Games Trocam Meninas Indefesas Em Jogos De Mulheres Fortes

Games trocam meninas indefesas em jogos de mulheres fortes – 30/06/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Representação clássica do estereótipo da donzela em apuros nos games, a princesa Zelda protagonizará pela primeira vez sua própria proeza no jogo “The Legend of Zelda: Echoes of Wisdom”, anunciado pela Nintendo na última terça-feira (18).

Além de marcar uma quebra de paradigma para a franquia, a transformação da personagem indefesa em heroína acompanha um movimento largo na indústria de games, que vem diminuindo a predominância de reproduções hiperssexualizadas de mulheres —símbolo desse meio nos anos 1990 e 2000— para colocá-las porquê protagonistas de suas próprias histórias.

No Summer Game Fest, evento realizado no início de junho em Los Angeles em que foram apresentados os próximos lançamentos da indústria de games, proliferaram títulos de grande orçamento protagonizados por heroínas de ação —um tanto que só era frequente entre desenvolvedores independentes, mais propensos a malparar em suas produções.

Os dois principais lançamentos da gigante francesa Ubisoft, por exemplo, tem protagonistas femininas. Os jogadores de “Assassin’s Creed Shadows” controlarão a ninja Naoe no esperado capítulo inspirado no Japão feudal da série de jogos de RPG de ação.

Já “Star Wars Outlaws”, jogo de ação em mundo sincero que se passa entre os acontecimentos dos filmes “O Predomínio Contra-Ataca” e “O Retorno de Jedi”, é protagonizado por Kay Vess, uma contrabandista que procura crescer no submundo da Orla Exterior.

“Queríamos racontar uma história dissemelhante, mostrar um caminho dissemelhante para um personagem”, afirma Julian Gerighty, diretor criativo de “Star Wars Outlaws”, dizendo por que optou pela protagonista. “Ela é um pouco desajeitada, não tem tanta crédito, mas é determinada e capaz de consertar tudo até conseguir seu objetivo. É muito fácil de se identificar com ela.”

A Bandai Namco, conhecida por publicar os dificílimos jogos da série “Dark Souls” e “Elden Ring”, também adicionou uma mulher ao seu portfólio de protagonistas com Haroona, personagem principal de “Unknown 9: Awakening”, desenvolvido pelo seu estúdio canadense Reflector Entertainment.

A personagem, criada com base na laia e movimentos da atriz britânica Anya Chalotra —a Yennefer da série “The Witcher”, da Netflix—, é uma paranormal com poderes telecinéticos, capaz de possuir e controlar seus inimigos. Ao mesmo tempo em que tenta desvendar os segredos sobre seus dons, ela luta contra uma organização maligna que coloca em risco o horizonte da humanidade.

A Microsoft também destacou games com protagonistas femininas em sua apresentação, uma das mais celebradas da última temporada de eventos de games. Foi o caso, por exemplo, de “Perfect Dark”, reboot da franquia de jogos de ação dos anos 2000 da espiã Joanna Dark, que ressurgiu depois um longo período sem notícias sobre seu desenvolvimento.

Ao menos nessa sentimento inicial, a heroína foi apresentada em uma novidade versão, muito menos erotizada do que a que chegou a exarar a revestimento da revista masculina britânica FHM em 2005 para promover o lançamento do console Xbox 360.

Salvo raras exceções, os jogos lançados dos anos 1980 até os primeiros anos do século 21 costumavam encaixar as personagens femininas em dois perfis. Elas podiam ser “donzelas em apuros”, que precisavam ser salvas pelo protagonista, porquê Zelda e princesa Peach, ou personagens hipersexualizadas, com roupas reveladoras e corpos voluptuosos. Casos, por exemplo, de Tifa Lockhart, de “Final Fantasy 7”, e da maioria das lutadoras de “Mortal Kombat” e “Street Fighter”.

Quando representavam personagens secundárias, a exploração de personagens femininas costumava ser ainda mais explícita. Em “Duke Nuken 3D” (1996) o jogador combatia monstros em um planeta devastado, mas encontrava pelo caminho strippers que mostravam os seios caso recebessem uma gorjeta. Já “God of War” (o original, lançado em 2005) conta com um minigame sexual em que o jogador pode participar de um ménage com outras duas mulheres.

Um dos símbolos da era de hiperssexualização nos games tornou-se, depois, uma marca da mudança dessa cultura. Lara Croft, que era representada desde 1996 com um “corpão violão”, com cintura fina e peitos exageradamente grandes, passou por um “reboot” em 2013 e ganhou um visual com proporções mais fiéis à veras e menos sexualizado.

“A Lara Croft é um caso clássico em que se abandonou aquele perfil extremamente sexualizado”, afirma Érika Caramello, CEO do estúdio Dyxel, cofundadora da Rede Progressista Games e professora universitária. “Não que ela ainda não seja formosa ou tenha lá seus atrativos. Querendo ou não, para ser vendável, ela ainda se baseia muito em estereótipos.”

Para Érika, o fenômeno atual é resultado tanto de mudanças culturais quanto econômicas.

Em meio a uma crise, com dezenas de estúdios fechados, projetos cancelados e milhares de demissões, a indústria de games “AAA” —porquê são chamadas as grandes produções— procura novos públicos para restaurar seu prolongamento. E as mulheres, que já são uma parcela bastante importante dos jogadores em dispositivos mobile, aparecem porquê alvos prioritários.

“A gente aponta já há muitos anos, até mesmo cá no Brasil, que mais mulheres consomem jogos do que homens. Obviamente, a indústria está atenta para esses novos nichos para ampliar sua base de consumidores”, afirma Érika.

No caso da Nintendo, que além do novo jogo da Zelda lançou em março “Princess Peach: Showtime!”, proeza protagonizada pela princesa Peach, a estratégia parece clara. Mesmo assim, Bill van Zyll, diretor sênior e gerente universal para a América Latina da Nintendo of America, afirma que os jogos da empresa são voltados para todos, ainda que admita um apelo peculiar às jogadoras.

“Não tenho certeza se esse [ampliar o público consumidor feminino] é necessariamente o principal ou único ponto. Nosso público vai de 5 a 95 anos e temos uma boa mistura, com uma representação subida de jogadoras mulheres. Certamente elas vão curtir esses jogos, mas, para deixar evidente, são jogos desenvolvidos para todo mundo”, diz.

O zelo na enunciação do executivo tem seu motivo. Ainda que a indústria não tenha ignorado por completo sua tradição de heroínas sexy —jogos porquê “Stellar Blade” e a série “Bayonetta” são a prova disso—, essa mudança de padrão é branco recorrente de patrulhas misóginas nas redes sociais, que veem essa tendência porquê uma submissão dos desenvolvedores ao politicamente correto.

Heroínas de ação porquê Aloy, da série “Horizon”, e Abby, de “The Last of Us Part 2”, por exemplo, são sempre citadas porquê exemplos de personagens feias ou masculinas demais. A novidade Joanna Dark também não escapou das críticas, ainda que a personagem tenha sido criada com base na imagem e movimentos da padrão internacional Elissa Bibaud.

Érika reconhece que apesar das mudanças pelas quais o cenário de games passa nos últimos anos, com uma maior participação das mulheres e pessoas LGBTQIA+, a cultura gamer ainda é predominantemente masculina e tóxica a esses novos públicos. Para ela, segmento do problema está nas próprias desenvolvedoras, que não se posicionam de forma contundente para tutelar suas protagonistas.

“Se uma empresa tiver realmente porquê foco o público feminino e ela não está olhando para isso [a toxicidade das redes], aí ela tem um grande problema”, afirma.

Para ela, algumas empresas deixam de tomar providências em relação à toxicidade de suas comunidades por também lucrar com as polêmicas que se espalham nas redes sociais, criando exposição gratuita para seu jogo. “Quanto mais peleja, mais o negócio fica efervescente e mais o algoritmo das redes sociais rende verba para eles”.

A técnico aponta porquê solução a regulação das redes sociais. No entanto, enquanto isso não acontece, cabe à própria comunidade, e em peculiar às mulheres, cobrar desenvolvedoras e publicadoras de games para que façam uma gestão eficiente da comunidade de seus jogos e deem real relevância para a heterogeneidade, tanto nas personagens de seus games quanto internamente, colocando mulheres em postos de comando.

Ver Zelda porquê protagonista da sua própria proeza é um grande passo para as jogadoras, mas é só o prelúdios para a conquista do espaço das mulheres no mundo dos games.

Folha

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