Pesquisa Datafolha revela que 15% dos brasileiros dizem apostar ou já ter feito apostas esportivas online, as chamadas bets. As apostas online estão disseminadas pelo país, mas o fenômeno é maior entre jovens e homens.
Quase um terço (30%) dos brasileiros de 16 a 24 anos afirma que já apostou. É o duplo da média de 15% para todo país —7% dizem ter apostado, mas não apostam mais, e 8%, que continuam apostando.
Pesquisadores, médicos, educadores e até integrantes de grupos de esteio a viciados em jogos relataram à Folha uma propagação entre jovens e até adolescentes, com recorrência de casos problemáticos. Isso ocorre mesmo com a proibição lítico para menores de 18 anos.
Esta é a primeira reportagem da série Bets no Brasil, que traça um raio-X das apostas online no país.
O gasto médio mensal entre o totalidade de pessoas que apostam é de R$ 263 —equivalente a 20% do salário mínimo de 2023. Três em cada dez apostadores afirmam gastar mais de R$ 100 por mês, mostra o Datafolha.
Essa tem sido uma atividade masculina: 21% relatam ter apostado. Entre as mulheres, esse índice é de 9%.
Metade dos apostadores também diz que perdeu mais verba do que ganhou.
A pesquisa foi realizada em 5 de dezembro de 2023, com 2.004 entrevistas presenciais em 135 municípios, com pessoas de 16 anos ou mais de todas as regiões do país. A margem de erro é de dois pontos percentuais para insignificante ou para cima.
A oferta de sites de apostas esportivas é liberada no Brasil desde 2018, posteriormente lei aprovada no governo Michel Temer (MDB). A partir disso, propagandas de bets passaram a dominar a grade da TV oportunidade, sobretudo em jogos de futebol. As redes sociais foram inundadas de anúncios, viralizados pela atuação de influenciadores famosos.
O governo de Jair Bolsonaro (PL) teve quatro anos para regulamentar o mercado, mas não o fez. Assim, o número de casas de apostas voltadas ao público brasílico explodiu sem regras claras de atuação e fiscalização —em 2023, veio a público investigação de um esquema de combinação de resultados em jogos de futebol, inclusive da Série A, para lucrar indevidamente com apostas.
O governo Lula (PT) passou a trabalhar na regulamentação no ano pretérito. Já foi aprovada novidade lei para definir taxação e funcionamento das empresas, que também deverão se credenciar para atuar no Brasil —atualmente, quem oferece apostas online no país tem sede no exterior.
A regulamentação totalidade deve ser finalizada no primeiro semestre deste ano. A legislação trata dos jogos da chamada quota fixa, em que é publicado quanto se pode lucrar com a aposta (a partir de resultados de jogo de futebol, por exemplo).
Durante a tramitação do projeto de lei das apostas esportivas na Câmara, os deputados incluíram nessa categoria, além das apostas esportivas, também os jogos online, onde entram cassinos e outros jogos de má sorte em envolvente virtual. Estima-se que até 80% da movimentação do setor venha desse tipo de atividade.
Críticos temem que isso facilite a disseminação ainda maior de sites que oferecem games que trabalham sem transparência, com promessas de prêmios exorbitantes ou algoritmos fraudulentos. Já há investigações criminais sobre casos desse tipo —deve permanecer a missão do governo ordenar quais tipos poderão operar.
Foi a partir de um proclamação nas redes sociais que o estudante Fábio [nome fictício], 17, chegou a um site de apostas. Morador da zona rústico do Região Federalista, ele não teve dificuldade para se cadastrar, mesmo sendo menor de idade.
“Vi um link no Instagram e fui redirecionado para o site. Lá eu tive que produzir uma conta, coloquei email, senha e falei que tinha 18 anos. Só marquei numa caixinha”, disse o estudante.
O site gerou uma chave Pix e ele fez as transferências. Primeiro foram R$ 20, que ele perdeu. Depois mais R$ 20, que também se foram rapidamente.
Fábio diz que muitos amigos apostam. “Eu joguei por curiosidade. Vi a propaganda, o pessoal comentando, e falei: ‘Por que não tentar?'”, disse. “Porquê não tinha ganhado verba, resolvi não permanecer gastando mais”.
O professor Mateus Castello Branco leciona há cinco anos no Elefante Branco, maior escola pública de ensino médio de Brasília. Ele diz ter percebido uma febre entre os alunos.
“Há grupos, principalmente de meninos, envolvidos quase que de forma compulsiva com os aplicativos de apostas esportivas ou jogos que prometem ganhos rápidos”, diz. “Acreditam que realmente ficarão ricos, resistindo às vezes a largar o celular para prestar atenção à lição.”
A Folha questionou as secretarias de Instrução de todos os estados, que concentram as matrículas de ensino médio. Nenhuma disse ter tido relatos de problemas graves com apostas entre alunos, assim porquê não há ações específicas relacionadas ao tema.
O médico Daniel Spritzer, pesquisador da UFRGS (Universidade Federalista do Rio Grande do Sul), diz que há uma convergência grande entre as indústrias de games e de apostas. Ele é coordenador do Grupo de Estudos sobre Adições Tecnológicas, no Rio Grande do Sul.
“Isso vai realmente aproximando crianças e jovens de jogos de má sorte, que são proibidos para menores de idade, e faz com que cada vez mais se torne um pouco naturalizado”, diz. “E quanto maior o chegada, cresce o uso e aumenta o uso problemático”.
De conformidade com Spritzer, a literatura científica mostra que a prevalência de vício em jogos entre adolescentes é entre 2% a 4%, o duplo do que se vê entre os mais velhos. “Jovens são mais vulneráveis porque, nessa temporada do desenvolvimento, há maior dificuldade de se pensar nas consequências de longo prazo quando um dos aspectos envolvidos é mais prazeroso”.
O Programa Ambulatorial do Jogo Patológico do Instituto de Psiquiatria da USP tem recebido um público cada vez mais jovem em procura de tratamento.
“A gente ainda não tabulou, mas a sensação é que a modelo fica mais masculina, surge agora a predominância da aposta online, sobretudo por meio do celular, com uma paridade em termos de prevalência entre apostas esportivas e os cassinos online”, diz o médico e professor da USP Hermano Tavares.
Integrantes do grupo de esteio Jogadores Anônimos de São Paulo também relatam maior procura de jovens. Alguns vão com os pais, uma vez que menores de idade não são aceitos.
Há uma lentidão para as pessoas entenderem que sofrem de uma compulsão, diz um dos integrantes do grupo, que ao longo de 11 anos de vício diz ter perdido R$ 1 milhão em diversos jogos de má sorte. Mas, olhando para trás, afirma, o primórdio de tudo foi na juventude, aos 14 anos.
Outro apostador que compartilha esteio no Jogadores Anônimos conta que também começou na juventude a compulsão que, na vida adulta, fez com que perdesse tempo e R$ 700 milénio. Ele começou com 15 anos, com baralho e caça-níquel, mas fez muitas apostas recentes de forma online. Diz se assustar com a onipresença da publicidade das bets.
No Brasil, os jogos de má sorte e os cassinos físicos são proibidos desde 1946. A lei atual permite, no entanto, os jogos em plataforma online.
Apesar de o tema progredir para uma legalização plena, a pesquisa Datafolha mostra que 55% da população se diz contra. A maior repudiação é entre as mulheres (61%), que também jogam menos.
A novidade legislação já traz itens relacionados a jogo responsável, preocupação com publicidade a menores e destinação de verba para o SUS (Sistema Único de Saúde) para medidas relacionadas a danos sociais gerados pelos jogos.
“A questão do vício em jogo é prioridade para o governo. Estamos desde o segundo semestre do ano pretérito trabalhando com o Ministério da Saúde”, diz José Francisco Cimino Manssur, assessor privativo do Ministério da Herdade. “Vamos estabelecer um grupo de trabalho com a Saúde para não só produzir sistemas em conjunto mas também editar uma portaria que vai ser mais específica no zelo com as pessoas que tiverem transtorno com aposta”.
Questionado, o Ministério da Saúde diz ser prioridade a expansão e qualificação dos serviços de saúde mental.
Para Hermano Tavares, da USP, são necessárias campanhas de conscientização e regulações específicas, porquê a trava a características estruturais dos sites que podem proporcionar o descontrole —porquê resultados que “batem na trave” e reforçam a ilusão de controle sobre resultados aleatórios.
“Tem várias medidas que podem e devem ser tomadas sob pena de ter uma novidade epidemia de um transtorno psiquiátrico”, diz Tavares.
A Folha procurou associações que representam as casas de aposta.
O presidente do Instituto Brasílico de Jogo Responsável, Andre Gelfi, afirmou confiar que, com regulação da atividade, o contexto competitivo deve mudar.
“As operadoras terão regras a satisfazer, o que deve coibir as dinâmicas comerciais atuais, onde infelizmente são recorrentes os casos sem qualquer controle. Com a regulação, a publicidade seguirá regras do Conar [Conselho Nacional Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária] e o próprio setor deve ajudar as autoridades a inspeccionar os malfeitos.”