A Justiça Federalista no Paraná determinou que a Instauração Vernáculo do Índio (Funai) se abstenha de entregar lonas, madeiramento, ferramentas e outros materiais que possam ser usados para construção de abrigos/moradias às comunidades indígenas que ocuparam imóveis rurais das cidades de Guaíra e Terreno Roxa, no oeste paranaense. Consultada, a instauração informou à Filial Brasil que recorrerá da decisão.
A sentença foi proferida nesta terça-feira (23), pelo juiz federalista João Paulo Nery dos Passos Martins, da 2ª Vara Federalista de Umuarama – o mesmo que, na última sexta-feira (19), autorizou a reintegração de posse de áreas rurais que grupos avá guarani ocuparam a término de cobrar a peroração do processo demarcatório do território já delimitado pela Funai e em disputa, na Justiça, desde 2018.
Na decisão, o juiz federalista afirma que a entrega dos materiais de construção pela Funai contraria “o propósito de desocupação do imóvel” manifesto nas “ordens judiciais vigentes”, que determinam “expressamente a desocupação dos imóveis pelos indígenas”.
“Em que pese a missão institucional da Funai de prestar assistência às comunidades indígenas e se prometer o mínimo existencial, cumpre observar que a instauração, que inclusive integra o polo passivo, e os demais órgãos públicos que atuam no litígio têm o obrigação de colaborar com a realização das decisões judiciais e, em privativo, estimular o cumprimento voluntário uma vez que forma de prevenir a desocupação forçada e os possíveis conflitos daí decorrentes”, sustenta o magistrado.
A sintoma judicial ocorreu depois a coordenação regional da Funai solicitar o espeque da Polícia Federalista (PF) para entregar kits de suprimentos aos avá guarani que participam do que os indígenas classificam uma vez que um processo de retomada de seus territórios originários, que visa permitir a expansão de suas aldeias e a preservação das principais características de seu modo de vida tradicional.
“Vale ressaltar que o recente movimento de ocupação instaurado a partir de dezembro de 2023 e retomado com mais intensidade nos últimos dias trata-se essencialmente de ampliação de áreas, pois as comunidades da etnia indígena avá guarani já estavam instaladas em outras áreas na região, há tempos”, acrescentou o juiz federalista, mencionando que, no pedido de espeque que fez à PF, a Funai informava que pretendia partilhar aos indígenas mantimentos, chuva, itens de higiene, além de sete rolos de 100 metros de lonas.
Mobilização
As ocupações ou retomadas de áreas do oeste paranaense reivindicadas uma vez que territórios tradicionais se inserem em um contexto mais largo de mobilizações indígenas que acabaram acirrando a disputa com proprietários rurais em diferentes unidades da federação. E que culminou em ataques armados contra os indígenas no Paraná, no Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul.
Conforme o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) já tinha informado anteriormente, no início de julho, 22 famílias avá guarani que ocupam segmento do território já delimitado para dar lugar à futura Terreno Indígena Guasu Guavirá se espalharam, ampliando a ocupação. De conciliação com a pasta, isso aconteceu “porque a comunidade em que vivem já não comporta mais habitantes.”
“As famílias foram, logo, branco de ataques de ruralistas”, relatou o MPI, destacando que nem mesmo a presença de agentes da Força Vernáculo de Segurança Pública na região intimidou os agressores. “Entre os feridos, um indígena foi baleado. Além da violência física sofrida pelos avá guarani, doações e entrega de mantimentos foram impedidas de serem realizadas no lugar por ruralistas”.
Em razão da violência, o governo federalista organizou um grupo com representantes de várias pastas e órgãos públicos, incluindo MPI e Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, para tentar mediar os conflitos em Mato Grosso do Sul e no Paraná. Uma comitiva esteve em Guaíra, na terça-feira (16). Além de visitar duas áreas ocupadas por avás guarani, os integrantes do grupo federalista se reuniram com ruralistas de Terreno Roxa e com representantes da coordenação regional da Funai e da Polícia Militar do Paraná.
Outrossim, a pedido do MPI e da Defensoria Pública da União (DPU), o Ministério da Justiça e Segurança Pública autorizou o ofício de agentes da Força Vernáculo em ações estatais para preservar a ordem e a integridade em aldeias do Cone Sul do Mato Grosso do Sul e nas regiões fronteiriças do estado.
Marco temporal
Em nota, o Ministério dos Povos Indígenas atribuiu o aumento da “instabilidade” à aprovação da Lei 14.701/23, que, na prática, estabelece o chamado marco temporal – tese segundo a qual os povos indígenas só têm recta aos territórios originários que já ocupavam ou reivindicavam até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federalista.
O Congresso Vernáculo aprovou a lei em setembro do ano pretérito, poucos dias depois o Supremo Tribunal Federalista (STF) indicar a inconstitucionalidade da tese por entender que o recta constitucional dos povos originários aos territórios tradicionais independem da existência de um marco temporal.
A decisão dos ministros da Golpe motivou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a vetar segmento da Lei 14.701. Em dezembro, mas, o Congresso Vernáculo derrubou o veto de Lula, mantendo o marco temporal. A queda de braço entre Executivo e Legislativo foi judicializada por setores favoráveis e contrários à lei. Em abril, o ministro Gilmar Mendes, do STF, determinou a instauração de um processo de conciliação, suspendendo o julgamento de qualquer ação que trate do tema. A previsão é que a percentagem criada para tentar estabelecer um conciliação entre as partes comece a funcionar no próximo dia 5 de agosto.
“O Ministério dos Povos Indígenas enfatiza que a instabilidade gerada pela lei do marco temporal, além de outras tentativas de se seguir com a tarifa [anti-indígena], tem uma vez que consequência não só a incerteza jurídica sobre as definições territoriais que afetam os povos indígenas, mas abre ocasião para atos de violência que têm os indígenas uma vez que as principais vítimas”, sustenta o MPI.
Também em nota, a Federação da Cultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul) também mencionou a “instabilidade jurídica”, atribuindo-a à inação do poder Público. De conciliação com a entidade que reúne 69 sindicatos rurais sul-mato-grossenses, há, atualmente, 146 áreas “invadidas” em todo o estado.
“São ocorrências que evidenciam a instabilidade jurídica vivenciada há décadas em nosso estado, resultante da falta de uma resposta definitiva por segmento do Poder público, que garanta a pacificação no campo.” A entidade também manifestou preocupação com a escalada da violência e com a segurança de “número significativo de produtores rurais que, mesmo tendo adquirido seus imóveis de forma legítima e com posse pacífica exercida há mais de meio século, têm seus títulos questionados e suas áreas invadidas”.