Uma vivenda de shows é muito mais do que cimento, concreto, ferro, madeira e um pedaço de amplificadores. As estruturas duras se encantam quando uma margem ou um cantor sozinho dá vida a seu repertório para um pedaço de fantásticos, admiradores ou gente que simplesmente não tinha zero melhor para fazer naquela noite.
Além da exposição à música ao vivo, essas casas marcam encontros entre pessoas e são espaços de geração de memórias afetivas. Por isso, para além da eleição desta edição d’O Melhor de São Paulo, convidamos jornalistas fãs de música da Redação da Folha para contarem qual é a vivenda de shows paulistana em atividade que mais marcou a história de cada um. Veja a seguir.
Bárbara Blum, repórter do Todas
Sesc Pompeia
As casas de show em São Paulo vêm e vão com uma velocidade difícil de seguir. Numa lista afetiva porquê essa, eu poderia referir outras, onde vivi mais coisa —a Via Funchal onde eu, nos meus 15 anos, vi Franz Ferdinand e Vampire Weekend, ou a Moradia do Mancha, onde nos apinhávamos nos cômodos e janelas para ver Boogarins. Citaria até a Mas elas estão na lista das que foram. No coração e na cidade, sobra o Sesc, com sua estrutura gigantesca, proposta democrática e programação fina. Impossível ver um show ali sem topar uns 20 amigos. Porquê tem que ser.
Carolina Moraes, repórter e produtora do podcast Moca da Manhã
Sesc Vila Mariana
O Sesc Vila Mariana ficava entre minha vivenda e a escola onde estudei por muitos anos. Na mocidade e prelúdios da vida adulta, seu teatro deu um perímetro pra cidade em que, descobri ali, sabor de viver. Deu pra riscar da lista as apresentações de ídolos, porquê Gal Costa, saber bandas que nunca mais parei de ouvir, porquê Metá Metá, e ver pela primeira vez as apresentações de álbuns que marcaram uma período inteira da vida, porquê o “Climão”, da Letrux. No Vila Mariana couberam os passeios com a família, as idas solitárias a shows e as paradas de uma longa noite de Viradela Cultural com os amigos.
Daigo Oliva, editor da Homepage
Sesc Pompeia
Lugar mais democrático de São Paulo devido aos preços praticados e à qualidade dos serviços que oferece, o Sesc Pompeia tem na choperia talvez a sua maior marca. Lá, vi bandas tão diversas quanto Television e El Guincho, sempre perto dos artistas, sem grades que separassem palco e público. Foi lá também que vi pela primeira vez o Teenage Fanclub, preocupação indie desde a mocidade, com ingressos de última hora que meu irmão conseguiu. Qualidade de som e envolvente excelentes em um espaço com o tamanho claro: nem tão grande que faça a pessoa lá detrás ver a margem porquê um pontinho nem tão pequeno a ponto de espantar bandas de porte médio e grande.
Guilherme Luis, repórter da Ilustrada
Espaço Unimed
Nos últimos anos frequentei tanto o Espaço Unimed, saudoso das Américas, que fui forçado a gostar de lá. A disposição da pista não é das melhores, é verdade, e às vezes o calor sufoca, mas vi ali artistas que me marcaram no pretérito —uma Demi Lovato roqueira, Avril Lavigne num desânimo que é só dela e Pitty, mais recentemente, que me fez suar com o pula-pula da turnê de 20 anos do “Magnífico Chip Novo”.
Jairo Marques, editor de Vida Pública
Tokio Marine Hall
O Luiz Melodia tinha morrido naquele dia e havia um clima de consternação entre o público, envolvente mais do que propício para que Nando Reis, Gilberto Gil e, soberanamente, Gal, entoassem Pérola Negra e arrancassem lágrimas, emoção e gritos do público. Na Tokio Marine Hall finquei na presente da minha evo aquele momento, mas também um outro do Chico Buarque cantando a pedrada na Geni, outro de Bethânia descansa declamando o Brasil e o paixão e ainda um da Vanessa da Mata dançando divinamente com aquele cabelão. Ainda muito.
João Perassolo, repórter da Ilustrada
Espaço Unimed
Perdi a conta de quantas vezes bati cabelo nos shows de metal que vi no Espaço Unimed, que para mim sempre será o Espaço das Américas. Foi lá que assisti à despedida do Slayer —uma das minhas bandas preferidas—, duas vezes Megadeth e, no ano pretérito, o surto coletivo que foi a apresentação do Gojira. O som é muito bom em qualquer lugar da vivenda, os acessos ao bar e ao banheiro são rápidos e o ar-condicionado em universal funciona. Fora que tem um espaço para fumar um cigarrinho. O que mais um metaleiro poderia querer?
Magê Flores, editora de Podcasts
Sesc Pompeia
Uma vivenda de shows pode ser um lugar de congregação na mais árida das cidades. Estabelecer, desde cedo, uma relação com um espaço assim é ter uma lista de memórias que podem salvar sua relação com a cidade toda. Foi no Sesc Pompeia que furei pela primeira vez a classificação indicativa de um show (acompanhada dos meus pais), que fui a meu primeiro show sozinha, que fui a muitos shows acompanhada de amigos, de paixões e de namorados e que fui pela primeira vez a um show com um bebê na bojo (sem nem saber disso ainda). Recomendo uma vivenda de show de estimação a todos. Se ela puder ser acolhedora porquê a do Sesc Pompeia, tanto melhor.
Manoella Smith, repórter da pilar Mônica Bergamo
Cine Joia
O formato em diamante, com o pavimento levemente predisposto, é extremamente amigável para o público baixinho com menos de 1,60 m de profundidade (eu!), e dá para chegar muito perto do palco. A capacidade do espaço é um ótimo meio-termo. Ao mesmo tempo que permite uma apresentação com ares intimistas, comporta gente suficiente para proporcionar aquele sentimento de catarse. O Cine Joia é um desses lugares que costuma receber aquela margem ou dupla não tão conhecidas que você adora e não esperava que viesse ao Brasil tão cedo.
Nadine Promanação, editora-assistente da Ilustrada
Vibra SP
Minha vivenda de shows favorita quase não resistiu aos impactos da pandemia. O macróbio Credicard Hall encerrou suas atividades em 2021, para se tornar o Vibra São Paulo, em 2022. Foi lá, em 2019, que assisti pela primeira vez a um show de Maria Bethânia com minha avó Regina —a grande responsável por me tornar fã da cantora. Na noite fria e chuvosa de dois de agosto daquele ano, a zangão rainha aqueceu o público com seu show “Claros Breus”, um facho de luz no início de uma período obscurantista para a cultura no Brasil. O Vibra São Paulo enche os olhos pela grandiosidade, conforto e acústica impecável. Voltei lá em 2022, de novo para ver Maria Bethânia, mas com a turnê “Fevereiros”. Na primeira vez assisti ao show da mesa VIP e na segunda, do torrinha, ambas as experiências marcaram minha vida para sempre.
Priscila Camazano, repórter de Política
Audio e Espaço Unimed
Tenho lembranças de muitos shows de hip-hop que fui na vida, mas o do De La Soul, na Audio, em 2016, foi marcante. Ter a oportunidade de ver o trio ao vivo foi de eriçar. Outra presente que tenho da vivenda foi a de testemunhar ao show da Iza na estreia da turnê de seu primeiro disco, “Dona de Mim”, com participação próprio de Gloria Groove, em 2018. Me lembro de permanecer encantada com a potência das duas no palco. Ainda falando de rap, um dos meus gêneros favoritos, não posso deixar de mencionar o show de lançamento do disco “Cores e Valores” dos Racionais MC’s, no logo Espaço das Américas —hoje, Unimed—, em 2014. Na vivenda, também vi shows históricos do Criolo e do Emicida. Boas lembranças!
Roberto de Oliveira, editor de Projetos Especiais & Parcerias
Espaço Unimed
Um dos discos mais fundamentais da história da música brasileira, “Transa”, álbum de 1972, foi reproduzido ao vivo diante de uma povo, que lotou o Espaço Unimed, numa espécie de catarse coletiva. Foi um momento histórico em novembro de 2023. Caetano Veloso comandou o espetáculo de tal forma que a sensação era a de estarmos no gargarejo de um palquinho intimista. Na verdade, estávamos em transe. Talvez por estar perto de onde vivo ou quem sabe pela volubilidade de repertório —saudade Los Hermanos; volta logo Ivete—, o macróbio Espaço das Américas ocupe um lugar privilegiado na memória afetiva. Naquela madrugada, dispensei o Uber. Caminhei, ao lado de um camarada dos tempos de devoção também às capas de vinil, por quase 2 km até em vivenda. Uma pergunta nos fez companhia: “Pra que rimar paixão e dor?”