Drauzio Varella: Cada Vez Mais Mulheres Viram Cirurgiãs 10/01/2024

Drauzio Varella: Cada vez mais mulheres viram cirurgiãs – 10/01/2024 – Drauzio Varella

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Medicina sempre foi profissão masculina. Havia mulheres, evidente, mas eram minoria.

Nos anos 1960, entre os centena alunos da minha turma na faculdade, somente 15 eram mulheres. Porquê efeito paralelo do machismo que imperava na era, nossas colegas ficavam relegadas à posição de cidadãs de segunda classe.

Quando nos formávamos, as especialidades que as acolhiam eram pediatria, ginecologia, obstetrícia e, eventualmente, a clínica médica. Pouquíssimas ousavam candidatar-se à residência de cirurgia, envolvente competitivo, não sem razão considerado tóxico para mulheres.

Com o aumento progressivo do número de futuras médicas nas faculdades, lentamente, uma vez que costuma ocorrer com uma classe que em princípio rejeita mudanças, essas barreiras têm sido removidas. Não uma vez que donativo dos homens, mas pela norma feminina.

Porquê resquício do preconceito que persiste na sociedade, as cirurgiãs ainda são vistas com suspicácia por pacientes e familiares, principalmente em áreas com intervenções de maior dificuldade: neurocirurgia, oncologia, cardiologia, entre outras. Julgam que faltaria às mulheres resistência psicológica para mourejar com o estresse das situações inesperadas, que podem exigir tomadas rápidas de decisão durante o ato cirúrgico.

Anos detrás, o grupo de Christopher Walls, em Ontário, no Canadá, relatou que pacientes operados por cirurgiãs tiveram uma pequena mas significativa redução da mortalidade nos 30 dias depois a cirurgia, menos complicações e menor risco de reinternações nesse período. Em outro estudo, o grupo encontrou risco mais cumeeira de complicações em pacientes do sexo feminino, quando operadas por homens.

Esses resultados foram recebidos com reservas pela comunidade científica por terem envolvido números pequenos de pacientes.

Em novembro último, o mesmo grupo canadense publicou na revista científica Jama Surgery uma pesquisa na qual avaliaram todos os adultos operados nos hospitais de Ontário, no período de janeiro de 2007 a dezembro de 2019. Murado de 150 milénio tinham sido operados por cirurgiãs e pouco mais de 1 milhão por cirurgiões.

Os procedimentos incluíram as 25 cirurgias mais frequentes, entre as quais apendicectomia, prótese de joelho, retirada da vesícula biliar, descompressão de medula espinhal, histerectomia e ponte de safena.

Os dados ajustados estatisticamente para alongar a interferência das características do hospital, do anestesiologista e dos pacientes, mostraram custos mais elevados nas cirurgias realizadas por homens.

Nos primeiros 30 dias de pós-operatório pacientes operados por cirurgiões custaram US$ 3.115 a mais. Em 90 dias, US$ 4.228 a mais. Na somatória dos gastos em 12 meses a diferença ultrapassou US$ 6.000.

Reduzir custos hospitalares e ambulatoriais de pacientes submetidos à cirurgia tem relevância crucial nesta era de despesas crescentes para o sistema de saúde, mas esse problema não será resolvido expulsando os homens dos centros cirúrgicos. O que interessa discutir é por que cirurgiãs e cirurgiões, profissionais que recebem a mesma formação e treinamento, praticam medicina de forma a apresentar gastos tão díspares?

Entre as explicações devem estar as habilidades femininas nas tomadas de decisão e na informação com pacientes.

É verosímil que as cirurgiãs atuais sejam mais jovens e atualizadas do que os médicos mais velhos, homens na maioria? Ou que obedeçam com mais rigor as recomendações preconizadas pelos consensos de especialistas das sociedades médicas? Ou que sejam mais estudiosas do que os homens?

Pode ser, também, que a sensibilidade afetiva feminina reforce a empatia com os pacientes, que se traduzirá em informação mais clara, maior dedicação e disponibilidade para as consultas e para atender aos chamados e responder mensagens fora de hora que atormentam a vida profissional.

No ano 2000 existiam 219 milénio médicos em nosso país. De lá para cá, a população aumentou 27%, enquanto o número de médicos mais do que duplicou. Hoje, somos 562 milénio, com participação crescente das mulheres. A profissão está cada vez mais feminina, para o muito de todos.


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Folha

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