O presidente administrativo da Associação Pátrio das Etnias Ciganas (Anec), Wanderley da Rocha, lidera um trabalho para que os direitos de seu povo tenham visibilidade no Congresso Pátrio e em outras esferas de poder no Estado Brasílico. Membro da etnia calon, um dos três grupos do povo romani no Brasil, ele tenta convencer mais parlamentares a se sensibilizarem por suas bandeiras, uma vez que a produção de dados oficiais, a aprovação do Regime dos Povos Ciganos e a proteção contra a violência e o ódio.
“Sabemos que, na luta dos povos ciganos, hoje, no Brasil, não estamos pedindo zero a ninguém. Nós estamos cobrando o recta de ter direitos. Uma vez que domínio, [os políticos] eles têm que fazer o que é manifesto”, disse em entrevista à Dependência Brasil.
Rocha fundou a Anec, com o objetivo de reunir roma [como também são chamadas as pessoas do povo romani] de todo o país em uma entidade. Atualmente, a associação chega a mais de 30 grupos em 20 estados, incluindo as três etnias ─ rom, sinti e calon. O alagoano destaca que as três etnias não tinham, até pouco tempo detrás, tanto vínculo entre si, mas decidiram se unir para se proteger a partir da coesão.
“Sabemos que nós temos várias demandas, mas entendemos que a luta é só uma. Graças a Deus, tanto a etnia calon uma vez que os sinti, de uns anos para cá, fizeram um harmonia, entenderam que o Regime [dos Povos Ciganos] valeria agora para a nossa geração presente e a vindoura”, comemora.
Regime dos Povos Ciganos
Apresentado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), o Projeto de Lei nº 1387/22 cria o regimento a que Rocha se refere. A proposta já foi aprovada na Morada, mas estacionou na Câmara dos Deputados.
O debate sobre o regimento no plenário do Senado Federalista foi uma oportunidade para dar visibilidade a denúncias antigas do povo romani, uma vez que o racismo e discriminação, também chamada de romafobia ou ciganofobia.
“Nesse dia, eles pediram a vocábulo. [Disseram:] ‘Paim, nós somos praticamente invisíveis. Queremos o Regime”, recordou o parlamentar à Dependência Brasil. “O Regime é um passo importantíssimo na promoção de direitos e na valorização da cultura das comunidades ciganas no Brasil, é uma iniciativa vital para esse setor”, sintetiza.
Paim concorda com a percepção de que o povo romani é, historicamente, níveo de discriminação, marginalização e violação de direitos. Outro progresso que a aprovação do texto poderia trazer, destaca o senador, diz reverência à participação das comunidades na formulação das políticas públicas.
Participação social
Para a fundadora e presidenta da Associação Internacional Maylê Sara Kalí (AMSK), Elisa Costa, o governo federalista tem orientado de forma problemática o delineamento do Projecto Pátrio de Política para Povos Ciganos, instituído em agosto de 2024, pois teria falhado ao não escutar seus beneficiários extensamente.
Ela questiona, por exemplo, que, entre as 20 entidades não governamentais que têm assento no Juízo Pátrio de Promoção da Paridade Racial, 18 representam vertentes do movimento preto, e unicamente uma, os roma, que é a Associação Pátrio das Mulheres Ciganas. A outra instituição que é membro do juízo é a Médio Única dos Trabalhadores (CUT).
“Nossa luta pela consulta pública [no Plano Nacional de Política para Povos Ciganos] é porque o governo não tem noção de quem somos”, pontua. “A gente continuou sem dados, temos hoje microdados de estudo. Se você pensar, temos uma população em situação de grande vulnerabilidade social”, diz a líder da AMSK, que estima que a Bahia tem a maior população romani do Brasil.
A diretora de Políticas para Quilombolas e Ciganos, do Ministério da Paridade Racial (MIR), Paula Balduino de Melo, afirma que a representação dos ciganos se dá pelo Comitê Gestor do Projecto Pátrio de Política para Povos Ciganos. O comitê tomou posse no final do mês pretérito. Foram eleitas, por meio de votação, figuras uma vez que Wanderley da Rocha, entrevistado nesta reportagem; Rosecler Winter, porta-voz dos sinti; e a calin ─ termo para nomear mulheres e meninas do povo calon ─ Nardi Terezinha Casanova. Também foi eleito o líder dos rom Cláudio Domingos Iovanovitchi, porém ele morreu em março deste ano.
Sem dados
A falta de dados oficiais básicos, uma vez que a própria narração populacional, é uma das críticas históricas das lideranças dos romani ao poder público. Segundo os ativistas, um dos argumentos já ouvidos é o de que a itinerância de alguns grupos dificulta a apuração dos dados. Apesar disso, a veras é que o nomadismo não é uma particularidade inerente a todas as comunidades ciganas, e boa segmento delas se mantém fixa em um mesmo endereço.
“Agora, nós não temos dados sobre qual é a maior concentração no país, de uma forma universal. E não ter um levantamento solene já é uma forma, inclusive, reproduzida e reconhecida por nós até no contexto internacional, de ampliação do anticiganismo, da romafobia”, afirma Elisa Costa, que também é diretora do escritório da International Romani Union (IRU) no Brasil.
Na falta de uma base de dados, a AMSK desagrega dados do Cadastro Único (CadÚnico) e do programa Bolsa Família para mensurar a população romani no país. A entidade verifica o totalidade de pessoas que, mediante autodeclaração, dizem pertencer a Grupos Populacionais Tradicionais e Específicos (GPTE), com marcação “família cigana” em situação de vulnerabilidade social.
Também no final de maio deste ano, foi realizado em Brasília um seminário sobre o Mapeamento Inicial de Famílias Ciganas, Rotas e Redes de Chegada a Políticas Públicas, feito pelo MIR. A pesquisa também usou o CADÚnico, uma vez que a AMSK, somado a dados das pesquisas municipais/estaduais do Instituto Brasílico de Geografia e Estatística (IBGE) (Munic e Estadic), da Secretaria Próprio de Cultura e Artes Integradas (Secai) e do Sistema Único de Saúde (SUS), além de coletas de dados feitas em visitas a ranchos e acampamentos ciganos.
A diretora Paula Balduino de Melo diz que o IBGE participou da apuração dos dados do mapeamento. “Aliás, estamos firmando um harmonia de cooperação técnica entre o MIR e o IBGE, que prevê a produção de dados relacionados aos povos ciganos”, antecipou, acrescentando que, caso exista um Recenseamento específico, considera eventuais contribuições do instituto essenciais e que a pasta tem procurado salvaguardar as metas do PNPC, mesmo com cortes orçamentários.
Questionado sobre as críticas dos militantes roma, o Instituto Brasílico de Geografia e Estatística (IBGE) não repondeu à reportagem. O problema da falta de pesquisas do instituto sobre esse tema também já foi indigitado pelo Ministério Público Federalista (MPF), que fez uma recomendação pedindo a inclusão do povo romani no último Recenseamento Demográfico.
Ministério Público Federalista
A atuação do Ministério Público na cobrança de maior visibilidade para o povo romani, uma vez que no caso do IBGE, é um sinal de omissões do Estado nesse trabalho. Essa é a avaliação do subprocurador-geral da República Luciano Mariz Maia, que, em sua estação de procurador, foi um coligado na luta pelos direitos dessa população.
“Não havendo uma dependência solene, não havendo uma Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas], uma Instalação Cultural Palmares para os ciganos, nós tivemos que edificar informação antropológica sobre os grupos ciganos, informação sociológica também e um aprofundamento jurídico. Por isso, o MPF terminou se tornando, no Brasil, a instituição com o maior conjunto de informações antropológicas e jurídicas sobre os ciganos no país. De indumentária, foi uma mudança muito grande”, ressalta.
Mariz Maia começou a atuar nesse contextura em 1991, depois de lucrar visibilidade com um projeto em obséquio dos indígenas potiguara, que vivem no estado em que ele atuava, a Paraíba, e também no Ceará, em Pernambuco e no Rio Grande do Setentrião.
“Houve uma grande repercussão e isso fez com que o senador Antonio Mariz, que, há muitos anos, defendia os ciganos, identificasse a possibilidade de o Ministério Público cuidar também dos ciganos, enquanto minoria. A experiência com os indígenas vinha de muito tempo já, mas a experiência com os ciganos não existia”, comenta Mariz Maia, que também leciona na Universidade Federalista da Paraíba (UFPB) e foi recentemente eleito para integrar o Subcomitê de Prevenção à Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (SPT), da Organização das Nações Unidas (ONU).
“O senador disse assim: tem quem cuide de índio, tem quem cuide de preto, tem que cuide de homossexual, mas não tem quem cuide dos ciganos”, lembra o subprocurador-geral, que, portanto, perguntou o que teria de ser feito. “Ele disse: ‘vá você saber, que aí irá identificar’. Fui, conheci a comunidade dos ciganos em Sousa (PB), em agosto de 1991 e, desde portanto, temos caminhado juntos”.
No sertão paraibano, a comunidade de Sousa, dos calon, é uma das maiores da América Latina e contou com o suporte do Ministério Público Federalista (MPF) para a regularização fundiária. Em abril de 2021, o órgão ajuizou uma ação para que fosse declarada a usucapião coletiva de imóveis de quatro comunidades ciganas, em Sousa, distante 432 quilômetros da capital.
De harmonia com o MPF, 522 famílias ciganas tinham fixado residência lá, há 40 anos, “por questões de sobrevivência”. Eram, ao todo, 1.845 pessoas, a maior comunidade cigana geograficamente fixada do Nordeste brasílico, e a espaço que pleiteavam tinha 171.319,08 m² e fazia segmento de um território maior reivindicado.
Ter desempenhado função semelhante em prol dos indígenas potiguaras e, seguidamente, dos ciganos demonstrou a Mariz Maia que os dois enfrentam dificuldades diferentes apesar de algumas semelhanças, pois cada minoria étnica tem suas particularidades.
“Enquanto indígenas e quilombolas são vinculados à terreno, e a terreno recebe deles a identidade e também dá a eles a identidade, os ciganos são grupos étnicos que constroem suas fronteiras identitárias por outras razões. Pelo modo de se expressar, eles têm sua língua própria, pelo modo de edificar seus hábitos e se organizarem coletivamente, de manterem, de maneira universal e muito intensa, os casamentos dentro da comunidade”, explica.
Ao confrontar os contextos, o docente paraibano qualifica uma vez que “muito mais judicializada” a atuação do MPF no caso dos ciganos. “Nossa atuação acaba sendo de pronunciação, de coordenação, de um empoderamento das lideranças locais, fazendo com que possamos mediar contatos com prefeituras, secretarias de estado, lideranças governamentais dos vários níveis, para que os ciganos possam localizar suas demandas. Nós damos o respaldo para apresentar a base jurídica dessas demandas e poderem se transmutar em políticas públicas”, detalha Mariz Maia.
Multiplicidade e violência
Também da Paraíba, o procurador da República José Godoy dá ininterrupção ao trabalho de amparar as queixas e necessidades do povo romani, em próprio, dos calon. Em 2017, fez uma viagem para saber as comunidades de Sousa e Patos, que ficam a três horas de coche uma da outra. Na oportunidade, foi apresentado por Mariz Maia e esteve em Condado, que fica entre as duas cidades.
Godoy concorda que o indumentária de os povos ciganos serem atendidos pelo MPF já expõe o vazio deixado pelas gestões municipais e estaduais.
“Isso já é sintomático, porque os órgãos locais não os atendem, a não ser que a gente chame. A Defensoria Pública, nos casos em que eles são vítimas, e infelizmente, até nisso tem dificuldade de fazer a resguardo deles, quando são criminalizados nas suas atuações. Logo, a atuação do MPF já demonstra que não têm entrada a outros órgãos, que deveriam fazer seu papel”.
Com uma rede de contatos que vai além de seu estado, ele se mantém atualizado sobre o que passa em comunidades de todo o país. “Acho que os povos ciganos, no Brasil, têm uma heterogeneidade muito grande. Não só de moradia, mas diria um pouco quanto a se organizar e até as condições sociais. Cá no Nordeste, há ciganos muito pobres. Na Bahia, nem tanto, há povos ciganos com uma requisito financeira não tão vulnerável. Em São Paulo, tem alguns com requisito financeira até interessante. Logo, vai ter uma variação”, diz ele.
“A única coisa que os une realmente é o preconceito e a violência policial contra eles. Eles sofrem muito preconceito, mais do que qualquer outro [grupo minorizado] com o qual eu tenha trabalhado. Nenhum chega ao nível de preconceito que os ciganos sofrem. E violência policial. Os ciganos da Bahia não são pobres, mas sofreram um processo de assassínio brutal pela polícia. Cá na Paraíba, tem histórico de violências terríveis. Em todos os espaços, eles são muito violentados”, assinala.
Na Bahia, os roma foram vítimas recorrentes de crimes nos últimos anos. Em 2021, uma chacina deixou oito vítimas, executadas por policiais. Em 2022, pelo menos cinco ciganos foram assassinados no estado, e, em 2023, seis pessoas foram mortas dentro de morada, das quais quatro eram do povo romani.
Perseguição por poderes locais
Godoy acredita que essa atmosfera de perseguição e ódio fez, há qualquer tempo, com que muitos ciganos quisessem passar despercebidos por não ciganos. Nos últimos anos, entretanto, o procurador acredita que eles intensificaram a luta para serem atores e sujeitos de direitos e não objetos dos preconceitos e das violências.
Para Godoy, os povos ciganos estão legalmente ainda mais desamparados do que os indígenas e os quilombolas.
“Os povos ciganos ficam à margem do Recta, à margem da cidadania. Há cidades, muitas cidades, que têm legislação contra cigano. É surreal. É inconstitucional? É, mas a força dos poderes locais atua contra eles.”
Em 2023, o procurador interveio ao saber que a prefeitura de São João do Rio do Peixe (PB), de gestão de Luiz Claudino de Roble Florêncio (PSB) e Regilanio Geraldo de Morais (PSB), havia expulsado ciganos da cidade. Em 2024, Florêncio e Morais, mais conhecidos uma vez que Luiz Claudino e Regis Morais, foram reeleitos no primeiro vez, com 82,79% dos votos, e continuam no comando da cidade. A Dependência Brasil procurou a prefeitura municipal de São João do Rio do Peixe, mas não teve retorno até o fechamento desta reportagem.
Alguns entrevistados confirmaram à reportagem a existência de leis contra os roma em certas localidades, mas tiveram receio de que a divulgação desses municípios aumentasse o número de apoiadores dessas medidas.