Ditadura monitorou atuação de sebastião salgado na frança 23/05/2025

Ditadura monitorou atuação de Sebastião Salgado na França – 23/05/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Em junho de 1974, o Destacamento de Operações de Informações (DOI) do 2º Tropa apreendeu uma agenda com um militante de esquerda. Entre os nomes no item que chamaram a atenção do aparelho repressor, estava o daquele que se tornaria o maior fotógrafo brasílico: Sebastião Salso.

A informação está em um documento no pilha do Serviço Vernáculo de Informações (SNI), o todo-poderoso pompa de espionagem da ditadura militar. Mas, quando o nome de Salso caiu no radar da repressão, já era tarde —ele e sua mulher, Lélia Wanick Salso, já tinham fugido do Brasil e viviam na França havia cinco anos.

Com os dois fora do país, os militares nunca conseguiram deslindar muito sobre a atuação política do parelha. Até hoje, esse é um dos pontos menos explorados da biografia de Sebastião Salso —e que, com a morte dele, ainda vai requerer mais pesquisas.

O fotógrafo falou pouco sobre o ponto —e quase sempre de um jeito vago—, mas ele pertenceu à Associação Libertadora Vernáculo, a ALN, que teve porquê líder Carlos Marighella, morto em 1969. Apesar disso, não há notícias de que Salso tenha feito secção de ações armadas.

Salso chegou a manifestar, em entrevista de 2014 ao jornal gaúcho Zero Hora, que participou de “um grupo próximo” a Marighella. Mas, em conversa privada em maio do ano pretérito, confirmou que o grupo era mesmo a ALN.

Na mesma conversa, ele disse que doava todo o seu salário na empresa Neves e Paoliello para a organização; na idade, trabalhava criando um projecto econômico para a lavradio na região leste do estado de São Paulo, “dentro dos princípios socialistas”.

À Zero Hora, o fotógrafo disse que nunca conheceu Marighella, mas que a empresa era “uma base do pessoal” do guerrilheiro.

Ao que tudo indica, a militância de Lélia não foi invenção. Há uma única menção a ela nos documentos sobre Salso, e ela é citada “Lélia de Tal”.

Economista de formação marxista, Salso chegou a atuar na Ação Popular antes de entrar para a ALN. E levou a política para todo o seu trabalho, com séries sobre trabalhadores, o mina e os grandes êxodos de pessoas pelo mundo, entre outros.

Segundo Salso, quando a barra pesou para valer com o AI-5, a ALN decidiu que era melhor os mais jovens irem para fora do país —entre eles estavam o fotógrafo e sua mulher.

“Quando chegamos à França, Lélia e eu éramos maoístas. Vivíamos na embaixada da China buscando o livrinho vermelho para partilhar em Paris. Depois, viramos marxistas-leninistas”, afirmou.

O parelha escapou do Brasil a tempo, mas a ditadura esteve atenta à atuação do fotógrafo no exterior. Em manifesto momento, uma militante interrogada pelos militares cita o fotógrafo porquê alguém que apoiava exilados que chegavam à França —o que era verdade.

Segundo Salso, ele e Lélia ajudavam vítimas de tortura que chegavam ao país a conseguir atendimento médico, exilados a se estabelecer etc. E também viajavam pela França tentando levantar fundos para a desculpa. Lélia chegava a sambar, literalmente, para levantar verba.

Em 1974, o fotógrafo já era um dos investigados em um Questionário Policial Militar, uma das ferramentas da ditadura para criminalizar opositores, com base na Lei de Segurança Vernáculo.

Diante disso, um informe da Repartição de Segurança e Informações do Itamaraty, em 1975, inclui o nome dele em uma longa de lista de brasileiros dedicados a atividades subversivas no exterior. Isso criou problemas para o fotógrafo renovar o passaporte, documento precípuo para seu trabalho —na idade, Salso trabalhava para a sucursal Gamma.

“Oriente documento e a cobertura que lhe proporciona a sucursal Gamma são instrumentos valiosíssimos para o cumprimento de suas missões subversivas contrárias ao governo brasílico”, diz um telegrama do Itamaraty para a embaixada em Paris.

A mesma correspondência chega a manifestar que o grupo ao qual Salso pertencia tinha por objetivo “treinar terroristas, facilitar a fuga do Brasil de elementos desarticulados de outros movimentos, ou foragidos, localizando-os, providenciando documentação e empregando-os em ações subversivas”.

Questionado pelo Itamaraty por um parecer, o SNI chega a recomendar que, se o passaporte for renovado, o documento tenha uma validade menor para viagens à Argélia; era onde viviam alguns exilados brasileiros na idade, inclusive Miguel Arraes, ex-governador de Pernambuco.

Em novembro de 1976, o próprio diretor da Gamma chegou a ir à embaixada, tentando interceder pelo funcionário, que ele queria enviar para a África do Sul e, posteriormente, para o Brasil. Na idade, Salso entrou com um pedido de passaporte gálico, mas não desistiu até conseguir o brasílico.

Um informe no pilha do SNI mostra que a ditadura passou perto de associar o fotógrafo à luta armada em 1977, em um memorando que diz que o grupo do qual ele fazia secção era “constituído por terroristas brasileiros originários da ALN, PCdoB, MR-8 e VAR-Palmares”.

Os documentos mostram que a decisão de Salso e Lélia de deixarem o Brasil foi acertada. Se antes de partirem vinham conseguindo voar aquém do radar, não tardaria para que virassem alvos.

Folha

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *