Músicas interpretadas por Xênia França, Jota.Pê, Chico Chico e Tim Bernardes sobressaem no álbum produzido a partir de letras e registros inacabados encontrados no baú do artista, morto há dois anos. Revestimento do álbum ‘Erasmo Esteves’, de Erasmo Carlos
Divulgação
Resenha de álbum
Título: Erasmo Esteves
Artistas: Erasmo Carlos com Chico Chico, Emicida, Gaby Amarantos, Jota.Pê, Marina Sena, Rubel, Russo Passapusso, Paulo Miklos, Sebastião Reis, Teago Oliveira, Tim Bernardes e Xênia França
Edição: Som Livre
Cotação: ★ ★ ★
♪ É justo que se tenha certa condescendência ao calcular o primeiro álbum póstumo de Erasmo Carlos (5 de junho de 1941 – 22 de novembro de 2022) produzido em estúdio a partir de bilhetes, rascunhos de letras e registros inacabados de músicas encontrados no baú do artista carioca, um dos pilares do rock brasílico.
Álbum posto em rotação pela gravadora Som Livre na sexta-feira, 4 de maio, Erasmo Esteves não é o disco que o cantor chegou a arquitetar com o diretor artístico Marcus Preto para se conectar com a jovem guarda da música brasileira do século XXI. Trata-se do álbum que pôde ser feito sem a privação física de Erasmo.
Orquestrado por Preto com Léo Esteves (fruto de Erasmo e herdeiro do baú do Tremendão) e com o produtor músico Pupillo Oliveira, o disco Erasmo Esteves oscila entre esboços – expostos nas quatro vinhetas que reproduzem áudios de Erasmo extraídos de fitas cassetes – e canções realmente acabadas, três pelo artista e as outras sete finalizadas postumamente.
Das 10 canções ouvidas entre as quatro vinhetas, a mais inspirada está no fecho do álbum Erasmo Esteves. Trata-se de Nossos corações, balada amorosa composta por Erasmo com Roberta Campos e cantada (lindamente) por Xênia França com emendo moderno que realmente aponta para o porvir.
Outro destaque é Minha formosa primavera, cantiga composta e cantada por Tim Bernardes a partir de esboço de Erasmo (registro granjeiro perpetuado no disco com a voz do Tremendão na faixa-vinheta intitulada Minha formosa). Tim aciona os falsetes para dar voz aos apaixonados versos de letra sobre paixão onírico.
A propósito, o paixão por uma mulher é o mote do disco (e, em claro sentido, o motor de toda a obra de Erasmo) – sobretudo o paixão do artista por Sandra Sayonara Esteves (1946 – 1995), a Narinha, inspiração de missiva escrita por Erasmo e musicada por Roberta Campos para gerar a balada Assim te vejo em sossego, valorizada pelo esquina aveludado de Jota.Pê e pelo emendo de cordas. E, cá, cabe ressaltar as duas valiosas contribuições de Roberta Campos para distanciar o álbum Erasmo Esteves da irregularidade.
Um bilhete escrito por Erasmo para a mesma musa Narinha foi o ponto de partida para Nando Reis gerar a cantiga Que assim seja (Também distante), gravada pelo fruto do artista, Sebastião Reis. O emendo da filete tenta gerar atmosfera grandiosa.
Além de Nando Reis, dois outros integrantes da formação clássica da orquestra Titãs, Arnaldo Antunes e Paulo Miklos, também figuram no disco, ampliando as respectivas parcerias com Erasmo. Miklos partiu de esboço de Erasmo para criar a balada-blues Na memória dos caras tortas, cantada com precisa intensidade por Chico Chico em gravação introduzida e encerrada por assovios e piano do próprio Miklos.
Já Arnaldo finalizou Dane-se (dance), rock de espírito tropicalista cantado por Russo Passapusso com suingue em filete que tenta repetir o balanço do cancioneiro de Erasmo pós-Jovem Guarda.
Já Erasmo Esteves (Tijuca maluca) é filete que tenta emular o típico samba-rock formado por Erasmo a partir de 1970. Quem canta é o responsável da música, Rubel, que compôs Erasmo Esteves a partir de Tijuca maluca, texto autobiográfico escrito por Erasmo com nostalgia da juventude vivida em romantizada Tijuca, bairro da zona setentrião carioca que serviu de ponto de encontro para ícones da MPB porquê Jorge Ben Jor, Roberto Carlos e Tim Maia (1942 – 1998). A filete tem mediação do rap de Emicida.
Esquisitices, filete que junta a voz (opaca) de Erasmo com Marina Sena, passa suplantado e nem consegue fazer jus ao titulo. Frágil é rock formado e cantado por Teago Oliveira a partir de poema de Erasmo.
Completam o disco as vinhetas Foi-se, Ouça tudo e Jaz, malandro – insignificantes do ponto de vista músico, mas importantes por amplificar a voz de Erasmo dentro do disco – e a já conhecida filete A moçoila da felicidade (2023), música que Erasmo fez para abortado álbum de Wanderléa e que chegou a gravar em áudio acoplado à voz de Gaby Amarantos em fonograma escolhido para ser o primeiro single do álbum.
Enfim, entre esboços e músicas de maior ou menor inspiração (com destaque para Nossos corações, Assim te vejo em sossego, Na memória dos caras tortas e Minha formosa primavera), o álbum Erasmo Esteves está no mundo e merece ser ouvido com boa vontade para honrar a memória e a gentileza do gigante Erasmo Carlos.
Fonte G1
