Literatura Como O Salto Para Escrever Com Os Medos Do

Literatura como o salto para escrever com os medos do ser – 30/01/2024 – Veny Santos

Celebridades Cultura

Enquanto a chuva desaba do lado de fora, em seu quarto que só lhe cabe as ideias entre paredes apertadas sob o teto insignificante da mente, o repórter se pergunta se a requisito para muito redigir é o mal viver.

Se, realmente, porquê outros escritores e escritoras, jornalistas e críticos disseram por vezes: é o sofrimento elemento potente quando se trata de dar à escrita originalidade e profundidade, permitindo que o leitor integre uma atmosfera de vulnerabilidade que oscila entre a sutileza de tirar os pés da razão e o peso de firmá-los quando a verdade mostra que dela não se passa.

Além desta questão agulhando sua mente, também paira a preocupação com o telhado. A tempestade é o que é —potente. Se iniciar a entrar chuva em suas ideias, conseguirá não se molhar? Um temor —de tantos.

Quando enchia cadernos, o hoje repórter ontem era exclusivamente alguém que não sentia sabor em falar demais, relatar demais, oralizar desabafos com os outros. Próximos, distantes, medianos em suas relevâncias, mas sempre outros.

Ao misturar desilusões a anseios por quadros que retratassem o que via e sentia, exclusivamente depositava nas folhas cores todas dos sentimentos que não compreendia. Juntas formavam o breu.

Daquela complicada relação entre o pensamento que se manifesta no físico do corpo, apertando o peito, gelando a boca do estômago, secando a da face, torcendo a goela porquê se roupa lavada fosse e a falta de conhecimento sobre as dores psíquicas —as chagas da mente—, surgiam composições contando para si mesmo tudo a saudação do inevitável sentir.

Estendidas as ideias entre linhas, penduradas no varal das certezas improvisadas, ventavam sem compreender, ainda, as dores do secar. Só não queriam permanecer molhadas.

A liberdade de redigir sem a pretensão de ser lido se assemelhava ao saltar sem peso por crer que a queda era macia antes da colisão, tal qual o flutuar a preceder os pés no soalho. Redigir sem ser lido, alguma coisa porquê o caminhar até o sonho, sem se preocupar se, ao chegar, pesadelo teria. Pesadelo seria.

O que sempre buscou, talvez, o repórter em seu quarto, era uma forma de entender porquê são paridas as tempestades. A procura lhe rendeu mais um livro que já começou a ser redigido, sem teoria de quando será concluído. É o tal saltar sem peso, no sentido contrário, indo em direção ao superior nublado que ainda oprime o elucubrar tanto quanto o temor de goteira.

A todo momento, capta-se literatura. Certas vezes parece até mania. A tudo ler, interpretar, assimilar, transformar em alguma pergunta a ser decifrada em texto ou resposta que possa ser dissecada até que, pelo favor da incerteza, fuja à peroração e se mantenha eternamente investigada. Eternamente em salto contrário que, em vez de desabar, parece trepar.

Basta um simples diálogo de filme para despertar no repórter sabor qualquer sem sabor verdadeiro no palato do imaginário. Azedume, amargura ou a euforia desmedida que faz perder a mão quanto ao tanto de epifanias que se pode ampliar a um único momento. Vezes em que o repórter perde o sabor.

“No que você está trabalhado agora?”, perguntou um dos homens sentados à mesa. “Eu sou o editor de ficção para uma revista literária”, respondeu o outro que, recentemente, havia publicado um livro de grande sucesso.

“Mas qual é o seu próximo livro?”, continuou o primeiro. “Não estou planejando redigir outro livro”, respondeu o segundo.

Veio logo certa indignação da segmento do perquisidor: “Por que não? Você tem sido um grande sucesso”.

E a resposta veio, dissecada porquê esperava pelo cá repórter, ali feito de testemunha da prosa. “Não, não estou interessado em me ver porquê repórter. Eu só gostei de redigir leste livro [o de sucesso] porque naquele tempo eu era completamente anônimo e as pessoas não sabiam que eu existia. Logo me senti livre”.

Esta conversa consta no filme “Passagens”, dirigido por Ira Sachs, e lançado em 2023. Interessante obra. Um simples diálogo para o testemunha, um salto para o repórter.

A chuva parou. Não teve goteira. Mesmo assim escreveu.


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Folha

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