associarmos aos nossos verdadeiros companheiros, com os quais poderíamos mudar a nós mesmos e ao mundo”, acrescenta ela.
“A greve acontece no nível de nossa cumplicidade emocional com nossa vexame, que é sempre direta ou indiretamente produtiva e lucrativa para outra pessoa.”