Dificuldade de acessar recursos e violência armada são os dois desafios centrais enfrentados pelas iniciativas de resguardo de direitos lideradas por mulheres nas favelas e periferias da região metropolitana do Rio de Janeiro. Esse é um dos resultados da pesquisa “Mulheres, Ativismo e Violência: a luta por direitos nas favelas e periferias do Rio de Janeiro”, divulgada nesta quarta-feira (3) pelo Observatório de Favelas.
Realizada através do Programa de Recta à Vida e Segurança Pública do Observatório de Favelas, a sondagem foi desenvolvida em duas etapas. Na primeira, foram mapeadas 115 iniciativas existentes de resguardo de direitos lideradas por mulheres em periferias da região metropolitana, mas somente 23,5% delas tinham qualquer tipo de pedestal para realização de suas atividades, apesar de o trabalho desenvolvido ser forçoso para a garantia de direitos no território.
Do totalidade de iniciativas, 70% estão situadas na capital, em peculiar na zona setentrião da cidade; 19% na Baixada Fluminense; 10% na região da Grande Niterói (Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá); e 1% tem abrangência metropolitana.
“O que a gente vê é que, entre as (iniciativas) que têm pedestal, predominava o financiamento privado ou coletivo. Nesse sentido, é fundamental que a gente possa continuar em uma estratégia que potencialize a democratização do financiamento público que garanta a ininterrupção e o fortalecimento dessas ações territoriais de resguardo de direitos”, disse à Sucursal Brasil a diretora do Observatório de Favelas, Raquel Willadino, coordenadora da pesquisa.
Repto contundente
Por outro lado, confirmou que a violência armada aparece uma vez que um dos desafios mais contundentes na atuação dessas organizações. Do grupo de 115 experiências envolvidas na primeira lanço do levantamento, 60% relataram que tinham suas atividades impactadas por confrontos armados. As operações policiais foram responsáveis por 50,8% dos confrontos armados que causaram a interrupção dos trabalhos das organizações, sendo a razão mais frequente para esse tipo de situação.
Essas informações foram aprofundadas depois com a realização de entrevistas com mulheres ativistas que desenvolvem ações territoriais e com representantes de instituições públicas e organizações da sociedade social que atuam na proteção de defensoras e defensores de direitos humanos.
As organizações e coletivos mapeados atuam em temas uma vez que ensino, cultura, paridade étnico-racial, segurança fomentar, gênero e sexualidade, saúde, geração de trabalho e renda, segurança pública e aproximação à justiça. Eles são voltados de forma prioritária para resguardo de direitos de mulheres, pessoas negras, crianças, adolescentes, jovens, pessoas LGBTQIA+, idosos e familiares de vítimas de violência.
Na segunda lanço da pesquisa, foi feito mapeamento de diferentes dinâmicas relacionadas à violência armada que impacta o cotidiano dessas organizações. Nesse sentido, Raquel destacou a violência policial uma vez que uma das questões centrais, além de confrontos relacionados à disputa entre grupos armados e práticas que articulam de alguma forma a violência armada com grupos políticos, muito mormente a partir da atuação de milícias em territórios da periferia da região metropolitana.
Mecanismos
Outro ponto de destaque no estudo é a questão dos mecanismos de proteção para essas mulheres ativistas de direitos. Aí, as violências que aparecem uma vez que mais recorrentes no contexto urbano da região metropolitana e que fazem com que as atividades de periferias precisem acionar mecanismos de proteção são a violência policial, a violência relacionada a grupos armados, a violência política de disputas relacionadas à luta por terreno e território.
“Esses são os temas que aparecem com mais ênfase uma vez que violências que, em qualquer momento, geram a premência de acionamento de mecanismos de proteção”, apontou a diretora do Observatório de Favelas. Do totalidade de iniciativas que participaram do mapeamento, 37,4% afirmaram ter sido vítimas de qualquer tipo de violência praticada em função de sua atuação no território. Dentre as violências apontadas pelas organizações por conta de sua atuação, a violência policial foi a mais recorrente. Há relatos de ameaças, intimidações, agressões físicas, casas invadidas, sedes alvejadas por tiros durante operações, equipamentos apreendidos ou quebrados em retaliação a denúncias, entre outros.
Raquel Willadino destacou que quando se olha os caminhos para o fortalecimento dessas organizações, dentro das estratégias de resguardo de direitos que elas desenvolvem no seu território, é muito importante não só a ampliação das fontes, mas estratégias que democratizem o aproximação às possibilidades de financiamento público e privado, de modo a prometer não só a geração, mas a ininterrupção e o fortalecimento dessas iniciativas.
“A gente fez a escuta de ativistas que atuam em favelas e periferias da região metropolitana, mas também ouviu instituições estatais e da organização da sociedade social que atuam no campo de proteção a defensores. Foram identificadas algumas fragilidades ainda dentro dessa política”. Para enfrentar os impactos da violência armada na atuação do trabalho dessas ativistas, Raquel afirmou que é fundamental que se criem estratégias que possam superar os desafios que foram mapeados relacionados a especificidades territoriais de gênero, sexualidade e raça, vendo uma vez que é verosímil continuar em estratégias que levem em conta especificidades dessas ativistas que estão lutando por direitos em favelas e periferias.
Fragilidade
“A primeira coisa que a gente constata é que ainda são muito frágeis as medidas que levem em conta essas especificidades relacionadas a gênero, sexualidade e raça”, disse Raquel. Entre os desafios apontados destaque para a falta de reconhecimento dessas ativistas uma vez que defensoras de direitos humanos, o que dificulta que acessem mecanismos de proteção. Outro ponto relevante é a poderoso presença de agentes do estado em casos de violência contra essas defensoras; o controle territorial exercido por grupos armados e os vínculos púbico-políticos, caso das milícias. Esses elementos fazem com que as análises de risco e a construção de medidas protetivas sejam mais delicadas.
A pesquisa identifica que é muito importante continuar no aperfeiçoamento de medidas de proteção que possam produzir respostas à proteção dessas defensoras para além da retirada do território. “Porque um dos princípios fundamentais da política de proteção a defensoras e defensores de direitos humanos é que as pessoas possam seguir com suas lutas no território de origem e, muitas vezes, a única resposta verosímil tem sido o deslocamento dessas pessoas para fora do seu território de atuação, para garantia do seu recta à vida”.
Raquel comentou ainda que mulheres negras e mulheres LGBTQIA+, que atuam tanto uma vez que ativistas territoriais, uma vez que na política institucional, têm sido principais vítimas dos processos de violência contra defensores de direitos humanos no contexto que foi pesquisado.
A pesquisa será lançada nesta quarta-feira (3), às 14h, no Observatório de Favelas, durante ato do qual participarão organizações parceiras que atuam nesse campo, uma vez que Justiça Global e Instituto Marielle Franco. O objetivo é que os resultados do estudo possam contribuir para fortalecimento de políticas de proteção a defensores de direitos humanos, em peculiar mulheres negras e LGBTQIA+ “que estão colocando seus corpos à disposição da luta por direitos nos seus territórios e na política institucional”, explicou Raquel Willadino.