Como Álvaro Siza Desenhou Museu Labiríntico Em Portugal 26/03/2024

Como Álvaro Siza desenhou museu labiríntico em Portugal – 26/03/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Parece desejável —para não expressar obrigatório— a todo arquiteto atual que seus projetos propiciem um sentimento de conforto por meio de uma transparência visual em cada envolvente onde se está, permitindo a rápida dedução de onde se encontra a ingressão do prédio, a saída ou mesmo o banheiro.

Raros são os arquitetos contemporâneos que proporcionam a desorientação. Curiosamente, segundo a mitologia grega, a primeira encomenda feita a um arquiteto foi uma fundação dentro da qual o propósito seria se perder. Assim, Dédalo projetou o labirinto onde habitava o Minotauro.

No último século e meio, poucos se recordaram dessa gênese da arquitetura quando estiveram frente à folha em branco numa prancheta ou à tela do computador. Entre as exceções está Álvaro Siza Vieira ao projetar o Museu de Arte Contemporânea de Serralves, na cidade portuguesa do Porto.

Quem visitar o espaço cultural pela primeira vez pode se sentir desnorteados. Na sucessão das salas de Serralves, cada envolvente é parecido e dissemelhante: cores claras predominam na tinta branca das paredes e no mármore dos rodapés e rodameios. Por sua vez, cada recinto tem uma dimensão e uma forma específicas —às vezes, suas geometrias são irregulares—, cada passagem entre uma galeria e outra é uno, cada solução para ingressão da luz proveniente ou visada para o jardim é distinta.

O trajectória do museu está longe de ser linear. Vira-se à direita, à esquerda, encontram-se algumas escadas para mudar de andejar, depara-se com bifurcações. É normal que, no meio de Serralves, o visitante questione-se para qual lado está a ingressão por onde passou minutos antes, e não saiba responder. Esta é a requisito ideal para provocar tortura e comoção, palpitações e excitação.

Álvaro Siza, 90 anos, recebeu a reportagem em seu mítico escritório na rua do Aleixo, no Porto, no final da tarde de sábado, 24 de fevereiro, dia seguinte à cerimônia de orifício da novidade fileira do Serralves que contou com a presença do portanto primeiro-ministro de Portugal, António Costa.

Laureado com o prêmio Pritzker em 1992, o grande arquiteto português afirmou que seu pai havia nascido em Belém do Pará logo ao dar as boas-vindas ao espaço de trabalho, onde prefere passar inclusive os fins de semana.

Depois, Siza fez menção ao seu maior projeto construído no Brasil, a Instauração Iberê Camargo, em Porto Feliz, e lamentou que, em fotos recentes, as fachadas lhe pareciam sujas: “Betão branco precisa ser lavado”, diz ele, usando a frase portuguesa para concreto.

Sobre a desorientação em Serralves, Siza diz que ela não era muito o propósito e seguiu com uma longa explicação sobre os obstáculos do processo de projeto e construção do museu original. Transcorrido entre 1989 e 1999, passou por diversas versões, ao sabor dos desejos das figuras políticas envolvidas, das questões orçamentárias e dos gostos dos diferentes curadores que passaram pela instituição.

Mesmo para um arquiteto consagrado uma vez que ele, a autonomia do responsável do projeto é limitada, devido a demandas do cliente ou mesmo contingências alheias. “Embora eu perca-me”, diz Siza, em tom de confidência. “Quando eu lá vou a Serralves, eu perca-me, uma vez que você disse. Isso que estás a expressar do labirinto, de onde é que eu estou.”

O vínculo entre o arquiteto e a instituição manteve-se próximo ao longo dos anos —o museu fica entre o escritório e a residência de Siza. No parque de Serralves, ele também foi o opífice dos projetos da Mansão do Cinema Manoel de Oliveira, em 2019, da Mansão dos Jardineiros, em 2021, e pelo restauro do vetusto palacete art déco da quinta que veio a se tornar um jardim público e meio cultural contemporâneo.

Em 2015, Siza confiou a Serralves uma secção do seu registro pessoal de desenhos e documentos. Na quadra, seu ror foi dividido também com a Instauração Calouste Gulbenkian, em Lisboa, e com o Meio Canadense de Arquitetura, em Montreal.

A última encomenda de Serralves para Siza foi a extensão do museu, de quem intuito era ampliar a extensão expositiva e a suplente técnica para a coleção permanente. Durante a entrevista, ele relatou que os administradores da instituição pediram que essa ampliação não parecesse a construção de um incluso. Portanto, o chegada precisava permanecer o mesmo do prédio em funcionamento há mais de duas décadas.

Para contemplar tais aspectos, o arquiteto procurou no parque uma extensão na qual pudesse implantar a novidade fileira de três andares e decidiu por um trecho com poucas árvores —somente cinco precisaram ser transplantadas durante a obra, o que facilitou a aprovação do projeto pelos órgãos públicos locais.

Algumas salas e escadas da novidade fileira têm disposições diagonais entre si devido ao esforço de salvar a vegetação preexistente. “Costumo expressar que quem desenhou o prédio, em secção, foram as árvores. Se não gostarem do projeto, não culpem a mim, culpem as árvores”, afirma Siza.

Entretanto, algumas dezenas de metros afastavam o museu concebido no final do século pretérito e a novidade fileira construída em um ano e meio na presente dezena de 2020. A isso se somava outro duelo: entre as duas partes passa a rua interna de veículos até a garagem do museu.

Siza solucionou tais adversidades com uma ponte. Isto é, um corpo suspenso, o qual internamente nem se percebe que se está sobre um considerável vão livre. Essa perda de referência entre a requisito exterior e o espaço interno é próprio ao sentimento da desorientação.

Tal ponte pode ser também descrita uma vez que um galeria longo, suficientemente largo, de paredes enviesadas, hermético apesar de ter uma janela com proporção quadrada de piso a teto, e uma instalação sonora da artista portuguesa Luisa Cunha, em que se ouve a frase “é o que é” em português e inglês, “it is what it is”.

Serralves é um prédio cujas fachadas não sobressaem aos olhos. Tal uma vez que no Labirinto de Creta, o meândrico trajectória interno do museu subjuga a forma exterior. Todavia, Siza quis marcar a chegada à novidade fileira com um elemento sui generis: um portal em formato triangular.

Por trás dessa passagem de cinco metros de fundura, há uma janela de quem perímetro também é um triângulo isósceles, porém em menor graduação e com o vértice mais pontiagudo voltado para insignificante. Com a somatória dessas duas formas invertidas, emerge a imagem de categórica formosura que sinaliza a ingressão à novidade fundação, a qual, em uma justa homenagem, recebeu o nome de fileira Álvaro Siza.

Duas sinais temporárias estão ocupando as salas recém-inauguradas. “Anagramas Improváveis” traz trabalhos artísticos pertencentes à coleção de Serralves.

Buscando estabelecer relações visuais e conceituais entre artistas e obras de diferentes décadas e origens geográficas, a curadoria do museu selecionou trabalhos dos brasileiros Cildo Meireles, Lygia Pape, Gretta Sarfaty e Anna Bella Geiger, dos italianos Giovanni Anselmo e Marisa Merz, do germânico Wolfgang Tillmans, do americano Merce Cunningham, do nipónico On Kawara, além de diversos lusitanos, uma vez que Paula Rego.

Já “C.A.S.A. – Coleção Álvaro Siza Registo” apresenta uma profusão de desenhos, de maquetes e de fotografias de projetos construídos pelo português. Com a curadoria do arquiteto António Choupina, a exposição apresenta uma noção expandida de moradia, com as primeiras obras que Siza fez para a própria família, somadas a uma reflexão sobre projetos de grande graduação enquanto casas de cultura ou de negócio ou de trabalho.

Não distante do grande padrão de madeira retratando a Instauração Iberê Camargo, encontra-se uma pequena e singela maquete do inédito projeto para o pavilhão de Julião Sarmento que Siza concebera para Inhotim, mas cujos planos estão em suspenso desde a morte do artista português em 2021. Nesta concepção destinada para Minas Gerais, Siza também usara o triângulo isósceles para recortar uma parede.

Em meio à opulência das formas arquitetônicas na exposição, capta a atenção um conjunto de desenhos antropomórficos feitos por Siza. São dezenas de croquis de pessoas e animais em movimento ou cenas banais e cotidianas. Os traços de Siza são sempre contínuos, mas levemente trêmulos.

É uma vez que se a regularidade e a irregularidade estivessem concomitantemente presentes nas linhas por ele riscadas —uma descrição pertinente aos seus projetos arquitetônicos.

Em meio à repleção de ilustrações, veem-se autorretratos nos quais, por vezes, aparece o rosto do arquiteto, por outras, somente suas mãos durante o treino do esboço numa mesa de bar —um evidente ato metalinguístico.

Na pluralidade de temas esboçados, dignos de nota são as representações de centauros: os seres híbridos e imaginários com corpo de cavalo sob um tronco e uma cabeça humana. Desde a Idade Média são frequentemente confundidos com o morador do Labirinto de Creta, o Minotauro de corpo humano e cabeça de touro.

Os centauros de Siza conservam um sutil erotismo: esses seres miscigenados têm seus torsos contorcidos, entrelaçando-se com homens e forjando posturas inverossímeis. É uma vez que se o arquiteto ali nos revelasse as formas naturais no estágio prévio à desfiguração e à abstração.

“Cá em Portugal, depois do jantar, a família permanecia ao volta da mesa, com as senhoras a costurar. Meu pai, que era professor, ficava a emendar os trabalhos dos alunos. E meu tio Joaquim, não sei por quê, sentava-me ao pescoço e me ensinava a riscar”, lembra Siza ao ser questionado sobre os desenhos.

Havia uma peculiaridade com Joaquim. “Ele era um péssimo desenhista. Na verdade, nem queria ser desenhista, mas foi um ótimo pedagogo porque nunca mais me saiu a vontade de riscar.”

Assim, Álvaro Siza começou a riscar aos sete anos seguindo as temáticas indicadas pelo tio. O primeiro mote foram os cavalos, em seguida os caubóis. Anos se passaram para a temática equina encaminhar aos centauros.

Em determinado momento, o tio incentivou o sobrinho a assinar os desenhos —AJO foi sua primeira epíteto artística e advinha dos dois primeiros nomes de Álvaro Joaquim de Melo Siza Vieira. Na exposição “C.A.S.A.” estão alguns desenhos de garoto, os quais Siza disse sentir uma certa vergonha de expor tantas décadas depois.

O rol de recordações se seguiu com a memorial dos anos de curso universitário, entre 1949 e 1955, com privado carinho a uma figura: “Tive a sorte de ter uma vez que professor o Fernando Távora, que depois foi um grande camarada por toda a vida. Uma pessoa extraordinária.”

Siza o descreveu uma vez que uma figura culta que nutria interesse tanto pelas novidades de sua quadra, tendo sido representante português em diferentes edições do Congresso Internacional de Arquitetura Moderna e relatando o que se debatia a seus alunos do Porto, quanto pela tradição construtiva de vilarejos e zonas rurais do país, o que se comprova por sua participação no enciclopédico “Interrogatório à Arquitectura Popular em Portugal”.

Quando ainda aluno da Faculdade de Arquitetura do Porto, Siza escutou do diretor que ele “não fazia teoria do que é arquitetura antiga ou moderna.” A sátira foi o impulso para ir a uma livraria e comprar as revistas internacionais que chegavam à cidade.

Adquiriu quatro números da francesa Architecture D’Aujourd’Hui, que lhe introduziram às obras de Walter Gropius, Richard Neutra e Alvar Aalto. Oriente rabino finlandês despertou privativo interesse em Siza, que o conheceu em seu ateliê durante uma viagem pela Escandinávia.

Posteriormente uma hora e meia de conversa e seis cigarros acesos pelo nonagenário dédalo, o vasto elenco de figuras citadas e episódios relatados terminou numa reflexão sobre as origens de tudo que concebeu na vida.

“Eu conheci tanta coisa. A gente tem uma capacidade limitada de voluntariamente usar o que estamos conhecendo, mas fica tudo na cabeça. Portanto, eu passei a ter milénio influências que eu não controlo. Mas quando estou a trabalhar, o subconsciente é um grande camarada e nos ajuda.”

O jornalista viajou a invitação da Instauração Serralves

Folha

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *