Como Renascer Pode Superar A Crise De Audiência Da Globo

Como Renascer pode superar a crise de audiência da Globo – 21/01/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Embora tenham se pretérito três décadas desde que “Renascer” foi ao ar, o cenário que seu remake vai encontrar, ao estrear nesta segunda-feira, guarda semelhanças vitais com o pretérito.

À quadra, a fita das nove da Orbe, que era exibida às oito, amargava uma crise inédita, quando o meato perdeu o domínio sobre a audiência ao ser desbancado pela extinta TV Manchete com “Pantanal”.

Depois de rejeitar a teoria de Benedito Ruy Barbosa para a saga de José Leôncio —com pânico do quanto gastaria para produzir uma romance na região pantaneira, ainda pouco desbravada, e de os atores se recusarem a se expor aos riscos das gravações—, a Orbe recontratou o responsável e deu a ele liberdade irrestrita para ortografar a história que é considerada sua obra-prima.

Hoje, a emissora se vê numa situação semelhante, ao invocar Bruno Luperi, neto de Barbosa, que também escreveu o remake de “Pantanal” há dois anos, para ajustar “Renascer”. É que, ainda que tenha reagido em sua reta final, “Terreno e Paixão”, sua antecessora, estreou com a pior audiência da história do horário sublime da Orbe.

“Travessia”, que veio antes, também teve capítulos com recordes negativos, enquanto as outras duas novelas em exibição também sofrem —”Elas por Elas” acumula os piores números históricos para a fita das seis e “Fuzuê” é o título de menor sucesso no horário das sete em uma dez.

Se a novidade versão de “Pantanal” fidelizou o testemunha porquê não se via desde “Avenida Brasil”, em 2012, a de “Renascer” poderia simbolizar uma chance de contornar a crise. Para os cofres da Orbe, a romance já é considerada um sucesso.

Com seus dois cotistas fixos, Itaú e Lacta, a obra vai recepcionar R$ 553,2 milhões. Haverá ainda outras cinco empresas, que vão desembolsar um totalidade de R$ 65 milhões. Luperi, de 35 anos, diz ter a mesma liberdade do avô para ortografar o remake.

Antes intersexual —à quadra chamada de hermafrodita—, Buba, que cedia aos pedidos de Zé Venâncio e fazia uma cirurgia para modificar sua genitália, agora será uma mulher trans interpretada por uma atriz trans —a estreante Gabriela Medeiros, de 22 anos.

A comunidade LGBTQIA+ também deve se ver representada com a geração de um personagem gay, ainda mantido em sigilo, enquanto a taxa feminista deve ver um gesto com Zinha, que antes era Zinho, um funcionário de crédito de Inocêncio.

O padre Lívio, que vivia um dilema ao se enamorar por Joaninha, por ser celibatário, agora será um pastor, ao lado de Iolanda, a Dona Patroa, que será uma evangélica fervorosa. A mudança pode ser compreendida porquê mais uma tentativa da Orbe, depois da romance “Vai na Fé”, de simbolizar os evangélicos. Até 2030, eles devem ultrapassar os católicos no posto de maioria religiosa do país.

Outras alterações são mantidas em sigilo, porquê os rumos de Mariana, que no pretérito levou Adriana Esteves a uma depressão e quase a fez desistir da curso de atriz. Sua personagem, uma jovem apaixonada por Inocêncio e um rebento dele ao mesmo tempo, causava conflitos entre a família e não era aceita pelo público.

Luperi, no entanto, diz que seu objetivo não é preencher cotas de minorias sociais ou aprazer a qualquer público específico, mas “trazer a história para os dias de hoje e terebrar o rol de discussões”. “O remake tem que ter saudosismo, mas precisa trazer um frescor com novos questionamentos”, ele afirma. “Mas não tenho uma agenda para manipular discussões. A história não pode ser maniqueísta.”

“O progressismo precisa do conservadorismo e vice-versa, senão a sociedade se torna estática. O dramaturgo deve buscar a isenção e deixar os personagens se exporem. Eu me abasteço das contradições”, diz ele.

Humberto Carrão, que interpreta o protagonista na primeira período do folhetim, lembra a complicação da fé do personagem porquê uma dessas contradições, num momento em que o Brasil vê a intolerância religiosa crescer, sobretudo contra as religiões de matriz africana —no ano pretérito, as ocorrências dobraram em relação ao ano anterior, segundo a Polícia Social.

“O personagem respeita o cramulhão que ele guarda numa garrafa, o jequitibá-rei com que fez um pacto e Deus e Nossa Senhora, das quais papel ele não deixa de questionar e discutir com o padre Santo.”

Segundo Carrão, no entanto, a grande mudança é a maneira porquê seu personagem vê a terreno. Marcos Palmeira, que interpreta o protagonista em sua período adulta —papel que na versão original era de Antônio Fagundes—, concorda. Antes, era o rebento de Inocêncio, João Pedro —justamente quem Palmeira fazia há 30 anos—, que punha a mão na volume. Agora é o pai, que rejeita a pecha de coronel.

“O novo Zé Inocêncio não quer só explorar a terreno. Ele tira e devolve. É o que o momento pede. Precisamos ter outro olhar para a forma de produzir iguaria no Brasil. O que estamos vivendo, levante calor infernal, é fruto da exploração desenfreada das nossas riquezas naturais”, diz Palmeira, que mantém uma rancho de produção orgânica na região serrana do Rio de Janeiro há duas décadas.

O personagem, conta a figurinista Marie Salles, é inspirado em Ernst Götsch, um lavrador suíço, considerado o instituidor da agrofloresta, que vive na Bahia. O concepção combina a produção de comida, a recuperação de florestas e nascentes e o término da monocultura, para que uma espécie possa fortalecer a outra contra pragas. “É porquê se Zé Inocêncio tivesse brotado da terreno, com camiseta e calça missão sujas de terreno”, diz Salles, ao mostra o guarda-roupa do personagem.

A mudança também é vista nos cenários. Poucos metros separam a rancho de soja de “Terreno e Paixão” e a de cacau de “Renascer” nos estúdios da TV Orbe, na zona oeste do Rio de Janeiro. Mas o laranja que domina as paredes da primeira construção e o branco um tanto quanto sujo e mofado da segunda sublinham suas diferenças.

O novo folhetim se distancia da lavradio opulenta do interno de Mato Grosso do Sul, turbinada por uma retrato de iluminação dourada e a trilha sonora do agronejo moderninho de Ana Castela, para mostrar uma Bahia de um cacau que entrou numa crise nunca mais superada plenamente, ao som da MPB de Caetano Veloso, Gilberto Gil e outros artistas nordestinos.

“Vi muita pobreza em viagens à Bahia para pesquisa. É tudo muito simples. As fazendas não têm varandas largas, as madeiras são desgastadas e usam muita cal para pintar as paredes. Não tem nem muita variação de cor”, diz o cenógrafo Fábio Rangel.

Ele está entre os membros da equipe do remake de “Pantanal” que foram escalados para trabalhar em “Renascer”, sob o comando de Gustavo Fernandez, que assume a tarefa de produzir uma versão à profundidade da obra original, a primeira romance da Orbe filmada majoritariamente fora dos estúdios, diz Mauro Alencar, doutor em teledramaturgia pela Universidade de São Paulo.

Sob a direção de Luiz Fernando Roble, “Renascer” abandonou o pingue-pongue maçudo de closes durante os diálogos, com atores que deixaram de ser enquadrados da cintura para cima e ganharam pés, para se aproximarem e se afastarem da câmera.

A filmagem, por sua vez, passou a percorrer cenários que, pela primeira vez, tinham teto, com uma iluminação que buscava a sutileza da meia-luz, das frestas de janelas e portas e das neblinas.

“Quando divulgaram que eu seria o diretor, me impressionou a quantidade de gente que me pediu para trabalhar no remake. É uma responsabilidade refazer a romance da vida de tanta gente”, afirma Fernandez, na ilhéu de edição.

O diretor diz não temer o público de hoje, mais sensível e com mais voz para reclamar da abordagem de temas delicados. “Precisamos ter muito mais atenção e pudor, mas a gente tem uma dramaturgia consistente e muito reverência. Por ser um remake, o testemunha já tem uma compreensão.”

Benedito Ruy Barbosa, vale lembrar, escrevia com os olhos muito abertos para o “Brasil profundo” —porquê se convencionou invocar o retrato que ele fazia do país—, sobretudo para a estrutura fundiária pátrio, uma discussão elevada à máxima potência em “O Rei do Manada”, que tratava da reforma agrária e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terreno, o MST, o que dividia opiniões.

Na prensa, circulavam críticas de que o responsável, hoje com 92 anos e jubilado, fazia “jogral político” em “Renascer”, por cenas porquê a que Tião Penosa dizia que era seu recta usar a terreno para fomentar sua família ou a que os personagens reclamavam da violência contra crianças depois do massacre da Candelária, no Rio de Janeiro, que aconteceu com a romance no ar.

Porquê o avô, Luperi vê a romance porquê “instrumento de transformação social”, mas não quer gerar conflitos. “O Brasil e o mundo passam por um momento frágil. A romance não tem a menor pretensão de rivalizar e gerar combates, mas de desarmar as intensidades e as brutalidades”, diz.

Folha

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