A Compañia Tryo Teatro Margem, de Santiago do Chile, vai se apresentar no Meio Cultural Banco do Brasil (CCBB) Rio de Janeiro, em temporada inédita e única no Brasil. Com estreia nesta quarta-feira (11), as apresentações serão de quarta a sábado às 19h e domingo às 18h, no Teatro 3 do CCBB, no meio do Rio.
Será apresentada a trilogia latino-americana Três histórias que mudaram a história, composta por: Pedro de Valdívia: la gesta inconclusa, que poderá ser vista de 11 a 22 de junho; Magalhães a 500 años de la primera vuelta al mundo, de 25 a 29 de junho; e Fico, de 02 a 06 de julho.
Para o grupo, a temporada é uma oportunidade de mostrar ao público brasílio a forma que a Tryo Teatro Margem desenvolveu para fazer e produzir suas obras:
“Não é um espetáculo realista naturalista, no sentido da intensidade dramática. São espetáculos que flertam com a comicidade, com a farsa, com a contação de história, têm narrativa e diálogo o tempo todo. As músicas também são representantes disso. Porquê não tem cenário, tem essa base do corpo vivo em cena ao que está sendo narrado. [Os atores] Fazem com instrumentos e com o corpo, alusões ao que está sendo narrado”, explicou à Filial Brasil, o premiado ator, diretor e produtor Julio Adrião, que assina a curadoria e a coordenação-geral da temporada.
A música composta para cada espetáculo e executada ao vivo pelos atores é o fio condutor das narrativas nos trabalhos do grupo chileno, que tem porquê foco pesquisas sobre momentos e personagens da história latino-americana, apresentados de forma sátira.
“Eles trabalham muito com temas e personagens histórico, em uma estrutura que tem estética de narrativa, em que a música é composta principalmente para os espetáculos, por eles mesmos, e a dramaturgia, desenvolvida em sala de trabalho. Muito se assemelhava ao meu processo de trabalho também”, contou o ator, que tem entre suas atuações de sucesso o solilóquio A Invenção das Américas.
“São mais de 20 instrumentos em cena. Desde charango e tambores a coisas menores, porquê guitarra elétrica, contrabaixo, trombones. Tem uma variedade de instrumentos brutal, que a gente não está avezado a ver no palco no Brasil, com essa intensidade e essa qualidade, porque eles tocam mesmo, eles são músicos”, acrescentou Adrião.
Desde a instauração, em 2000, as atividades ininterruptas da companhia já foram vistas em países da América Latina, Europa, Ásia e Estados Unidos. Adrião revelou que a teoria da companhia fazer um espetáculo no formato de ocupação, porquê será agora no CCBB, surgiu em 2012, quando ele e o grupo se conheceram em um Festival Latino Americano em Londres.
“Desde logo, a gente vem conspirando para trabalhar. Eu já fui ao Chile algumas vezes, eles vieram cá em alguns estados, com espetáculos soltos, e eu botei essa rima de a gente fazer uma residência, uma ocupação em um teatro bacana porquê o CCBB, onde a gente pudesse trazer uma mostra com mais trabalhos e oficina”, relatou.
“A gente está muito feliz de receber essa companhia mana, que a gente conhece há tanto tempo. Eles estão super felizes, e o CCBB também está muito entusiasmado com esse processo de, cada vez mais, promover ocupações. Agora mesmo, saiu uma companhia do Maranhão, depois vai ter uma companhia com uma ocupação com repertório. Isso é um formato muito propício para uma cidade porquê o Rio de Janeiro, de receber companhias que pouco vêm ao Rio, que pouco vêm ao Brasil, e podem trazer um repertório maior e ter uma visibilidade mais ampla do seu trabalho”, comentou o curador.
Menestrel
O fundador e diretor da Compañia Tryo Teatro Margem, Francisco Sánchez, diz que um dos destaques do desempenho da companhia é apostar numa estética principal do teatro, em que a figura mediano da narrativa é o ator músico, também chamado de juglar em espanhol e menestrel em português ─ aquele que usa a música autoral executada ao vivo.
“Juglar é uma vocábulo espanhola que fala daquele artista ambulante, que é ator, poeta, bailarino, músico cantante, que faz muita coisa cênica para descrever a história para todo mundo, com uma opinião sátira também”, observou, acrescentando que outro destaque da companhia são os temas históricos da América, do Chile e do Brasil.
“É um propósito que a companhia tem em muitas peças. São 25 peças teatrais e todas abordam diferentes episódios de história: a conquista, o pretérito vetusto indígena, os povos originários, a afrodescendência. Acho que essas duas combinações são constitutivas do nosso trabalho: a figura do menestrel e o tema histórico”, afirmou.
Segundo o ator e músico, que está com grande expectativa para a temporada, a única vez que a companhia veio ao Rio foi em 2022, quando fez uma apresentação da peça Fico, no Paço Imperial, no meio da cidade, e nas instalações do SESC em outras cidades do estado. Porquê agora, naquele ano, Francisco Sánchez se apresentou em português, o que acredita não ser uma barreira.
“Não foi muito difícil, porque eu já tenho uma relação com o Brasil de quase 30 anos. A vontade da gente é que o público não perceba porquê estrangeiro, mas é impossível, né? Logo, [a companhia] já tem uma trajetória de falar em português, e eu paladar muito do português. Estou sempre com vontade de aprender a falar muito”, disse.
Simbolizar a peça Fico, no Paço Imperial, teve um sentimento próprio para o artista. “Foi muito emocionante atuar onde aconteceu a história”, comentou Sánchez, lembrando que aquele lugar ficou notabilizado pelo Dia do Fico, quando, em 9 de janeiro de 1822, o logo príncipe Pedro declarou que não cumpriria as ordens das Cortes portuguesas, que exigiam sua volta a Lisboa.
Amazônia
Francisco Sánchez conheceu o Brasil em 1996, mas, ao contrário de muitos visitantes que entram no país por destinos porquê Rio, São Paulo, ou Salvador, ele chegou ao país pela Amazônia. Entrou pela Bolívia e, primeiro, conheceu o Acre, onde queria ter uma experiência com o Santo Daime e buscar a espiritualidade na floresta.
“Eu tinha conhecimento do Santo Daime já no Chile, e achei que era bom saber na nascente. Foi aí que, aos 24 anos, entrei pela Bolívia no Acre e Amazonas. Aquilo foi muito importante na minha vida até hoje”, revelou. “Saber a floresta amazônica naquele contexto místico mudou a minha vida para o muito. Tenho uma conexão muito místico com o povo brasílio por culpa disso, por esta experiência”.
Oficinas
A programação da temporada inclui ainda a realização de três masterclasses (oficinas), ministradas pelo diretor artístico da companhia, Francisco Sanchez. Quem participar vai escoltar o processo de geração da Tryo Teatro Margem, com a participação dos integrantes. “É uma oportunidade muito boa de a gente ver porquê trabalham e ter essa troca”, completou o curador Julio Adrião.