Krenak: Literatura Pode Ajudar A Propor Novas Formas De Viver

Krenak: literatura pode ajudar a propor novas formas de viver na Terra

Brasil

De forma direta ou indireta, todos estão participando do consumo indistinto do planeta. É o que acredita o noticiarista e ativista ambiental Ailton Krenak (foto). O líder indígena, responsável dos livros Ideias para procrastinar o término do mundo e Horizonte avito, entre outros, afirma que todos participam da bagunça que está acontecendo no planeta, uma vez que “nós somos o corpo da Terreno”.

“Se você disser que a sua mão não tem culpa do que o seu pé faz, você está considerando a possibilidade do seu pé se movimentar sem a ajuda da mão. Qualquer tipo de ajuda vai ter. Nem que seja a indiferença, a não resposta”, salienta.

Krenak não tira a responsabilidade nem dos povos indígenas. “Os povos originários costumam entender-se porquê filhos da Terreno. E eu incito os meus companheiros dizendo: se ela é nossa mãe, porquê é que vocês deixam fazer bullying com ela? Se ela é nossa mãe e estão predando-a, que tal a gente partir para cima desses caras?”, sugere.

Ao falar do processo que ele denuncia porquê “manducar a Terreno”, o ambientalista cita, em sua opinião, as três expressões mais visíveis de devastação: mineração, devastação das florestas e exploração do petróleo. Dessa última, Krenak acredita que não tem porquê evadir. Nem os mais remotos povos.

Extrativismo

Para ele, ninguém fica de fora do extrativismo determinado pela escolha do petróleo porquê matriz energética. E que está presente em todos os lugares e em diversas versões.

“Sabia que a capote do seu celular é feita de petróleo? Que, provavelmente, a minha sandália é feita de petróleo? Que o seu tênis é de petróleo? Os seus óculos, o seu boné?”, provoca.

Krenak foi o responsável homenageado da segunda edição do Festival Literário Internacional de Paracatu, que terminou no último domingo (1º). Traduzido para mais de 13 países e imortal pela Liceu Brasileira de Letras, ele afirmou que é preciso “ter verso em nossa experiência de luta”.

“Acho que cada um de nós deve despertar o seu poder interno e pensar porquê fazer: se vai ser produzindo mais conhecimento, se vai ser produzindo arte, se vai ser escrevendo, falando, desenhando, plantando bananeira. Tem gente que acha que a maneira de fazer isso é plantando floresta, agrofloresta; ou fazendo campanha, cuidando da chuva, protegendo a vida selvagem. Até ontem, as pessoas achavam que só os humanos pensavam. Hoje, a gente sabe que as árvores, os peixes, todo organização vivo tem ciência”, garante.

Literatura

Paracatu (MG), 31/08/2024 - Ailton Krenak na 2° edição do Festival Literário Internacional de Paracatu - Fliparacatu. Foto: Fliparacatu/Divulgação
Paracatu (MG), 31/08/2024 - Ailton Krenak na 2° edição do Festival Literário Internacional de Paracatu - Fliparacatu. Foto: Fliparacatu/Divulgação

Ailton Krenak na 2ª edição do Festival Literário Internacional de Paracatu. Foto: Fliparacatu/Divulgação

Em seu mais recente lançamento, “Kuján e os meninos sabidos”, Ailton Krenak escreve para as crianças. Ele explica que kuján, na língua krenak, significa tamanduá. E que o livro conta uma história da geração da humanidade para que as crianças tenham outra opção de porquê nós aparecemos na Terreno, além da versão de Adão e Eva.

Os meninos sabidos são dois heróis culturais, para quem o fundador ensina os artefatos, a pintura corporal, as cantigas. Ao grafar para as crianças, Krenak coloca a esperança em outras formas de viver no planeta, nos pequenos.

“A gente está exatamente pensando que ainda pode ter esperança em outras maneiras de habitar o mundo. E quem pode fazer isso serão as crianças, porque os adultos já estão todos manjados. Os adultos estão tarados por grana, por poder, por disputas”, argumenta.

Leitor, Krenak define o poeta Carlos Drummond de Andrade porquê seu escudo invisível. Ele diz que o poeta mineiro passou a vida avisando “que a povoado, a Itabira (MG) dele, tinha se transformado em um retrato na parede. Quer proferir, o pavimento que ele pisava ruiu”.

Citando o poema “O varão; as viagens”, escrito por Drummond em 1973, Krenak aponta que o que o está no poema – as viagens do varão para habitar outros planetas, a lua e o sol – pode ocorrer antes de o varão estar disposto a con-viver, porquê no verso final.

“A coisa mais simples da existência seria a gente habitar a Terreno só com o contentamento de conviver. Um camarada me disse, ‘ah! Krenak, mas se não houvesse essas coisas que a gente julga danosas, ruins, a gente ia chegar em lugares onde não ia ter zero. Você ia chegar não ia ter luz elétrica, não ia ter a internet, não ia ter o sege’. Eu falei ‘mas são essas coisas que estão comendo o nosso mundo’. Seria mais ou menos porquê você ir passear num jardim e reclamar que está faltando demônios lá”.

Meteoro

O ambientalista também cita a obra de Joca Reiners Terron, “A morte e o meteoro”, lançada em 2019. No livro, um mundo distópico em que uma tribo da Amazônia está prestes a desvanecer por motivo da devastação da floresta.

Krenak acredita que é porquê se a gente “estivesse vivendo na era moderna uma literatura de profecia”. Para ele, alguns autores, ao grafar, estão tomados por um sentimento tão poderoso que não estão mais fazendo literatura, mas profetizando, antecipando.

“Nós estamos num tempo onde as pessoas que são criativas, os poetas sempre foram chamados de antena, têm essa capacidade de verbalizar uma tragédia que a gente quer evitar. O sentido verdadeiro de uma literatura que expressa o seu tempo é exatamente mostrar para todo mundo o que eles não querem ver”, argumenta.

O ativista ainda acredita que a literatura pode ser um lugar da teorema e da procura por outras maneiras de conviver com a Terreno.   

“É imaginar a possibilidade de a gente habitar outros mundos sem transpor da Terreno. É dissemelhante do poema do Drummond, que o humano quer transpor da Terreno para ir para outro lugar. Quando ele fala con-viver, ele está dizendo que não vai ter que aprender a sustentar o balanço da canoa e segurar a vaga, viver cá. A gente vai ter que viver na Terreno, não tem outro lugar para o humano viver. O equipamento fisiológico que o humano tem, a nossa anatomia, só dá para viver na Terreno”, finaliza.

 

*Repórter viajou a invitação da organização do festival

Fonte EBC

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