Dia Dos Pais: Tecnologias Podem Aproximar Ou Afastar Os Filhos

Dia dos Pais: tecnologias podem aproximar ou afastar os filhos

Brasil

“Quando eu chegar da faculdade, eu ligo”. Nenhuma mensagem que chega ao telefone é trivial para o pipoqueiro Gil Lopes, de 58 anos, pai de seis filhos. “Tudo o que vem deles é importante”. O potiguar, radicado em Brasília, mantém no ouvido o fone em que ouve as mensagens de áudio e as novidades simples do dia a dia, uma forma de mourejar com as saudades, desde que os rapazes e as moças começaram a trespassar de moradia para mudar de cidade e matrimoniar. Ele recebe mais mensagens do que ligações, mas não se incomoda. “A vida deles é corrida”, lamenta.

Brasília, (DF) , 08/08/2024 - Personagem - Gil Lopes (Pipoqueiro). Foto Valter Campanato/Agência Brasil.
Brasília, (DF) , 08/08/2024 - Personagem - Gil Lopes (Pipoqueiro). Foto Valter Campanato/Agência Brasil.

Brasília, (DF) , 08/08/2024 – Enquanto vende pipoca, Gil Lopes usa os fones para ouvir mensagens dos filhos – Valter Campanato/Dependência Brasil

Diante do carrinho da pipoca, ele diz que a tecnologia do celular é o que garante a tranquilidade para trabalhar. Ele só tira o fone de ouvido para atender os clientes. O pipoqueiro, que mora na região administrativa de São Sebastião (DF), recorda que já foi mais preocupado com o que a tecnologia poderia fomentar. De indumentária, a tecnologia mexe também com a paternidade ativa.

De concordância com pesquisadores ouvidos pela Dependência Brasil, as evoluções tecnológicas do celular e internet alteraram, de variadas formas, as relações familiares, incluindo de pai e filhos. Um desses caminhos é positivo, já que a tecnologia ajudou a propiciar proximidades, conforme avalia o neurologista pediátrico Eduardo Jorge Custódio da Silva, membro do Grupo de Trabalho Saúde Do dedo da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). 

“O pai pode estar viajando e é verosímil vê-lo por um vídeo. A tecnologia pode ser fundamental. A gente tem um site chamado Esse Mundo Do dedo, que é para conscientizar sobre o uso da internet de forma moral, saudável, segura e educativa”, afirma.

Tempo de presença

Segundo a pesquisadora Sandra Rúbia da Silva, professora da pós-graduação em informação na Universidade Federalista de Santa Maria (UFSM), os pais precisam encontrar tempo para participar das atividades com os filhos, seja online ou fora das telas.

“Na minha pesquisa, a gente conseguiu observar que os pais veem que o uso do celular está atrelado à preocupação com a segurança dos filhos”. Mas, os filhos veem, segundo a pesquisadora, a utilização da tecnologia uma vez que uma oportunidade de utilização das redes sociais, que colocaram as relações familiares em “um novo patamar, de diversas formas, tanto troca de saberes, quanto principalmente essas trocas de afeto”, afirma a professora. Ela  investiga, com uma abordagem antropológica, as práticas relacionadas ao consumo de telefones celulares em periferias urbanas.

“Veja quantas mensagens de Dia dos Pais vão estar nas redes sociais agora neste domingo”. Inclusive, que acarretam o fenômeno de que pais que não são homenageados com postagens podem trespassar magoados. “Imaginemos, por exemplo, um pai e um rebento que se afastaram. A tecnologia pode facilitar, por exemplo, uma aproximação. Pode, enfim, resgatar ou distanciar.

“A tecnologia, em si, não faz zero. Alongar ou se aproximar tem a ver com os comportamentos humanos”. 

Excesso de telas

Para a professora Sandra Rúbia da Silva, da UFSM, é necessário que os pais estejam atentos para que, quando presentes fisicamente, não estejam “ausentes” e exclusivamente ligados às redes sociais. Da mesma forma, os filhos devem ser chamados ao mundo longe das telas, segundo explica o neurologista pediátrico Eduardo Jorge Custódio da Silva, da SBP. 

Ele exemplifica que se tornou generalidade a cena de pais e crianças (e até bebês) com dispositivos móveis na mesma mesa. E nenhuma vocábulo entre eles.

“Essa é uma imagem assustadora. A internet e as telas podem ser capazes de aproximar os distantes. E, em ressarcimento, distanciar quem está próximo”.

O neurologista faz segmento do grupo que elaborou um documento científico da entidade intitulado “Menos Telas e Mais Saúde”, no período da pandemia, e que deve ter uma novidade versão no ano que vem.

“É muito importante que a moçoilo, no seu desenvolvimento, utilize o toque: veja, ouça, sinta o paladar, prove o cheiro, abrace, caia no solo e viva uma vez que moçoilo”. 

Contato e riscos

O médico explica que o contato físico e o diálogo são fundamentais. “Historicamente, os pais sempre foram um pouco mais afastados na relação com os filhos. Mas isso mudou. Estar com a moçoilo é muito importante. E a tela não pode ser a única forma de mediação de nenhum contato”. 

Essa exiguidade pode gerar riscos emocionais na construção da personalidade.

“É importante trespassar com as crianças e deixar o celular para trás. Colocar o telefone dentro de uma caixa por pelo menos por uma hora. É preciso fabricar momentos de ‘detox’”.

Isso inclui, segundo o neurologista da SBP, por exemplo, narrar para o rebento uma vez que foi o dia e abraçar sempre que verosímil. 

O neurologista alerta para a urgência das famílias estarem atentas à possibilidade de sujeição do dedo dos filhos. “Isso já é uma doença. A poder paterna e materna é importante desde o início do processo. A gente tem que ter poder e as crianças e os adolescentes querem poder”, aponta. E essa poder deve ser exercida, segundo os especialistas ouvidos, com o diálogo. “A sujeição do dedo caracteriza-se por prejuízos na vida social, escolar ou emocional. É preciso  um esteio psicológico, mas também familiar”.

Aproximação

A psicóloga e professora Leila Cury Tardivo, da Universidade de São Paulo (USP), também reitera que os pais devem utilizar a tecnologia para se aproximar. Uma vez que coordenadora de  um projeto de atendimento social em São Paulo, o Concordar, a pesquisadora, desde a pandemia, constatou a urgência das crianças e adolescentes se sentirem mais acolhidos. “Os pais não são obrigados a resolver tudo. Mas a aproximação e o diálogo ajudam muito”. Na paternidade ativa, por exemplo, ela defende que sejam respeitadas as dores, dúvidas e inseguranças próprias das faixas etárias. 

A professora destaca que a sociedade vive um contexto de diferentes constituições familiares, e a participação da paternidade ativa é o esperado para encarar os desafios.

“O pai pode ser muito importante na vida do rebento. Não tem mais um lugar definido, mas precisa compartilhar responsabilidades”.  

É isso o que diz crer também o lavrador e servidor público reformado Américo Oliveira, de 63 anos, também pai de seis filhos. Morador de extensão rústico na região administrativa do Gama (DF), esperava o ônibus para ir para moradia e ficava atilado ao celular para esperar qualquer “oi” dos filhos. 

Brasília, (DF) , 08/08/2024 - Personagem - Americo Oliveira ( Aposentado). Foto Valter Campanato/Agência Brasil.
Brasília, (DF) , 08/08/2024 - Personagem - Americo Oliveira ( Aposentado). Foto Valter Campanato/Agência Brasil.

Brasília, (DF) , 08/08/2024 – Americo Oliveira tenta fazer com que rebento brinque com pés na terreno – Valter Campanato/Dependência Brasil

Os mais velhos partiram para áreas urbanas e hoje tem em moradia a esposa e o caçula de 11 anos. Ele tenta fazer com que o menino brinque de pés no solo na terreno e de globo. “Lógico que ele pede o celular para joguinhos. Mas fico feliz que ele usa também para me mandar mensagens. É uma luta diária, mas paladar de sentar ao lado dele para conversar sobre o que ele viu na tela”, sorri o pai.  

Fonte EBC

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