Cláudia abreu volta às novelas após sucesso no teatro

Cláudia Abreu volta às novelas após sucesso no teatro – 27/04/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

“Mas por que Virginia Woolf?”, perguntou o diretor de teatro Amir Haddad ao ser convidado pela atriz Cláudia Abreu para guiar o solilóquio que ela vinha criando sobre a escritora. Cinco anos detrás, a autora inglesa não desfrutava da mesma popularidade de conterrâneas suas, uma vez que Jane Austen. Mas Abreu sabia que havia uma questão fundamental para trazê-la à vida nos palcos.

“A humanidade dela. A obra dela é atemporal e o que aconteceu na vida dela, todos esses temas que fizeram segmento da sua vida são relevantes até hoje —a requisito feminina, a saúde mental, o libido, a liberdade do libido. Falar dela é falar de todos nós, falar da existência”, diz a atriz, de 54 anos.

Passados dois anos desde a estreia, sua percepção se provou certeira. Com 140 apresentações em 30 cidades desde 2022, o primeiro solilóquio da atriz virou um fenômeno, superando 48 milénio espectadores. “Virginia”, inclusive, terá uma curta temporada na Caixa Cultural do Rio de Janeiro, entre 8 e 11 de maio.

O sucesso, aliás, não se deu unicamente junto ao público costumeiro do teatro, mas entre os espectadores que há décadas a acompanham pela TV e lhe perguntavam quando voltaria a fazer romance. O questionamento frequente a influenciou muito ao receber o invitação da autora Rosane Svartman e do diretor Allan Fiterman para viver Filipa na próxima romance das sete da Mundo, “Dona de Mim”, que estreia nesta segunda-feira.

Na trama —que lembra a história de Mary Poppins, a babá que transforma a vida de suas crianças—, ela será uma mulher com duas frustrações. A primeira, a materna, em decorrência de sua relação com as filhas. A segunda, a dor de ser atriz e cantora sem nunca ter tido reconhecimento profissional.

“O invitação foi para discutir saúde mental. Discutir quem tem humor instável. Filipa é muito intensa. Ou está na euforia excessiva, na empolgação, com um projeto novo, um sonho novo, ou está depressiva, achando que zero deu notório. Ela é agressiva, muito reativa. Apesar de não estar esperando fazer romance, pensei que era uma oportunidade maravilhosa.”

Filipa, à sua maneira, é uma espécie de avesso da atriz, que tem quatro décadas de curso. Tudo começou com uma substituição. Sua mana havia recusado fazer o curso de teatro do Tablado —a mais importante escola de formação de atores do Rio de Janeiro, fundada pela dramaturga Maria Clara Machado. “Eu quero ir”, disse Abreu, aos dez anos.

E ali se encontrou. “Fui vendo que os meus melhores amigos eram de lá, que eu esperava a semana inteira para chegar a lição”, lembra. O prestígio da escola fazia com que muitos produtores procurassem seus alunos para testes em comerciais, na televisão e no teatro. “Muitas vezes eu passava. Aquilo me dava também um sinal de que poderia dar notório.”

Sua estreia no teatro aconteceu em 1986, com a personagem Wendla, de “O Despertar da Primavera”. Principal obra do dramaturgo teuto Frank Wedekind, a peça narra o confronto entre jovens em plena invenção sexual numa sociedade enxurro de regras e tabus —um conflito, aliás, condizente com um país que despertava para a democracia em seguida 21 anos de ditadura militar.

Três anos depois, teve seu primeiro encontro com Virginia Woolf, ao interpretar uma série de personagens na adaptação de “Orlando” dirigida por Bia Lessa. “Quando voltei à obra da Virginia, li, obviamente, com outro olhar, muito mais madura.”

Essa maturidade foi resultado não unicamente do tempo, mas do trabalho. Em 1990, ela fez sua primeira protagonista na televisão, a Clara de “Bojo de Aluguel”, romance de Gloria Perez que contava a disputa por uma menino gerada a partir do procedimento científico.

“Clara foi uma personagem que tinha de viver coisas para as quais eu mesma não tinha maturidade para viver. Vivenciar o instinto da maternidade e, ao mesmo tempo, ter esse buraco de que o rebento não é seu, estando dentro de você, era muito multíplice. Eu me lembro, com 19 anos, de buscar essa dificuldade, esse entendimento do sentimento poderoso de maternidade.”

Em paralelo, a atriz ensaiava, sob direção de Antonio Abujamra, o personagem mais multíplice da dramaturgia ocidental —Hamlet. “‘Imagina se vou fazer Hamlet com 20 anos, vão me encontrar pretensiosa’, disse ao diretor. Aí ele perguntou se eu preferia permanecer na facilidade dos papéis cotidianos. Depois dessa, decidi aventurar.”

A montagem, em 1991, tinha unicamente mulheres vivendo os personagens da trama de Elsinore. Entre as atrizes, estavam Vera Holtz, que interpretava ao mesmo tempo a Rainha Gertrudes, mãe de Hamlet, e Ofélia.

No ano seguinte, Abreu fez uma de suas personagens mais impactantes, a Heloisa de “Anos Rebeldes”, romance escrita por Gilberto Braga. Era uma jovem da escol carioca que se transforma numa guerrilheira e tem um final trágico.

“‘Anos Rebeldes’ é uma vivência muito poderoso. Fez muito sucesso e teve esse impacto de dizerem que teve influência no impeachment de Fernando Collor. Quando vi, tinha gente da União Pátrio dos Estudantes me ligando e fiquei meio assustada. É evidente que queria participar de tudo, era em prol ao impeachment, mas não queria virar a personagem na vida real.”

O retorno à temática da ditadura e da justiça de transição, em decorrência do sucesso de “Ainda Estou Cá”, trouxe de volta outro filme no qual Abreu atuou, “O que É Isso, Companheiro?”. Na obra de Bruno Barreto inspirada no livro de Fernando Gabeira, sobre o sequestro do mensageiro americano Charles Elbrick, ela deu vida a outra guerrilheira, Renneé. As duas personagens devolveram Abreu à puerícia.

“Anos Rebeldes” marcou também o início de sua parceria com Gilberto Braga. Em 1994, Abreu fez Alice, juvenil oriunda do protesto dos “caras pintadas” em “Pátria Minha”. Em 1999, viveu a escrava branca Olívia em “Força de um Libido”. Em 2003, fez Laura em “Notoriedade”.

“Os vilões de Gilberto Braga eram uma grande sátira social. Era muito prazeroso interpretar os textos dele. Sempre tinha uma consistência, era um texto muito muito construído, com muito humor, e ao mesmo tempo com muita discussão. É muito bom quando existe um tópico relevante para discutir em uma romance.”

Folha

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