No Carnaval de 2008, quando integrava o grupo Parangolé, Léo Santana ficou sem voz. “Era um dos maiores blocos de Salvador, de muita exigência, e eu não tinha experiência”, ele diz. “Os foliões não estavam felizes com a performance. Levei para o emocional e perdi a voz.”
Mais de 15 anos depois, o cantor não se esquece do incidente, mas não poderia estar mais distante dele. Léo se tornou um dos grandes do Carnaval baiano —o mais famoso representante da música que hoje predomina nas ruas de Salvador, o pagodão.
É também uma das principais atrações do Festival de Verão, que acontece neste término de semana na capital da Bahia, com Ivete Sangalo, Ludmilla, Alok, Ana Castela, BaianaSystem, Bell Marques, Daniela Mercury e Natirus, entre outros.
Naquela idade, Léo já tinha um punhado de sucessos, mas não era divulgado nacionalmente. Ele foi criado no bairro periférico Boa Vista do Lobato ouvindo de Michael Jackson a Phil Collins, passando pelo samba do Revelação, que o levou ao pandeiro. Foi tocando o instrumento que ele fez seu primeiro show, aos 12 anos.
“Me apaixonei por samba e pagode, mas era inevitável o pagodão baiano estar presente”, diz. “Eu e minha mana fazíamos coreografias do É o Tchan no espelho. Sou moleque de periferia, e cá o que predomina é pagodão e arrocha. Era a era de ouro do axé music, mas a gente não ouvia tanto na minha comunidade —tocava na TV e no rádio, mas se fosse vincular caixa de som, era a bagaceira do pagodão.”
Nos anos 1990, grupos do pagodão uma vez que É o Tchan foram postos sob o guarda-chuva do axé. Ainda que o estilo de Ivete Sangalo e Carlinhos Brown fosse plural, indo do samba reggae ao galope, a música que hoje desemboca em Léo já tinha características próprias.
O pagodão surgiu uma vez que uma versão mais rebolada do samba de roda do Recôncavo Baiano, com pandeiro e cavaquinho. Nascido em 1988, Léo viveu jovem o auge do Simetria do Samba, seduzido pela dança de Xanddy.
A margem já usava de maneira tímida um instrumento criado por Carlinhos Brown, a bacurinha, médio na transformação da sonoridade do pagodão promovida por Márcio Victor no Psirico, nos anos 2000. “Ele veio com essa teoria de bacurinha na rosto o tempo todo, rufando, fazendo as viradas uma vez que se fosse bateria. Influenciou muita gente”, diz o cantor.
Um desses grupos era o Parangolé, no qual Léo teve dificuldade de se encaixar. “Pagodart, Simetria e Oz Bambaz tinham mais a minha particularidade —dança, sensualidade, mexer e rebolar”, diz. “O Parangolé era mais balanço de hip-hop, de rua, movimentos de marra e [ficar] posturado. Sempre cantou sobre protesto, músicas direcionadas ao povo preto.”
Léo trabalhava numa barbearia, vendia frango assado na praia e cantava em pequenos grupos quando entrou no Parangolé. A margem vinha de um disco bem-sucedido, “A Verdade da Cidade”, mas com o novo vocalista ficou maior. Lançou o ao vivo “Dinastia Parangoleira” e emplacou os sucessos “Sou Favela” e “Desce a Madeira”.
Mas foi outra música que fez o Parangolé estourar no Brasil —”Rebolation”, criada por Léo e Nenel, fundador e um dos líderes do grupo. A teoria era pegar a febre da dança do psytrance, estilo de música eletrônica que era sucesso na idade, e inserir “naquela paragem de sensualidade, de rebolar, trazer a coisa para Bahia”.
Hit daquela temporada em todo o país, “Rebolation” quase ficou fora do disco que a margem mandou à gravadora Universal. “Eram 15 músicas, e ela foi a 15ª a entrar.”
“Não era para ser música de trabalho, mas confiamos na percepção [da gravadora]. Antes, a gente até fazia TV pátrio, mas não tinha agenda fora. Era mais Bahia, Sergipe e Pernambuco.”
Por motivo da música, diz Léo, ele foi “massacrado”. “Se as redes sociais fossem uma vez que são hoje, eu seria cancelado. A gente ouvia muito que ‘acabou o Parangolé’, ‘esse menino que entrou aí, que bosta’.”
Sob o comando de Léo, o Parangolé emplacou sucessos nos carnavais seguintes —em 2011, com “Tchubirabirom”, e em 2012, com “Madeira de Lei”. Até que o vocalista ficou grande demais e saiu da margem em 2014.
Em curso solo, ele virou a principal referência do pagodão para o Brasil. Fez isso expandindo sua sonoridade e emendando parcerias com ícones do sertanejo uma vez que Marília Mendonça e Jorge & Mateus, do piseiro (Nattan), axé (Ivete, Saulo Fernandes), pop e funk (Anitta e Ludmilla) e pagode (Thiaguinho, Ferrugem, Xande de Pilares), para reportar alguns.
O GG da Bahia, ou Gigante, seus apelidos, também se destaca pela presença de palco, consagrada no show “Dança da Santinha”. No Festival de Verão do ano pretérito, ele fez uma das apresentações mais prestigiadas, deixando a plateia suada de tanto dançar.
Foi com a rebolada lasciva, aliás, que ele fez de “Zona de Transe” o hit do Carnaval de 2023, além de sua tira mais tocada no streaming. A cantiga, um pagodão com elementos de bregadeira, bachata, um remendo de sax e sensualidade R&B, não era sua música de trabalho e só estourou depois que o cantor postou um vídeo dançando.
Por situações uma vez que essa, diz, hoje ele não aposta tudo numa única música para o Carnaval. Nascente ano, o álbum “Tem paGGodeiro Aí?” destaca duas faixas —”Êta Novinha” e “Surra de Toma”. Léo afirma que a atenção é dedicada a ter um repertório “na boca do povo”.
Ultimamente esse trabalho foi dificultado. Léo afirma que costumava buscar no que é mais tocado no streaming as músicas para criar seu show —mas abandonou a prática.
“Tem músicas ‘top 1’ que nunca ouvi na rua. Um tanto está inverídico. A música é a primeira do país e quando toco não tem resposta? É muito mais numerário do que números reais. Já alertei amigos de que peguei músicas deles muito ranqueadas e, quando toquei, não tive resposta. Pagou a posição, mas não chegou na rua.”
Hoje o som das ruas de Salvador é o gênero defendido por Léo, que ele diz suportar preconceito. “A discriminação vem desde sempre. É um som periférico, com ingressos muito baixos. As pessoas que acessam os paredões são de classe muito baixa. É um tanto notado nos detalhes —não estar em tal evento, o horário ser pior. Mas não me apego a isso.”
Segmento das críticas ao pagodão têm a ver com o texto de algumas letras, que desrespeitariam as mulheres. Léo diz que, nesses casos, muda as palavras.
“Se for uma música do nosso gênero, que seja assim [misógina] e esteja sendo muito tocada nas comunidades, eu incluo no show, mas de forma dissemelhante. São muitas horas no trio, temos que tocar o que o povo está ouvindo.”
Tanto por pedir ao público para “fazer o L”, sinal do presidente Lula (PT), em seus shows, quanto por seguir Jair Bolsonaro (PL) nas redes sociais, Léo já foi tido uma vez que apoiador de ambos. Ele afirma que fazia o “L”, referência ao seu nome, antes de o gesto ter conotação política, e nega simpatia ao ex-presidente.
“Longe de mim me associar a político”, diz. “Sempre tive zelo com minhas opiniões. Nas redes, é quebradiço falar sobre tudo. Prefiro conversar com familiares e amigos.”
Léo afirma que até tem vontade de usar sua visibilidade para se posicionar, mas ficaria num “incêndio cruzado”. “Não tem uma vez que ter opinião no nosso país. Se você é contra um, apoia o outro, e vice-versa. Querem que você esteja do lados deles —ou é colega ou inimigo.”
“Não sou de direita nem de esquerda, defendo um país melhor. Sou brasiliano e quero que as pessoas vivam muito e em tranquilidade. Quem vai fazer isso, é fulano? Logo é ele. Mas se não faz muito, por que estribar? Sou ‘pelo perceptível’. Se fugir disso, irei contra as diretrizes que meus pais me ensinaram. Visível é perceptível e inverídico é inverídico.”