Evangelizar Ou Pregar Para Convertidos é O Dilema Da Comunicação

Evangelizar ou pregar para convertidos é o dilema da comunicação do governo – 31/12/2024 – Wilson Gomes

Celebridades Cultura

Dentre as razões alegadas por Lula para mudar a informação governamental está a fé de que, sendo o maior comunicante do seu partido, caberia a ele falar mais sobre as ações do governo, participar de programas e conversar com jornalistas em coletivas.

Não serei eu a subestimar o impacto de entrevistas, sonoras e citações de Lula na prensa e na mídia em universal. Assim porquê nunca subestimei o corpo a corpo de Bolsonaro no “cercadinho do Alvorada”, as lives das quintas-feiras, sua presença do dedo ou participações em podcasts, que pautaram o jornalismo e os “trending topics” da conversa social.

Mas o vestuário é que Lula e boa secção da esquerda operam com um padrão de informação centrado no jornalismo e nos meios de volume, preponderante no século 20, mas que foi transformado (e transtornado) pela fragmentação e balcanização do dedo da política.

Isso complica ainda mais o papel de Lula na estratégia de informação do governo, considerando que o debate público hoje é uma guerra de guerrilhas, disputada trincheira a trincheira, o tempo todo.

Fazer informação governamental em tais circunstâncias exige atenção a questões que oriente governo parece ignorar. Atrevo-me a sintetizar isso em algumas regrinhas simples.

Entenda o público a quem se dirige. Não julgue, entenda. Na atual convulsão política, a sociedade está dividida em públicos singulares e diversos. Os interesses de uns podem ser inconciliáveis com os de outros, mas negligenciar um segmento —porquê os petistas fazem com “o mercado”, “a escol”, o agro ou os conservadores— é furar campo para o inimigo.

Apostar tudo em um único público, porquê os pobres (Lula) ou os identitários progressistas (Janja), é um risco enorme em uma sociedade partida. Negligenciados viram ressentidos, e ondas de ressentimento decidem eleições.

Produza mensagens ajustadas a cada público. Poucas e coerentes. O que se diz à base petista não se diz à Faria Lima, e obstinar na retórica identitária esperando que o cristão conservador a aceite é ingenuidade. Uma vez definido o que se quer transmitir, vem a temporada da disseminação, que no mundo do dedo exige repetição, conformidade e sensibilidade aos contextos.

Conformidade é fundamental. Discursos contraditórios ou dispersos serão explorados pelos adversários e confundem os públicos.

Não pode ter uma estratégia para a Secom e outra para cada ministério, muito menos Lula e Janja falando o que lhes vem à cabeça, gerando estrondo e obrigando a informação solene a gastar vigor explicando bobagens e mitigando estragos.

Escolha entre confirmar os crentes ou evangelizar os descrentes. Bolsonaro apostou em radicalizar sua base e confiou que o antipetismo faria o resto. Quase deu notório. Lula parece adotar estratégia semelhante, focando em sua “opção preferencial pelos pobres”.

O identitarismo de Janja traduz isso porquê “opção preferencial pelas vítimas”, enquanto, na visão de Gleisi Hoffmann, é mais uma “aversão preferencial pelo capitalismo e pelo imperialismo”. De todo modo, trata-se de uma pregação voltada para os mais fervorosos entre os convertidos.

Olhe para fora da bolha. Petistas, lulistas, funcionários públicos e identitários de esquerda não irão a lugar qualquer — sabem que, sem Lula, suas chances políticas são nulas.

Por outro lado, os donos do verba, o agronegócio, os conservadores religiosos, os empreendedores e “os que se viram” não são alcançados pela retórica da opção preferencial pelos pobres e precisam ser disputados. Outrossim, há os brasileiros independentes —que não foram marcados pelo bolsonarismo nem são petistas convictos—, de 30% a 40% do eleitorado, e que estão para jogo.

Se a aposta for na conformidade ideológica, na asserção da própria superioridade moral e na pregação para convertidos, a informação do PT deve continuar falando para os identitários do Leblon e os anticapitalistas de Gleisi Hoffmann.

Bolsonaro trilhou esse mesmo caminho. Até a aposta moral é a mesma: se houver justiça neste mundo, merecemos lucrar. Falhou, mas vai ver que funciona desta vez.

No término, é tudo uma questão de prioridades. Ou Lula convence a sociedade de que governa para todos — inclusive para aqueles que a esquerda tradicional e os identitários progressistas detestam— ou terá trabalho no próximo campeonato eleitoral.

A fé de que merece lucrar já está em uso. E se não vencer? Muito, será culpa do mercado financeiro, das fake news, dos pobres de direita, de quem normalizou a extrema-direita ou, enfim, da informação, que não soube propalar os feitos do governo.


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Folha

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