Em 1958, Eduardo de Paula trabalhava uma vez que diagramador e ilustrador em uma revista de Belo Horizonte quando uma amiga, Wilma Martins, tão jovem quanto ele, fez o invitação. “Você está perdendo tempo, vamos à escola do Guignard. Sua vida vai mudar.”
Martins se referia ao Instituto de Belas Artes, mais tarde Escola Guignard, que havia sido criado em 1944 na capital mineira, sob a gestão do prefeito Juscelino Kubitschek. Secção das aulas era conduzida por Alberto da Veiga Guignard, o mentor do projeto de ensino e já considerado àquela profundidade um dos expoentes do modernismo nas artes visuais no Brasil.
No dia seguinte, De Paula começou a frequentar o curso e ficou extasiado com um pacote zero ortodoxo para a era: o incentivo à liberdade criativa dos estudantes, a aversão a qualquer tipo de academicismo, a exiguidade de notas, chamadas e diplomas. “De vestimenta, mudou a minha vida”, diz ele, aos 86 anos, um dos poucos ex-alunos de Guignard ainda vivos.
Mais tarde, Eduardo de Paula se tornou professor da Universidade Federalista de Minas Gerais, a UFMG, e um artista gráfico de prestígio na cidade.
A escola impulsionou artistas em início de curso, mas não só. Guignard, nascido em Novidade Friburgo, no Rio de Janeiro, com a juventude e segmento da juventude vividas na Alemanha, chacoalhou o envolvente cultural de Belo Horizonte para a indignação dos puristas.
Quando o instituto abriu as portas, a capital mineira, com menos de 300 milénio habitantes, estava à margem de boa segmento das inovações que se espalhavam por Rio de Janeiro e São Paulo.
“Guignard partiu Belo Horizonte ao meio”, diz o estatuário Amílcar de Castro no documentário “Guignard: A Instrução do Olhar”, de 1996, de Paulo Vilara. Segundo o estatuário, um dos alunos que se consagraram nas décadas seguintes, “a vinda dele [do Rio para BH] dividiu esse terreno das artes em ‘antes de Guignard’ e ‘depois de Guignard’”.
O excitação não se restringia aos alunos. “A escola de Guignard é, sem obséquio, a melhor do Brasil”, escreveu Candido Portinari, seu parceiro de geração —Portinari é de 1903, e Guignard nasceu em 1896.
Ao completar oito décadas, a escola é lembrada ao longo deste ano pelo Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Na terça (27) e na quarta (28), a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais apresenta um repertório fundamentado em canções de compositores do estado, com participação de Toninho Horto e Marcus Viana, entre outros.
Na quinta (29), a principal galeria do espaço abre a exposição “A Paixão segundo Guignard: Escola Guignard 80 Anos”, com 196 obras, das quais 34 são assinadas pelo pintor e professor homenageado. As demais são de artistas que atuaram uma vez que assistentes dele, Edith Behring e Franz Weissmann, e alunos, uma vez que Amílcar, De Paula, Farnese de Andrade, Maria Helena Andrés e Wilma Martins.
A programação continua no segundo semestre, com duas novas exposições, um ciclo de filmes e um seminário.
Não é casual que Guignard e seus alunos sejam celebrados pelo Palácio das Artes. A escola funcionou neste espaço de 1950 ao início dos anos 1990, quando, integrada à Universidade Estadual de Minas Gerais, a UEMG, ganhou sede própria, concebida por Gustavo Penna, um dos grandes nomes da arquitetura do estado.
“A Escola Guignard começa revolucionária e continua assim. Ela mudou a perspectiva do olhar cá em Minas Gerais, promovendo a originalidade, sem pânico de errar”, afirma Sérgio Rodrigo Reis, presidente da Instauração Clóvis Salso, que administra o Palácio das Artes e foi aluno da escola na dezena de 1990, período em que já era liderada por sucessores de Guignard.
Foi o pintor quem conduziu Amílcar de Castro nessa orifício criativa para a imprecisão de que fala Reis. “O erro faz segmento do acerto, é preciso incorporar o erro ao que você está fazendo”, disse o estatuário.
Amílcar, aliás, está na exposição uma vez que responsável de obras e também uma vez que retratado. O curador da mostra, Paulo Schmidt, concluiu que uma tela de uma coleção pessoal, que apresenta uma figura masculina até portanto não identificada, é um retrato do estatuário feito por seu professor.
Envolvido há mais de 30 anos com estudos e projetos sobre o modernista, Schmidt labareda a atenção para outro retrato, o de Juscelino Kubitschek. “É uma obra do momento em que Guignard chega a Belo Horizonte, com aquele que o convidou para vir a Minas. Aliás, é uma pintura de ótima qualidade.”
Nem todos, porém, gostaram do modo uma vez que o portanto prefeito da capital mineira foi retratado. A tela foi exibida pela primeira vez numa exposição em maio de 1944, dois meses depois do início das atividades da escola. Ao comentar a mostra, um jornalista do quotidiano Estado de Minas mencionou o “retrato incompleto do dr. Juscelino Kubitschek, a ser concluído oportunamente pelo sr. Alberto da Veiga Guignard”.
Não havia o que “concluir”, aquele era o traço do artista, para o delícia de alguns mineiros e irritação de outros tantos.
Guignard foi decisivo “para o sazão do envolvente artístico sítio, que podemos invocar de pré-moderno naquele momento. Os embates que tinham sucedido no Rio e em São Paulo começaram a lucrar forma em Belo Horizonte, e foi Guignard quem causou essa faísca”, diz Marcelo Bortoloti, responsável da biografia “Querubim Mutilado”, lançada em 2021 pela Companhia das Letras.
Guignard levou outros ares a Minas, assim uma vez que a vida no estado colocou a obra do artista em um novo projecto. Elementos uma vez que a luz e as montanhas da região são muito muito assimilados pelo pintor, cuja “obra dá um salto”, de conciliação com o biógrafo. “Ele encontra um estilo muito pessoal, que vai desenvolvendo até o final da vida [morreu em 1962].”
São da tempo derradeira de Guignard algumas das suas mais valorizadas paisagens oníricas, em que construções, uma vez que as igrejas barrocas, parecem flutuar pela tela, sem um ponto fixo de pedestal.
Para Schmidt, o curador, uma grande diferença entre o olhar sobre o artista e professor no pretérito e a visão sobre ele hoje é a compreensão mais detalhada do varão que foi Guignard. Nesse sentido, um defeito de nascença, o lábio leporino, ocupa um papel de relevo, contribuindo para o alcoolismo e os desencontros amorosos.
“A fala de Guignard era esganiçada, fanhosa, por isso gesticulava muito para se fazer entender”, diz o curador. “Aliás, era desconfortável fazer uma repasto ao seu lado. Por isso, acabou se isolando muitas vezes, mas não se tornou uma pessoa amarga. Devolveu com mel ao mundo aquilo que a vida impôs para ele.”