Lourenço & Lourival, Dupla Mais Longeva, Completa 65 Anos

Lourenço & Lourival, dupla mais longeva, completa 65 anos – 16/01/2025 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Lourenço, 87, e Lourival, 85, são irmãos, mas quando falam parecem uma pessoa só. Enquanto um discursa, o outro articula o complemento da frase num ritmo em que é até difícil prescrever quem disse o quê.

É um entrosamento maturado durante toda a vida, mais publicado dos duetos agudos e afinados dos sucessos sertanejos que deram a eles a cognome de “vozes de cristal”. Em 2025, eles completam 65 anos de curso, ostentando o título de dupla sertaneja há mais tempo em atividade.

É dessa posição que eles veem o sertanejo atual. “A música sertaneja tem história, mas essas músicas de hoje não têm história”, diz Lourival, ao que o irmão acrescenta: “Sertanejo tem que ser em dueto, primeira e segunda voz. Hoje, é uma voz só. Mas cada um faz o seu, cada um tem seu estilo.”

Muito-humorados, os irmãos respeitam a produção contemporânea do gênero. Dizem que, se os artistas têm público, portanto estão no caminho manifesto. Isso não significa que eles gostem dos sucessos atuais.

“Cada um tem seu estilo. Tem quem goste. Comprar, eu não compro”, afirma Lourival.

A opinião de Lourenço sobre as letras de ostentação é quase um juízo. “Ter verba é bom, mas não é bom mostrar, né? Se permanecer quieto, ninguém mexe com a gente. Não é bom se mostrar muito.”

Hoje em situação financeira confortável, os irmãos moram no mesmo prédio em Ribeirão Preto, região onde nasceram no interno de São Paulo, na zona rústico. “Nosso dinheirinho nunca falta, graças a Deus. Hoje a gente está muito, já nem precisa trabalhar mais, mas a gente gosta de trovar”, diz Lourenço.

Em plena atividade, a dupla é celebrada uma vez que remanescente da música sertaneja de raiz, baluarte de uma era arcaica deste gênero em uniforme transformação. Eles não escondem a felicidade de terem participado recentemente do programa “Viver Sertanejo”, comandado por Daniel na TV Orbe.

Também se derretem quando lembram das apresentações na última Sarau de Peão de Boiadeiro, em Barretos, palco em que nunca haviam subido. Lourenço & Lourival foram convidados em dois shows —Edson & Hudson, para menos gente, e César Menotti & Fabiano, para uma poviléu.

“Já imaginou? Tinha umas 50 ou 60 milénio pessoas. Quando nos anunciaram, tremeu até o solo. Na nossa quadra, era difícil, o circo não rendia que nem hoje, os cantores eram todos pobrezinhos”, eles afirmam.

De prosápia italiana, os irmãos foram criados no mato. “Nós mudamos muito de rancho”, diz Lourenço. “O pai era meio nervoso. Se falasse alguma coisa que não gostasse, ele já dizia para ir embora. As galinhas já eram acostumadas, já cruzavam as perninhas para amarrar, botar no bambu e nós íamos passar o mundo.”

Na puerícia, eles tocavam “uma violinha” e ouviam Zico & Zeca e Tonico & Tinoco no radinho de rima. Pré-adolescentes, começaram a trovar. Ouviram de Barroso, locutor de rádio em Ribeirão Preto e cantor em dupla com Barreto, que deveriam ir a São Paulo em procura de uma curso.

“Serviço de roça era muito pesado, nós fomos para São Paulo porque era ligeiro o serviço”, diz Lourival, aos risos. “Nós éramos pequenininhos, fraquinhos.”

Lourenço foi até o Rio de Janeiro patentear o nome da dupla e arrumou um serviço uma vez que metalúrgico na capital paulista. Os irmãos cantavam em programas de rádio e se apresentavam em circos, onde trabalharam por décadas tocando e interpretando dramas uma vez que “Moreninha do Convento” e “O Bandido da Luz Vermelha”.

Em 1960, fizeram as primeiras gravações, um disco de 78 rotações, formato em que trabalharam até 1967, quando lançaram o primeiro LP, “As Vozes de Cristal”. Mas foi só em 1971 que eles protagonizaram uma viradela não só em suas carreiras, uma vez que em toda a música sertaneja, com a música “Porquê Eu Chorei”.

Muito influenciada por Roberto Carlos, o brega e a Jovem Guarda, a fita romântica quebrou uma tradição da música caipira de só gravar modões de viola. “Abriu o caminho para o sertanejo”, diz Lourival. “O pessoal caçoava da gente. Quem gostava mesmo era só aquele povo da roça”, acrescenta o irmão. “Hoje, não. Até o povo da cidade gosta. Naquele tempo, eram só os caipiras.”

A dupla deu o que Lourenço labareda de “uma modificada” no estilo caipira que mantinham até ali. “Passamos a falar o português correto —porque falar o português manifesto é difícil. Mas nós falamos a língua do povo.”

Em muitas ocasiões, músicas já tinham sido gravadas por outros intérpretes só ficaram populares com as vozes de cristal. “Cada um tem um jeito de trovar. O nosso jeito é trovar para cima”, diz Lourival. Para o irmão, é um tanto que surgiu naturalmente. “Nós não temos grave, se for trovar assim não dá manifesto. Eu tenho o agudo, portanto quando a gente termina [um verso], levar para cima fica melhor.”

Essa capacidade de jogar luz em canções esquecidas permanece até hoje. Há menos de dois anos, eles regravaram “Se Ainda Existe Paixão”, uma elaboração de Raul Seixas, já gravada por Balthazar —e por eles mesmos, há 40 anos—, sem muito sucesso. Só no Spotify, a novidade versão já tem mais de 3 milhões de reproduções.

Depois de “Porquê Eu Chorei”, a dupla não parou mais. Em seus mais de 50 discos lançados, emplacou uma série de sucessos sem nunca largar o estilo caipira mais tradicional. Entre suas gravações mais conhecidas estão “Moçoila da Lugarejo”, “Os Três Boiadeiros Japoneses”, “O Telefone Chora” e “Franguinho na Panela”.

A última delas narra a rotina de um trabalhador do campo, que às vezes passa inópia, tem que almoçar pão com mortadela ou farinha com ovo —que “desce sequioso na goela”. A dificuldade compensa porque, diz a letra, a mulher e os filhos têm frango na panela.

Não foi exatamente a rotina de Lourenço & Lourival, que fizeram o caminho contrário —foram do campo à metrópole e depois de estabelecidos levaram o pai e a família a São Paulo. Mas a humildade moradia com a verso. Para os irmãos, que dizem nunca ter procrastinado um show, zero é mais importante que reverência ao público.

O sigilo para manter as vozes potentes, eles afirmam, é “não fazer extravagância”. “Acabou de trovar? Bebe um refrigerante e vai dormir, não faz perdão. Tem gente que canta e fuma três maços de cigarro por dia, bebe pinga, conhaque. Isso estraga a voz. E tem a perdão de Deus. Não se cai uma folha se não for por ele”, diz Lourenço.

Trovar, diz Lourival, todo mundo canta. “Quero ver porfiar cantando, até permanecer velhinho, com a mesma voz.”

Folha

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