Furiosa é ótimo Mad Max Em Meio às Repetições De

Furiosa é ótimo Mad Max em meio às repetições de Hollywood – 22/05/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Nove anos posteriormente “Mad Max: Estrada da Fúria”, esse “Furiosa” repete o feito do anterior, com um filme de ação capaz de mostrar, numa safra de decadência do blockbuster, a formosura do cinema de espetáculo? Sim, mas de uma forma dissemelhante.

Felizmente, esta é uma novidade prova do talento de George Miller, responsável pela direção de todos os filmes da franquia apocalíptica iniciada no final dos anos 1970.

Mas se “Estrada da Fúria” tinha uma textura única ao realçar suas filmagens —efeitos práticos, pilhas de carros, explosões e muitos dublês— com a pós-produção do dedo, cá é evidente que muito de seus exageros, motocas e caminhões tunados nasceram pela computação gráfica.

Não é um problema em si. Vide todas as dificuldades dos bastidores de “Estrada da Fúria”, é uma boa solução para dar vazão à originalidade do diretor publicado pelos projetos megalomaníacos, quase irrealizáveis.

Mas também por isso nem sempre a ação tem o peso que sugere, entre lança-chamas, correntes, escopetas e toda sorte de lixo e bugigangas que voa pela tela em vez do humor físico da obra anterior, com traços da comédia de Buster Keaton.

Miller, porém, compensa essas questões técnicas recorrendo à infalível linguagem cinematográfica, e que, muito utilizada, divide o artesanato da molecagem.

Entenda-se, “Estrada da Fúria” é um “tour de force” difícil de repetir, já “Furiosa” —que gosta do olhar irado de Anya Taylor-Joy, no papel-título, tanto quanto da ação— mira uma história de formação vagarosa, que atravessa mais de uma dezena em cinco atos, com recta a intertítulos.

Num mar de “prequels” incompetentes, o filme também é uma boa prelecção de porquê fazer um cinema relevante em séries atreladas ao mercado. É uma jornada de vingança clássica com tintas feministas e boa ração de virilidade, com uma protagonista durona raptada de um matriarcado utópico ainda rapaz e lançada à miséria por homens babões e deformados física e moralmente.

Pesa que Miller seja a cabeça por trás da obra original, e que o roteiro deste “Furiosa” estivesse pronto antes de “Estrada da Fúria”, ainda que o público só tenha publicado a personagem por Charlize Theron.

Nem Furiosa, nem o novo vilão de Chris Hemsworth, Dementus, são principalmente ricos e, caricatos a seu jeito, mostram as fragilidades de Miller e do roteirista Nick Lathouris na hora de transformar emoções em palavras —alguma coisa que se sente nos “voice-overs” e nos diálogos mais longos.

“Mad Max” sempre se beneficiou da falta de sutileza —basta o visual e os nomes patéticos de personagens porquê Rictus Erectus e Scrotus para entender essa expressividade.

Furiosa, em pessoal, tira sua força do silêncio, raspando todo seu cabelo, disfarçada porquê um garoto numa sociedade de brutamontes impiedosos.

Por outro lado, o que proferir do roteiro da cena em que, em subida velocidade, um caminhão pipa cromado, recheado de armas e soldados, sofre uma emboscada de motoqueiros com paraquedas em formato de polvo e ventiladores gigantes nas costas para flanquear o inimigo?

São pelo menos 20 personagens batalhando sem parar somente ao som do ronco dos motores. Poucos saem vivos dessa peleja em que uns dirigem e outros se escondem entre pistões enferrujados, tentam consertar o canudo de combustível, desarmam dinamites ou alimentam o radiador com xixi antes de rosquear uma tampa no formato de caveira.

São tapume de 15 minutos frenéticos mais difíceis de descrever que de somente contemplar. É um magia entender todo esse balé com jeitão de videogame. A sensação se repete em cenas porquê a fuga no primeiro ato e a invasão a uma fábrica de munição no final.

Com uma câmera precisa, que sabe conduzir o olho do testemunha entre os cortes, Miller rege cada cena porquê se nos apresentasse um planta e sua estratégia. Ele localiza o testemunha no cenário e dá tempo para que cada ação seja capturada e decupada, em vez de exorbitar de cortes rápidos para mascarar defeitos e dar uma falsa teoria de velocidade.

Falando em ritmo, o filme tem quase meia hora a mais que “Estrada da Fúria” para dar conta do enredo, pavimentado em risca cronológica.

É um tempo bem-vindo sobretudo na primeira metade, antes da ingressão de Taylor-Joy em cena. Depois, a figura de Jack —papel de Tom Burke—, um soldado do tirano Immortan Joe, é o ponto mais frágil da história, dividindo o papel de mentor e par amoroso de Furiosa. A relação de ambos não se desenrola e parece mais uma muleta para o conjunto.

O que se sobressai é o efeito mítico dessa opereta com coro de “monster trucks”. No curso da vingança, Furiosa crê num horizonte, encapsulado na semente que ganhou da mãe e protege com unhas e dentes; já Dementus decai por confiar nos frutos do ódio. A paragem final da saga faz uma ponte com os eventos de “Estrada da Fúria” e reforça o tom de mito.

Assim porquê a gasolina alimenta os motores, Miller bebe aquilo que há de mais necessário no cinema para atear uma faísca de perdão em Hollywood.

Folha

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