Expoentes Do Breaking Opinam Por Que País Não Foi A

Expoentes do breaking opinam por que país não foi a Paris – 10/08/2024 – Esporte

Celebridades Cultura

Na edição em que o breaking estreia nas Olimpíadas, em Paris, duas referências na cena brasileira do gênero afirmam que uma seletiva confusa e pouco representativa atrapalhou as chances de o país ter competidores no megaevento na França.

Pioneiro da dança de rua no país, o lendário Nelson Triunfo lamenta que ele e outras figuras históricas do movimento tenham sido alijados da organização do processo seletivo.

“Pena que organizaram de uma forma estranha, através da dança de salão. Ninguém me convidou pra zero. Fizeram do jeito deles. Fiquei bastante triste, tinham pessoas muito mais preparadas e mais importantes e ideias melhores para ter feito essa seleção. Foi, de certa forma, meio atropelada a teoria do breaking brasiliano nas Olimpíadas”, disse à Folha.

Quando menciona “dança de salão”, Triunfo se refere à entidade brasileira que era reconhecida pela World Dance Sport Federation, a federação responsável pelo torneio olímpico, a Confederação Pátrio de Dança Desportiva e de Salão (CNDDS), que originalmente não incluía o breaking nem não tinha organizado torneios do gênero.

Posteriormente a inclusão do novo esporte nos Jogos, a entidade incorporou representantes do breaking e tirou o “salão” do seu nome.

“Não quero me meter nisso, mas não funcionou. Eu não gostei de zero, achei que não foi legítimo. Quem fez isso não nos representou. Para o pessoal da [estação de metrô] São Bento [local pioneiro de batalhas de b-boys] também não representou. Para os caras que fizeram as primeiras batalhas de Battle of the Year do Brasil também não. Portanto eles estavam representando o quê?”

O dançarino e coreógrafo Bruno Beltrão, cofundador do Grupo de Rua de Niterói, célebre por sua fusão de dança contemporânea com dança de rua, concorda com o colega.

“No breaking cultural, a competição é mais informal, com batalhas e julgamentos subjetivos. No envolvente olímpico, existem regras estritas e um sistema de julgamento formal. A transição para esse protótipo não foi muito gerida no Brasil, exacerbada pela pandemia e pela falta de informação eficiente, complicando ainda mais o processo seletivo”, afirmou.

“Essa desorganização”, prossegue Beltrão, “e a sensação de falta de suporte institucional refletem diretamente na privação de representantes brasileiros na competição olímpica de breaking em Paris. A falta de um processo seletivo muito organizado, comparável ao que ocorre em outros esportes, e a privação de uma estrutura clara contribuíram para essa situação”.

Numa entrevista recente, a b-girl Thaisinha e o b-boy Pelezinho também afirmaram que, devido ao tempo limitado, a organização deveria ter sido mais dextro –definindo, por exemplo, um treinador que por sua vez tivesse escolhido alguns poucos nomes mais fortes para treinarem até as eliminatórias.

Procurada, a CNDD não deu resposta até a publicação deste texto.

Para Bruno Beltrão, “apesar de o processo de organização não ter sido muito feito, tivemos dois grandes nomes brasileiros [o b-boy Leony e a b-Girl Mini Japa] na Olympic Qualifier Series, mas que infelizmente não conseguiram chegar lá”.

Segundo o coreógrafo do Grupo de Rua, quando o breaking foi incluído uma vez que esporte olímpico, “a expectativa era de que isso trouxesse uma estrutura mais poderoso e organizada para a modalidade no Brasil. No entanto, o que ocorreu foi uma falta de transparência e informações conflitantes, gerando incertezas entre os praticantes”.

Nesse ponto, ele e Triunfo discordam. Quando a novidade foi anunciada, o precursor do hip-hop paulistano vaticinou que a inclusão do breaking nas Olimpíadas iria “servir de pavio para tocar queimação em todo o país”.

Triunfo –um pernambucano nômade que se radicou em São Paulo nos anos 1970– hoje considera que sua previsão estava correta. Ele vê uma proliferação de campeonatos pelo país, mais visibilidade na mídia e mais espaço para projetos do gênero nas quebradas. “Isso de uma certa forma fortaleceu.”

Ele vibra com a cena pujante. “O nosso breaking tá maravilhoso”, diz, citando um torneio recente na Vivenda do Hip Hop, em Diadema, e a vitória de um b-boy paraense (Kley) no campeonato pátrio. “Isso mostra que tá em todo o país e o breaking tá fortíssimo.”

Por outro lado, Triunfo pondera: “As Olimpíadas são uma coisa muito boa, mas são uma grande ilusão. Tem mais de milénio b-boys e b-girls bons no Brasil, aí de repente vai [pros Jogos] um, dois só, se for. O mais importante aí é que [a inclusão] nos levantou de novo a moral de uma certa forma”.

Beltrão tem uma visão menos otimista. “Essa oportunidade nós perdemos. Acho o breaking brasiliano fortíssimo, principalmente se considerar as condições em que ele é praticado. Imaginei [quando foi anunciado] uma rede institucional mais poderoso e mais presente do que realmente aconteceu. Não me conformo uma vez que que essa e outras danças não terem uma inserção na rede de ensino brasileira.”


O fundador do Grupo de Rua associa a situação a questões políticas. “Não dá para olvidar que logo em seguida o pregão da inclusão, em dezembro de 2020, ainda encararíamos mais três anos do pior governo para a superfície da cultura até hoje, e por não valorizar a produção cultural brasileira uma vez que um todo, acabou apagando possibilidade de um projeto pátrio para o breaking. As Olimpíadas eram esse setentrião para alavancar o processo e a cultura dessa dança-esporte no Brasil. Não me espantarei em zero se em 2028 estivermos numa situação parecida.”

Na opinião de Beltrão, a inclusão nos Jogos “parece congruente e um caminho proveniente. O breaking uma vez que modalidade olímpica é somente mais uma ramificação do que as danças do hip-hop podem ser e se transformar. As Olimpíadas são outro passo na luta por validação de uma arte que foi muito discriminada uma vez que profissão”.

Folha

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *