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Grupo Tortura Nunca Mais homenageia vítimas de violência do Estado

Brasil

O Grupo Tortura Nunca Mais, do Rio de Janeiro, entregou nesta segunda-feira (1) a Medalha Chico Mendes de Resistência para pessoas e grupos que defendem direitos humanos. O movimento, criado em 1985 para lutar contra a violência do Estado, realizou o evento na Faculdade Pátrio de Recta da Universidade Federalista do Rio de Janeiro (FND/UFRJ).

Os organizadores reforçam que a edição é emblemática por conta dos 60 anos de implantação da ditadura militar, quando o Estado brasílio promoveu perseguições, torturas e assassinatos contra opositores.

“Importante sempre denunciar. A memória precisa ser preservada nesse país. O povo brasílio tem que saber o que aconteceu há 60 anos. A ditadura matou e torturou muita gente”, disse Victória Grabois, diretora do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ. “O meu irmão tinha 17 anos quando o golpe aconteceu. E nove anos e meio depois disso, ele deu o muito maior dele, a própria vida, para que hoje a gente tivesse democracia. Essa história tem que continuar viva, para a gente compreender o que aconteceu. Porque a violência contra os opositores do regime naquela idade, hoje é direcionada para os pobres, negros e favelados”.

Um dos homenageados desse ano foi Norberto Nehring, militante da Ação Libertadora Pátrio (ALN). Ele foi recluso, torturado e assassinado em 1970, no Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo. A filha, Marta Nehring, recebeu a medalha em nome da família.

“A versão solene da morte do meu pai foi suicídio, estava no atestado de óbito. E eu passei a minha puerícia toda lidando com isso. Depois, houve reconhecimento de que foi uma farsa policial, conseguimos atestado de óbito que falava em ‘mortes não naturais em dependências policiais’. Mas nossa família ainda quer saber quem matou e uma vez que matou. Buscamos pela verdade e pela justiça”, afirmou Marta.

Rose Michele Rodrigues, advogada e militante de direitos humanos, veio receber a homenagem em nome da tia Ranúsia Alves Rodrigues. Estudante universitária e militante do Partido Comunista Brasiliano Revolucionário (PCBR), Ranúsia foi assassinada por agentes da ditadura, mas o corpo nunca foi encontrado.

“Provavelmente ela foi presa e torturada, e inventaram um teatro para encobrir o corpo. Ela saiu perseguida de Pernambuco para o Rio de Janeiro. E cá, foi pega junto com um grupo do PCBR. Meu pai tentou restabelecer o corpo. E eles disseram que se ele viesse, seria recluso. Ela foi enterrada em uma vala generalidade, uma vez que indigente, mesmo tendo sido reconhecida. Foi achada a vala, mas nunca se recuperou o material genético. Até hoje é considerada desaparecida política. E eu estou muito orgulhosa de lembrarem da minha tia, que lutava por uma sociedade mais justa e de continuar a luta dela por meio da militância”, ressaltou Rose Michele.

Para os quilombolas de Sapê do Setentrião, no Espírito Santo, ser homenageado é uma forma de dar mais visibilidade à luta pela terreno e pela manutenção de tradições ancestrais. Um problema que foi aprofundado depois do golpe de 1964.

“A nossa luta é pela demarcação e titulação dos nossos territórios no Sapê do Setentrião. Todos nós somos nascidos e criados lá. E a partir do momento em que papeleiras e empresas de cana de açúcar se instalam no território, começaram o processo de expulsão das nossas famílias e do nosso modo de vida. Na idade da ditadura, nos anos 1960, nós éramos mais de 13 milénio famílias. E hoje fomos reduzidos a menos de 4 milénio famílias. O território vem sendo invadido pelas grandes empresas e pelo grande capital”, explica Olindina Serafim, professora da ensino escolar quilombola.

Também foi lembrado na noite dessa segunda-feira o grupo prateado Historias Desobedientes. Ele é formado originalmente por familiares de militares e civis que foram responsáveis pela ditadura militar na Argentina. Em vez de proteger os ascendentes ou adotar um silêncio cômodo, se mobilizam para expor e denunciar os crimes cometidos no período.

“Somos familiares que repudiam os atos de nossos pais, avôs e tios. Saímos em resguardo das vítimas, dos sobreviventes e parentes. Crescemos com uma grande vergonha do lugar de onde viemos. E repudiamos nossos familiares, independentemente do vínculo afetivo que temos com eles. É uma posição que secção de uma decisão moral e humana”, disse Bibiana Reibaldi, psicopedagoga e membro do coletivo Historias Desobedientes.

Os demais homenageados pelo Grupo Tortura Nunca Mais foram:

Maria Criseide da Silva e Wellington Marcelino Romana: parelha que, por se envolver na luta por terreno e moradia em Minas Gerais, foi recluso e torturado.

Boycott, Divestment, Sanctions (BDS) e Stop the Wall: movimentos sociais que buscam esteio internacional para sentenciar as ações de Israel contra palestinos.

Gonzaguinha (in memoriam): cantor e compositor, morto em 1991, publicado por ser crítico à ditadura militar e, por isso, ter muitas de suas músicas censuradas.

Leonel Moura Brizola (in memoriam): político trabalhista, governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, que se opôs à ditadura no Brasil.

Pastor Mozart Noronha: era membro da Ação Popular (AP), organização cristã de resistência à ditadura. Teve de exilar-se na Suíça e em Portugal na dez de 1970.

A Medalha Chico Mendes de Resistência está na 36ª edição e acontece todos os anos no dia 1º de abril, data que para o Grupo Tortura Nunca Mais é o dia correto do golpe de 1964. Vale substanciar que esse é um debate político. Militares e alguns pesquisadores defendem o 31 de março, quando começou o movimento de tropas golpistas em Minas Gerais. Outros pesquisadores e ativistas apontam o 1º de abril, quando o presidente João Goulart deixa Brasília, a capital federalista, e vai para Porto Satisfeito. Já o 2 de abril é quando o Congresso Pátrio declara vaga a presidência da República.

 

Fonte EBC

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