Como Sergio Rodrigues mobiliou palácios de Brasília – 16/01/2024 – Ilustrada

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Em abril de 1962, as expectativas estavam altas para a inauguração do auditório da Universidade de Brasília. As 250 poltronas da sala —projetadas por Sergio Rodrigues, um designer de móveis com poucos anos de curso à quadra, mas já muito bem-sucedido— foram produzidas e instaladas em tempo recorde, num contexto de euforia com a construção da novidade capital do país.

No evento da inauguração do Auditório Dois Candangos, porém, houve um imprevisto. Segundo um relato histórico do próprio Rodrigues, uma das poltronas não ficou pronta no prazo. Para que nenhum dos convidados notasse o buraco na plateia, ele mesmo ficou em pé no lugar do assento.

A anedota ilustra a relação do pai da poltrona Tenro com Brasília, tema do livro “Sergio Rodrigues em Brasília 1956 – 1981”. O volume recém-lançado reúne nove textos de diversos autores e dezenas de fotos históricas pouco vistas sobre o papel de um dos maiores nomes do traste moderno brasílio em definir os interiores de prédios emblemáticos da capital.

Além das poltronas do auditório da universidade, o carioca, considerado um pioneiro do design vernáculo, projetou o mobiliário do refeitório e dos alojamentos dos professores e dos estudantes. Para edifícios-sede do poder, Rodrigues desenvolveu a ambientação e os móveis —mesas, cadeiras, bancos, poltronas e sofás— para o Palácio do Itamaraty, além de ter criado uma cadeira, a Beto, mormente para o Palácio do Planalto.

“Foi a partir de Brasília que Rodrigues constituiu a sua curso. Ele esteve em contato com pessoas que proporcionaram um salto qualitativo na sua profissionalização”, afirma Marcelo Mari, o organizador livro, acrescentando que até agora não havia pesquisas sobre a trajetória do designer em Brasília.

Mari conta que as encomendas que Rodrigues recebeu de Oscar Niemeyer, o arquiteto de Brasília, de Darcy Ribeiro, portanto reitor da universidade lugar, e de outras pessoas ligadas ao governo federalista foram determinantes para que o designer passasse da produção artesanal de móveis para a fabricação em larga graduação.

Ele foi chamado para mobiliar os palácios pouco depois de inaugurar a sua loja, Oca, no Rio de Janeiro, em 1955, momento em que desenvolvia a linguagem particularidade de seus móveis. É desta quadra, por exemplo, a geração da poltrona Oscar, secção da mobília do Palácio da Alvorada que se tornou um clássico do traste brasílio com seu imagem ligeiro de braços curvos e assento de palhinha.

A boa recepção das peças do designer em Brasília e a qualidade de seu imagem, que ganhava reconhecimento internacional com a poltrona Sheriff, uma variação da poltrona Tenro premiada na Itália, garantiram a Rodrigues o invitação para mobiliar a embaixada do Brasil em Roma.

Um dos textos do livro aborda as negociações de anos para que os ambientes do Palácio Pamphilij recebessem os móveis do modernista, e outro, de Roseli Sartori, responsável pelo patrimônio histórico e artístico da embaixada, trata da preservação e do restauro deste mobiliário, em uso há 60 anos. Há fotos de registro e atuais mostrando, por exemplo, a troca do estofado original branco pelo preto em sofás e poltronas do gabinete do mensageiro.

Rodrigues nasceu em 1927 e começou sua curso uma vez que arquiteto, mas se firmou mesmo uma vez que designer de móveis. Ele se preocupava com os encaixes de madeira das peças que criava, e ficou publicado por usar pele e palhinha nas suas poltronas, que vendia na loja Oca, um ponto de encontro de intelectuais e gente das artes no Rio de Janeiro da metade do século 20. O designer morreu devido às complicações de um cancro em 2014, aos 86 anos.

Junto com Joaquim Tenreiro, Bernardo Figueiredo e outros designers do período, Rodrigues desenvolveu a estética do mobiliário que deveria dialogar com a arquitetura majestosa proposta por Niemeyer para Brasília. Não se tratava somente de produzir mesas e cadeiras para gabinetes de governo, mas de imbuir as peças de uma identidade brasileira, assim uma vez que a novidade capital vendia a imagem de um Brasil novo e moderno.

Para o organizador do livro, foi a arquitetura, mais do que a arte, que se impôs uma vez que um símbolo da modernização do Brasil, porque edifícios têm impacto público maior do que obras de arte, restritas a um grupo menor de pessoas. Brasília seria o exemplo supremo disso.

Foi neste contexto que Rodrigues e a sua geração construíram o traste brasílio. Segundo Mari, “eles tinham esse sentimento de que o Brasil podia produzir coisas inovadoras e dar imposto à cultura internacional”.

Folha

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