Depois de intensa divulgação, sucesso no Brasil e reconhecimento no exterior, o filme ” Ainda Estou Cá” e a atriz Fernanda Torres verão agora no Mundo de Ouro o resultado desse esforço. A sarau chega à 82ª edição uma vez que termômetro do Oscar e pode laurear um filme pátrio duas décadas depois da última vitória do Brasil.
O longa, dirigido por Walter Salles, pode trazer ao país mais uma estatueta de melhor filme falado em língua não inglesa, a mesma que o diretor ganhou com “Meão do Brasil” em 1999, que marcou a última vitória de uma produção brasileira na categoria. A última indicação aconteceu em 2005, também para um filme de Salles, ” Diários de Motocicleta”. O troféu, todavia, foi para uma produção espanhola.
Sediada no hotel Beverly Hilton, em Los Angeles, e exibida no Brasil pela TNT na televisão e o Max no streaming, a cerimônia de premiação do Mundo de Ouro neste domingo terá a presença de dezenas de astros incontornáveis do cinema —entre eles, um rosto certamente menos espargido, de uma artista brasileira.
A segunda brasileira a ser indicada uma vez que melhor atriz em filme de drama, depois de sua mãe, Fernanda Montenegro, Torres está numa disputa acirrada. Ela disputa o troféu com o sobranceiro escalão de Hollywood, uma vez que a australiana Nicole Kidman, sedutora em “Babygirl”, a americana Angelina Jolie, que faz caras e bocas na cinebiografia “Maria Callas”, e a britânica Tilda Swinton, musa de Pedro Almodóvar em “O Quarto ao Lado”.
Completam a lista de atrizes indicadas a musa canadense de “S.O.S. Malibu”, Pamela Anderson, que agora concorre por “The Last Showgirl”, e a britânica Kate Winslet, protagonista de “Lee”. Ambos os filmes ainda não foram lançados no Brasil, mas receberam muitos elogios da sátira internacional.
A disputa é difícil principalmente porque, fora Anderson, todas as rivais de Torres já foram indicadas ao Mundo de Ouro antes. Kidman e Winslet, aliás, saíram vencedoras nesta mesma categoria em que concorrem agora, nos anos de 2003 e 2009, nesta ordem.
Especialistas lembram que, além de ser desconhecida para a maioria do júri, Torres pode ser prejudicada porque fala português em “Ainda Estou Cá”, o que poderia distanciar votantes estrangeiros, que tendem a priorizar filmes rodados em inglês e rostos familiares.
São 334 votantes no prêmio, sendo 25 deles brasileiros —o equivalente a 7,5% do júri, constituído por jornalistas especializados em entretenimento de 85 países, que tiveram de destinar centenas de horas para ver aos mais de 300 filmes e séries de televisão indicados.
Membros do júri ouvidos pela reportagem em quesito de anonimato afirmam que é impossível ver a todas essas obras —só consegue quem não precisa trabalhar, afirma um deles.
A escolha das produções indicadas aconteceu por etapas e começou no meio de novembro, isto é, há menos de dois meses. Numa primeira ocasião, o júri escolheu seis títulos para cada uma das 27 categorias. Com os nomeados definidos, os jurados seguiram para a segunda período, encerrada na última quarta-feira, a quatro dias da premiação. Nessa lanço, os votantes elegeram seu vencedor para cada troféu.
Apesar das barreiras, no entanto, há esperança para Fernanda Torres. Um dos mais influentes veículos especializados na indústria do entretenimento, a revista americana Variety apostou na vitória da brasileira, sob a justificativa de que ela é a única que concorre com uma obra indicada em mais de uma das categorias principais do prêmio.
A disputa por melhor filme falado em língua não inglesa é menos acirrada do que a pelo troféu de atriz, mas ainda é complicada. Previsões da mídia estrangeira apontam que “Ainda Estou Cá” tem uma vez que principais adversários o indiano “Tudo que Imaginamos uma vez que Luz”, indicado também à categoria de melhor direção, e o gálico “Emilia Pérez”.
“Emilia Pérez” é a maior pedra no caminho do Brasil. O longa representa um país que investe mais verba em sua produção audiovisual e ainda se beneficia do poder da Netflix, sua distribuidora, que vem injetando verba numa ampla campanha de divulgação. Não à toa, ele se tornou o filme de comédia ou músico com mais indicações na história do Mundo de Ouro, tendo ultrapassado o megassucesso “Barbie”.
“Emilia Pérez” combina elementos de thriller e músico para racontar a história de uma líder do tráfico que passa por uma transição de gênero. Com o Mundo de Ouro adotando as histórias com personagens mais diversos em termos de raça, gênero e orientação sexual nos últimos anos, em seguida ter mergulhado numa crise gerada por denúncias de devassidão e falta de heterogeneidade, “Emilia Pérez” acumula ainda mais chances.
Resultados à segmento, a indicação de “Ainda Estou Cá” e de Fernanda Torres já são tidas uma vez que emblemáticas para o cinema brasílico, que há décadas sofre para adentrar Hollywood. Antes, ao longo de 81 edições do prêmio, só sete filmes nacionais foram indicados —”Orfeu Preto”, “Dona Flor e seus Dois Maridos”, “Pixote: A Lei do Mais Fraco”, “Abril Despedaçado”, “Cidade de Deus”, “Diários de Motocicleta” e “Meão do Brasil”, que saiu vencedor há 26 anos.
Aliás, a maioria dos atores brasileiros que passaram pela premiação já tinha alguma relação com o cinema americano, diferentemente de Torres. É o caso de Sonia Braga, que aproveitou o período em que despontou fora do Brasil para disputar três vezes uma vez que atriz coadjuvante, por “O Ósculo da Mulher-Aranha”, de 1986, “Luar sobre Parador”, de 1989, e ainda “Amazônia em Chamas”, de 1995.
Há ainda Daniel Benzali, brasílico radicado nos Estados Unidos, que foi indicado uma vez que melhor ator pela série “Murder One”, de 1996, e mais recentemente, em 2016, Wagner Moura, que concorreu por seu papel na série “Narcos”, da Netflix. Moura também paquerava o audiovisual americano havia tempo e por lá já tinha lançado o longa “Elysium”, com Jodie Foster e Matt Damon.
Mesmo com um histórico menos favorável do que o desses atores brasileiros, Torres tem oferecido duro para equiparar suas chances e as de “Ainda Estou Cá” com as dos concorrentes. Ela vem liderando uma maratona incessante de exibições, entrevistas, jantares e outros eventos pelos Estados Unidos afora e por várias capitais da Europa.
Passou 25 dias em Los Angeles, frequentando sessões organizadas pela distribuidora internacional do filme, a Sony Pictures, com plateias repletas de votantes das premiações de Hollywood —não só do Mundo de Ouro, mas também do Oscar, que acontece em março e pelo qual tanto a atriz quanto “Ainda Estou Cá” tentam ser reconhecidos.
Torres reservou um dia inteiro para dar entrevistas aos jornais e sites americanos, quando também participou de uma sabatina com os votantes do Mundo de Ouro. Deu manifesto —o filme tem aparecido em várias premiações da temporada, desde o prêmio de críticos de Los Angeles até o Bafta, da Liceu Britânica de Cinema.
Nos eventos internacionais em que promove o filme “Ainda Estou Cá”, Fernanda Torres tenta explicar aos votantes de premiações uma vez que o Mundo de Ouro o contexto histórico por trás da trama. No longa-metragem de Walter Salles, ela interpreta Eunice Paiva, mulher de Rubens Paiva, papel de Selton Mello, um ex-deputado cassado e morto pelo regime militar nos anos 1970.
Não há dúvidas sobre a eficiência do tête-à-tête. Votantes ouvidos pela reportagem admitem que já priorizaram um filme porque puderam conversar por alguns minutos com o elenco ou diretores —não só por bajulação, mas porque a troca com os criadores pode tornar a obra mais compreensível.
É inegável a repercussão de “Ainda Estou Cá” na prelo internacional, mas o que mais impressiona é o interesse por Torres. Ela foi chamada de ícone global pela revista Vanity Fair, ganhou um perfil no The New York Times e apareceu nas listas de apostas para o Oscar de outros veículos importantes.
Segmento desse movimento é consequência de uma torcida que os brasileiros fazem pelo filme na internet, enchendo qualquer publicação feita por páginas internacionais com comentários que pedem reconhecimento ao Brasil.
O vértice disso ocorreu quando Torres gerou um alvoroço no perfil do Oscar no Instagram, o The Academy. Em foto no evento Governors Award, em Los Angeles, a brasileira conquistou 2,9 milhões de curtidas, 50 vezes mais do que a imagem da americana Demi Moore, conhecidíssima em Hollywood e dona de uma das performances mais elogiadas do ano por “A Substância”.
Para além de Torres, o Mundo de Ouro deste ano tem uma safra impressionante de performances femininas, inclusive as indicadas na categoria de filmes de comédias e musicais, geralmente preenchida por nomes de menos peso.
Agora, concorrem a espanhola Karla Sofía Gascón, de “Emilia Pérez”, Mikey Madison, de “Anora”, e a própria Demi Moore, por “A Substância”. Outros nomes de grife na lista são o de Cynthia Erivo, que soltou o vozeirão em “Wicked”, Zendaya, por “Rivais”, e Amy Adams, protagonista do filme “Canina”.
Dessa forma, as disputas masculinas chamam menos a atenção. No papel de um cardeal em “Conclave”, Ralph Fiennes, que ficou popular uma vez que Voldemort, o vilão de “Harry Potter”, bulha pelo prêmio de ator em filme de drama com Timothée Chalamet, que interpreta Bob Dylan em “Um Completo Incógnito”. Também está na disputa Sebastian Stan, que vive um jovem Donald Trump no longa “O Novato”.
Já entre os atores coadjuvantes, também em drama, o Mundo de Ouro indicou Guy Pearce, de “O Brutalista”, filme de quatro horas que deve se realçar na temporada de premiações, e o russo Yura Borisov, por “Anora”, que conta a história de uma pequena de programa que se relaciona com um menino rico.
“O Brutalista”, aliás, é um dos indicados a melhor filme de drama, num páreo que tem ainda “Duna: Segmento Dois”. “Conclave” e “Setembro 5” também brigam pela estatueta de filme de drama. Para melhor comédia ou músico, o Mundo de Ouro se lembrou de alguns dos filmes mais elogiados do ano pretérito, uma vez que “Anora” e “Emilia Pérez”, ambos premiados no Festival de Cannes.
Na flanco da televisão, os especialistas não esperam surpresas. Uma vez que indicavam as previsões, o Mundo de Ouro priorizou séries já queridinhas da sátira, com os cozinheiros de “O Urso”, as comédia “Hacks” e “Only Murders in the Building”, esta com Selena Gomez, além de “Bebê Rena”, uma das minisséries mais comentadas do ano, e o drama “Xógum: A Gloriosa Saga do Japão”.
Esse reconhecimento de produções e atores de várias nacionalidades, com indicações do elenco nipónico de “Xógum”, além de Torres e do recorde da França com “Emilia Pérez”, é um sinal de um Mundo de Ouro disposto a extinguir quaisquer resquícios da crise pela qual passou nos últimos anos, depois de acusações de racismo, suborno e falta de heterogeneidade em seu júri.
Em 2022, no vértice da polêmica, a transmissão do prêmio na televisão foi cancelada, e a cerimônia foi restrita a poucos convidados. De lá para cá, o Mundo de Ouro tentou se redimir, reformulando o seu corpo de jurados.
Em meio ao escândalo, a premiação foi comprada. Hoje, é controlada pelas produtoras Dick Clark Productions e Eldridge Industries, e não mais pelos jornalistas da entidade sem fins lucrativos Hollywood Foreign Press Association, a HFPA, uma vez que foi por quase 80 anos.
Apesar de o clima agora ser mais festivo, a polêmica está longe de finalizar. Uma reportagem da empresa de mídia americana Puck News mostrou que membros da associação de jornalistas, que vêm se sentindo marginalizados, teriam levado os novos donos do Mundo de Ouro à Justiça por estarem com chegada restrito a entrevistas e eventos, mesmo tendo sido votantes por anos.
No entanto, com bilheterias em queda, eventos uma vez que o Oscar e o Mundo de Ouro ainda são capazes de invocar a atenção do público para o cinema. É interesse de quase todos, portanto, encobrir o caos com glamour sem término.