Flup levará 8 escritores do brasil para festival literário na

Flup levará 8 escritores do Brasil para festival literário na França

Brasil

A Sarau Literária das Periferias (Flup) vai levar oito destacados escritores da literatura brasileira contemporânea para a 34ª edição do Étonnants Voyageurs, em Saint-Malo, na França. Bernardo Roble, Daniel Munduruku, Djamila Ribeiro, Eliana Alves Cruz, Geovani Martins, Itamar Vieira Junior, Jeferson Tenório e Marcelo Quintanilha vão participar de debates e apresentações dos seus trabalhos. A intenção da curadoria foi reunir “autores cujas obras reinventam as noções de identidade, memória e resistência, destacando a vitalidade e a heterogeneidade da produção literária vernáculo”.

A delegação conta ainda com a cineasta indígena e educadora Graciela Guarani e o pianista Amaro Freitas. É por meio do audiovisual que Graci Guarani da etnia Guarani Kaiowá dá visibilidade e mostra a resistência dos povos indígenas, sobretudo das mulheres. Nos filmes Tempo Circunvalar e Mensageiro do Porvir, expôs saberes tradicionais e práticas cotidianas para mostrar modos de vida invisibilizados. Amaro Freitas fará um concerto restrito no Grand Auditorium. O pianista é reconhecido internacionalmente pelo estilo de jazz inovador, com a mistura de ritmos do Nordeste brasílico com influências afro-diaspóricas.

Brasil-França 2025

A viagem se insere na Temporada Brasil-França 2025, que marca os 200 anos de relações diplomáticas entre os dois países. Criado pelo redactor gálico Michel Le Bris, em 1990, o Étonnants Voyageurs é um dos mais conceituados festivais literários europeus e reconhecido por a cada ano receber autores de todo o mundo para debater literatura, cinema e direitos humanos. A programação, entre 7 e 9 de junho, vai desde mesas de discussão, lançamentos de livros, encontros com o público, a exibições de filmes, exposições e espetáculos musicais.

Desde a sua geração, a Flup promove a literatura em comunidades cariocas, porquê Mangueira, Cidade de Deus, Morro dos Prazeres, Vigário Universal, Babilônia, Vidigal e Maré. Em 2023 foi declarada Patrimônio Cultural Intangível do Rio de Janeiro e premiada com o Jabuti de Fomento à Leitura em 2020. Também em 2025, participará de outros eventos internacionais importantes, porquê o “West Indian Carnival” em Leeds, no Reino Unificado, em parceria com o National Poetry Centre, e do “Middle Ground: Interactions – Transitions e Reciprocities” em Berlim, na Alemanha.

Para o curador da participação brasileira no Festival gálico e diretor-geral da Sarau Literária das Periferias, Julio Ludemir, os autores que participarão do festival na França dialogam com a vocação da Flup de apoiar narrativas periféricas com o mundo todo. 

“A gente usa a Sarau Literária das Periferias no plural porque o nosso diálogo não é só territorial, ele envolve outras ideias porquê debate racial e de gênero. Para que a gente fosse para a França, a gente tinha que ir com essas nossas digitais. Nós não somos a Bienal, não somos a Flip. Não temos as mesmas características”, apontou, revelando que também estava prevista a presença da escritora Conceição Evaristo entre os autores, mas ela não podia viajar neste período por pretexto de outros compromissos.

De contrato com Ludemir, a relação do governo gálico com a Flup vem desde a sua primeira edição em 2012, quando ainda “era um projeto improvável”, sempre tendo uma presença francófona expressiva na Flup. Na parceria com a Flup, o Étonnants Voyageurs trará uma delegação de autores franceses e francófonos ao Brasil em novembro de 2025, reforçando os laços culturais entre os dois países.

“A gente tem uma longa história com essa cultura, não exatamente aquilo que a gente entende ser a França. A gente tem dialogado bastante importante com a diáspora francesa”, contou à Sucursal Brasil, acrescentando que neste período já participou por dois anos do Étonnants Voyageurs, festival que estava com integrantes presentes na última edição da Flup, no ano pretérito, no Circo Voante, meio do Rio.

“Isso é alguma coisa que já vem sendo costurado há alguns anos. As ideias que a gente tinha era dialogar com o caribe gálico, Martinica, Guadalupe, principalmente, mas também a Guiana Francesa, tem uma possante presença negra e mais que uma presença, têm grandes pensadores em graduação mundial, porquê Aimé Césaire, que está na origem da geração do panafricanismo [outro conceito de negritude]. Ele é de uma geração de intelectuais negros que frequentavam a metrópole Paris para estudar”, indicou, incluindo nesse cenário da capital francesa François Fanon e Édouard Bisson.

 


Brasília (DF), 05/05/2025 - Flup leva escritores brasileiros à França.
Foto: Flup/Divulgação
Brasília (DF), 05/05/2025 - Flup leva escritores brasileiros à França.
Foto: Flup/Divulgação

Flup leva escritores brasileiros à França. Foto: FLUP/Divulgação

Na visão de Ludemir, o mundo adora o Brasil, porém não conhece o país, que passou por transformações com a adoção do sistema de cotas e fez surgir uma novidade classe média com maior presença de negros na produção cultural vernáculo. 

“O Brasil não é espargido lá fora apesar de querido. Sabe mais quem é João Gilberto e Tom Jobim, sabe mais o que é Pequena de Ipanema do que esse Brasil que tem Krenak e Munduruku. Por mais que o Étonnants Voyageurs seja um festival cândido, eles não conheciam isso”, observou.

O diretor universal da Flup está positivo que a presença dos autores brasileiros no festival gálico vai trazer mais visibilidade ao trabalho deles, mas a divulgação precisa continuar posteriormente esta atividade. Para ele, é bom que ocorra agora no ano Brasil-França, no entanto, defendeu que pode se estender a outros países. “Isso tem uma ininterrupção. Ali, a gente vai estar em contato com o mercado editorial gálico e todo mercado saberá quem é Djamila Ribeiro, Itamar Vieira, Jeferson Tenório, porque os debates serão intensos”, pontuou.

Djamila Ribeiro

Para a filósofa, ativista e escritora Djamila Ribeiro, autora entre outros títulos de Pequeno Manual Antirracista e Cartas para minha avó, é superimportante levar vários autores e autoras brasileiras para a França, mostrando também a heterogeneidade da literatura brasileira.

“Eu por exemplo sou autora de não ficção, estou ali no meio de vários autores ficcionistas, cada um escrevendo a partir de diversas perspectivas. Acho interessante quebrar com essa imagem que muitas vezes se tem do Brasil porquê uma imagem única, mas de mostrar vários escritores que partem de lugares diferentes, de abordagens diferentes e não necessariamente são autores de ficção, o que é o meu contingência”, disse, por meio de áudio, a pedido da Sucursal Brasil.

A participação no encontro é motivo de satisfação para Djamila, que já tem uma história de alguns anos na França.

“Desde de 2019 eu vou à França publicar meus livros. Em maio de 2019 fiz uma tour por várias cidades da França e também na Bélgica, divulgando o Lugar de Fala e o Quem tem pânico do feminismo preto. Depois, em novembro do mesmo ano, eu voltei para mais uma turnê de divulgação em Toulouse, Lyon, Rennes. Lille e fomos a muitas cidades. Voltei novamente em 2021 e lancei um livro junto com a professora francesa Nadia Yala que à idade era professora da Paris 8 [Vincennes Saint-Denis] e hoje é professora da NYU [Universidade de Nova York], que só está disponível em gálico. Em 2023 voltei para mais uma turnê”, informou.

A escritora contou ainda que porquê coordenadora da Coleção Femininos Plurais, tem uma parceira, da sua editora francesa, que é a Paula Anacaona, responsável pela divulgação do pensamento de tantas autoras brasileiras. 

“Fui a primeira autora de não ficção que ela publicou. Tenho uma parceria de que os livros que publico cá no Brasil da Coleção, envio para ela o que faz sentido para o contexto gálico. Neste sentido já são sete livros da coleção, sete autoras e autores publicados em gálico todos fizeram turnê na França divulgando os seus livros logo tem um trabalho de internacionalização do projeto para o gálico”, revelou, acrescentando que já vendeu mais de 20 milénio livros na França, a partir de uma editora independente, do trabalho da Paula Anacaona, de viagens por várias cidades, na realização de encontros em universidades, porquê um lançamento na Universidade Rennes 2, visitas às cidades de Toulouse e Lyon e também em livrarias e movimentos sociais da França.

“Atualmente tenho quatro livros em gálico, três traduzidos, um com a professora Nadia Yala, Diálogo Transatlântico e estou indo agora para o festival para publicar meu quinto livro em gálico, porque sai agora o Cartas para a Minha Avó em gálico. Estou indo especificamente para publicar esse livro. Também acho importante proferir da minha relação com essas autoras francesas a Nadia Yala escrevemos um livro, juntas, a Françoise Vergès assina o prefácio da edição francesa do Pequeno Manual Antirracista e tive oportunidade de trocar com muitias intelectuais negras francesas nos últimos anos, nesta relação que nós temos desde 2019 quando fiz a primeira tour de divulgação dos meus livros”, afirmou.

Djamila contou também que na primeira vez que foi à França, em março de 2019, participou do programa Personalidades do Amanhã do governo gálico, do Ministério de Relações Exteriores. “É uma relação muito sólida já de alguns anos, de muitos eventos, de muitos diálogos. Fico feliz de ir agora para o festival, que é considerado um dos mais importantes festivais literários, junto com outros autores brasileiros para publicar o nosso trabalho e que para mim, individualmente, também de solidificar essa relação que já tenho com o público gálico”, comentou.


Brasília (DF), 05/05/2025 - Flup leva escritores brasileiros à França.
Escritora Djamila Ribeiro participou do Programa Personalidades do Amanhã na França.
Foto: Flup/Divulgação
Brasília (DF), 05/05/2025 - Flup leva escritores brasileiros à França.
Escritora Djamila Ribeiro participou do Programa Personalidades do Amanhã na França.
Foto: Flup/Divulgação

Filósofa, ativista e escritora Djamila Ribeiro, autora entre outros títulos de Pequeno Manual Antirracista e Cartas para minha avó  FLUP/Divulgação

A escritora valoriza muito o trajo de ver sua obra conhecida em vários países 

“Isso significa ser lida por pessoas em Camarões, recebo contatos, tem uma foto minha, por exemplo, porquê pessoas criativas em um museu de Dakar, no Senegal, não necessariamente só com o público gálico, muito pelo contrário, mas também com essa África que foi colonizada pelos franceses e fala também gálico e esse contato que tenho com autoras africanas e também da diáspora”, concluiu.

Munduruku

O responsável de Meu avô Apolinário e Histórias de Índio, escritor indígena premiado pela UNESCO, Daniel Munduruku, disse que o seu invitação para integrar a delegação de escritores é resultado do seu trabalho já muito espargido no Brasil e que tem desenvolvido, sobretudo, o tema indígena para crianças e jovens. “Me sinto muito honrado de fazer segmento deste time, que está indo simbolizar o Brasil nesta feira na França”, completou em entrevista à Sucursal Brasil.

Para Munduruku, o festival é uma oportunidade de ampliar o número de leitores de seus livros tanto entre os franceses e de outros países porquê os brasileiros que moram fora.

“Isso pode ajudar a eles entenderem mais a própria identidade brasileira. Confesso que a minha preocupação sempre foi atingir o público brasílico, evidente que participar de festival internacional dá orifício para a gente poder falar do Brasil para aqueles que não conhecem o Brasil. Isso pode gerar uma visibilidade tanto para a obra que a gente produz, quanto para os próprios problemas que esses povos passam em nosso país. Tenho certeza de que participar vai gerar essa visibilidade tão importante e necessária e ao mesmo tempo vai gerar uma proximidade com os brasileiros que moram naquele país e com os franceses que têm uma sensibilidade cultural e afetiva com o Brasil”, comentou.

Na visão do redactor, os livros que serão apresentados no encontro podem despertar o interesse de editores locais em fazer a tradução para o gálico e lançar as obras na França.

“Eu sempre levo comigo os meus livros, acho importante levá-los porque a gente acaba atingindo também um público que lê em português e pode se interessar pelas nossas obras. Normalmente faço uma seleção de títulos, tenho 65 livros publicados e costumo levar 10 títulos e alguns exemplares de cada título”, revelou

Entre os livros que ai levar estão Meu avô Apolinário; Memórias de Índio – uma quase autobiografia; o Festim dos Deuses, que considera um livro muito instrutivo e educativo sobre a temática indígena no Brasil e ainda Um estranho sonho de horizonte, que narra um encontro de um não indígena com a cultura indígena e, que para ele, faz uma ponte entre os dois saberes.

Munduruku começou a ortografar quando já era adulto. O início do contato com os livros foi na puberdade, mas eram mais relacionados às disciplinas escolares e poucos voltados à literatura.

“Quando fui para a universidade [com 23 anos para fazer curso de graduação em Filosofia] me dediquei muito mais à leitura e à literatura e isso foi despertando em mim o interesse de entender melhor porquê a sociedade de comporta em relação aos povos indígenas e achei necessário e urgente gerar uma ponte entre essas sociedades através da literatura. Portanto a literatura virou uma instrumento de construção de pontes. Tenho produzido muito. Acho que quanto mais a gente falar sobre povos indígenas mais se consegue arrancar da mente e coração das pessoas certos preconceitos e estereótipos”, apontou.

 

Fonte EBC

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