“Bom ‘dchia'”, cumprimenta David Parsons na entrevista à Folha por videochamada, avisando que seu português vai melhorar quando chegar por cá e que sabe muito muito a diferença entre a língua falada no Brasil e o espanhol, que domina.
O coreógrafo e diretor da Parsons Dance, de Novidade York, chega ao país esta semana, iniciando sua temporada em São Paulo nesta quarta, 14, no Teatro Bradesco.
São 16 anos desde sua última turnê (“eu teria voltado antes, não fosse pandemia”) e o coreógrafo, que já morou no Rio, pirou com a Bahia e outras paragens nacionais, tem uma nostalgia talvez meio romantizada do país tropical —visto “por olhos de um gringo”, assume.
“Há muita cor no Brasil. Um siso de comunidade, a celebração da fisicalidade. Posso quase sentir o cheiro do Brasil neste momento”, diz o coreógrafo, lembrando-se de quando a coreógrafa Deborah Colker foi ao hotel onde ele estava hospedado no Rio para lhe pedir conselhos ou do encontro com David Byrne, do Talking Heads, na piscina de um hotel em Salvador.
A excitação do coreógrafo pode estar em lembranças talvez ingênuas e glamurizadas, mas combina com o espírito pós-olimpíadas e a glorificação de Rebeca Andrade e outras brasileiras que abalaram Paris.
A dança de Parsons, aliás, se encaixa muito no clima olímpico do momento. Suas coreografias são conhecidas pelas performances atléticas, tecnicamente impecáveis, que empolgam as grandes plateias. A popularidade da companhia, fundada em 1985, também faz com que críticos torçam o nariz para espetáculos considerados mero entretenimento.
“As pessoas sempre pensam na [companhia] Parsons uma vez que unicamente diversão, mas não é verdade”, afirma. Porquê exemplo, cita uma de suas criações, “Ring Around the Rose”, do qual tema é a peste negra na Europa — um tema zero risonho. Mas as críticas à popularidade não o incomodam.
“Para sobreviver na arte, você precisa entreter, ou não consegue remunerar os profissionais. Tornei-me um ‘entertainer’ na visão dos críticos mais por uma questão prática: manter uma companhia de dança viva e se apresentando ao volta do mundo”, diz o fundador da quase quarentona Parsons Dance, formada por nove bailarinos. “Sempre mantive uma companhia pequena porque quero ser o director, estar em contato direto com os jovens bailarinos.”
A popularidade será testada —e provavelmente comprovada— nesta turnê, com seis coreografias de sucesso, todas curtas —a maior dura 19 minutos, a menor, 5. Algumas já foram apresentadas no Brasil. Parsons foi uma das estrelas do Carlton Dance, festival que, no final da dezena de 1980 e início dos anos 1990, trouxe pela primeira vez ao Brasil um conjunto venerável de nomes da dança moderna e contemporânea internacional.
Entre as coreografias inéditas por cá, “The Shape of Us”, que estreou oriente ano em Novidade York, é, segundo o coreógrafo, uma resposta de otimismo a um mundo “mergulhado em uma nuvem de negatividade durante a pandemia”.
Parsons conta ser um pouco quase singelo: um parelha de bailarinos que inicialmente se olha com suspeição, mas decide expor, com o corpo, lógico: “Calma lá. Estamos apaixonados. Vivemos em um mundo lindo. Acordem, por obséquio. Simples assim.”
Outra estreia de 2024 que está na turnê brasileira é “Juke”, uma geração de Jamar Roberts, que foi coreógrafo residente da Alvin Ailey American Dance Theater de 2019 a 2022. Usando a música “Spanhish Key”, de Miles Davis, Roberts criou um jazz bastante atlético com figurinos brilhosos que remetem aos anos 1970.
Inédita no Brasil, “Balance of Power”, de 2020, é um solo de 5 minutos e subida performance: a cortinado se abre com o solista de ponta-cabeça em uma postura invertida da ioga, ou a paragem de mão da ginástica artística, e segue numa sequência ininterrupta de movimentos vigorosos —alguns remetem ao samba e a capoeira, atestando o magia de Parsons pelo “Brasil brasiliano”.
O programa também conta com best-sellers que já passaram por cá: “Wolfang”, de 2005, um balé com música do superstar clássico Wolfang Amadeus Mozart. E o inescapável “Caught”, de 1982, uma mistura de dança, acrobacia e luz estroboscópica que faz a solista voar no palco.
A iluminação foi criada por Howell Binkley, vencedor do Tony pelo design de luz do músico “Hamilton”, entre outros. “Não podemos fazer uma temporada da Parsons sem trazer ‘Caught’, se não o público reclama”, diz o coreógrafo.
Mas a moça dos olhos de Parson nessa turnê —e na vida— é “Promanação”, de 1990. A sua história de paixão pelo Brasil passa pela invenção de Milton Promanação. O coreógrafo não unicamente se tornou colega do músico brasiliano, uma vez que ganhou dele uma trilha inédita para coreografar. “Isso mudou minha vida.”
Nesta turnê, serão exibidos quatro filmes curtos sobre o artista brasiliano, que anunciou seu retiro dos palcos no final de 2022. “Você pode descobrir que todo mundo sabe quem é Milton Promanação, mas isso não é verdade. Teremos muitos jovens na plateia e com os filmes eles poderão saber o Milton”, acredita Parsons, que diz manter contato com o músico e seu fruto, Augusto, e espera conseguir “dar um amplexo no Bituca”.