Maria zilda bethlem: globo ainda lucra com meus sucessos

Maria Zilda Bethlem: Globo ainda lucra com meus sucessos – 02/06/2025 – Televisão

Celebridades Cultura

São Paulo

Maria Zilda Bethlem, 73, esteve presente em alguns dos maiores sucessos da teledramaturgia brasileira. Teve personagens de destaque em “Guerra dos Sexos” (1983), “Vereda Tropical” (1984), “Selva de Pedra” (1986), “Bebê a Bordo” (1988), “Top Model” (1989), “Vamp” (1991) e “Por Paixão” (1997), para permanecer em alguns títulos de sua vasta curso.

Fora da Mundo desde 2016, quando fez sua última romance (“Êta Mundo Bom”), a atriz agora trava uma guerra judicial contra a emissora. Uma vez que antecipou a pilar Outro Meato em outubro de 2024, ela entrou com uma ação pedindo que fossem revistos os valores que ela recebe pelas reprises e vendas das novelas em que atuou (a emissora venceu na primeira instância, mas cabe recurso).

Depois a Mundo acusá-la no processo de querer “enriquecer ilicitamente”, Maria Zilda falou ao F5 para dar sua versão dos fatos e explicar o que a motivou a tomar a iniciativa de processar a empresa em que trabalhou por mais de 40 anos e que considerava ser a sua lar.

“O que a Mundo faz é se estribar na força dos contratos para perpetuar uma lógica de apropriação indevida: ela se apossou dos meus sucessos antigos e segue lucrando com eles”, afirma ela, que aponta que na quadra em que gravou seus maiores sucessos não havia ainda streaming ou TV paga nos moldes que conhecemos hoje.

Em sua resguardo, a Mundo argumentou que as vendas e reexibições estavam previstas em todos os contratos de trabalho assinados pela atriz. A empresa também afirmou que sempre apresentou os recibos de pagamentos que fez a ela, inclusive o que está anexado ao processo, que mostra a soma de R$ 218 milénio por reprises que foram ao ar entre 2018 e 2024.

Maria Zilda, no entanto, quer uma explicação sobre os valores. Segundo a atriz, uma de suas principais motivações é que a Justiça estabeleça parâmetros para que os artistas estejam protegidos nesse novo cenário. “Não estou lutando só pelo que me é devido —mas para que as próximas gerações de artistas não sejam tratadas uma vez que meros fornecedores de material bruto para exploração ilimitada”, avalia.

Na entrevista, ela diz ainda que não teme retaliação por segmento da Mundo ou do mercado, por considerar que seu capítulo na emissora está encerrado. No entanto, ela diz que muitos colegas não se posicionaram sobre o ponto justamente por temor. Confira inferior a entrevista.

Por que decidiu entrar com o processo contra a Mundo? Quando começou a pensar sobre o ponto e quanto tempo maturou a teoria até entrar com a ação?

Decidi entrar com o processo quando percebi que, ao longo dos anos, as obras que ajudei a edificar —com minha versão, meu corpo, minha voz— estavam sendo reexibidas, comercializadas e exploradas sem que eu sequer soubesse uma vez que, onde e quanto. A teoria não surgiu de um dia para o outro; foi o resultado de um longo incômodo, de conversas com colegas, de reflexões sobre o reverência à nossa profissão. Maturou, sobretudo, quando compreendi que esse não é só um recta meu.

A Mundo diz que os contratos já previam reprises e vendas. Por que, na sua visão, eles precisam ser revistos?

Não existia streaming nem TV paga nos moldes atuais. Não havia cláusulas prevendo que uma romance estaria disponível para consumo inacabável, on demand, por milhões de pessoas, a qualquer hora, para sempre. Ou por outra, a ação trata sobretudo das novelas gravadas e transmitidas durante a vigência da lei nº 6.533/78, que proibia a cessão perpétua de direitos conexos e determinava remuneração suplementar ao tradutor a cada novidade exibição ou exploração de uma obra. O que a Mundo faz é se estribar na força dos contratos para perpetuar uma lógica de apropriação indevida: ela se apossou dos meus sucessos antigos e segue lucrando com eles.

A questão dos direitos conexos sempre foi complexa. A Mundo explicava um tanto sobre o ponto aos atores de seu elenco antes do momento da assinatura?

Não. Só muito mais tarde, com estudo, orientação jurídica e diálogo com colegas, é que percebi que existiam direitos sendo sistematicamente desrespeitados.

Com o surgimento da TV paga e do streaming, os contratos mudaram de alguma forma? Percebeu qualquer tipo de atualização nos últimos trabalhos que fez na emissora (quando esses players já existiam)?

Meus trabalhos foram realizados antes do surgimento do streaming. Quando eu soube que novelas em que atuei estavam disponíveis no Globoplay, para exibição ilimitada, fiquei surpresa: não fui comunicada, tampouco convidada a discutir a remuneração.

Em outras empresas com as quais já assinou contratos, os modelos eram parecidos ou havia muitas diferenças com relação ao que a Mundo praticava?

Eu nunca trabalhei para outra emissora, por fidelidade à Mundo, que considerava ser a minha lar. Mas é importante expressar: a força econômica da Mundo moldou o padrão de toda a indústria.

A própria Justiça ainda não tem jurisprudência clara para a questão que você está levantando, os resultados vêm variando muito em ações isoladas. Acredita que, com essa ação, pode ser que passemos a ter um tanto mais consolidado nesse sentido?

Espero que sim. Esse é um dos maiores motores da minha ação: contribuir para solidificar um entendimento jurídico que proteja os artistas diante desse novo cenário tecnológico e mercantil. E fico muito feliz em ver que esse debate não está só no meu processo. Acabo de saber que o Supremo Tribunal Federalista vai julgar questão similar —sobre o recta de fiscalização da exploração econômica das obras nas plataformas de streaming— num caso movido pelo Roberto Carlos e pelo espólio do Erasmo Carlos. Ou seja: é um tema que não atinge só a mim, mas todos os artistas brasileiros. O que o Supremo sentenciar valerá para todos os processos do país. Isso mostra uma vez que a nossa luta é justa, necessária e, supra de tudo, urgente. Não estou lutando só pelo que me é devido, mas para que as próximas gerações de artistas não sejam tratadas uma vez que meros fornecedores de material bruto para exploração ilimitada.

O processo teve base dos seus colegas? Que tipo de reação tem ouvido de atores que também passaram pela Mundo? Acredita que a empresa poderá ser processada por mais pessoas pelo mesmo motivo?

Sim, tenho recebido manifestações de base públicas e privadas. Muitos colegas ainda têm temor de se posicionar, compreensivelmente, pela força que a Mundo exerce no mercado. Só não estou sozinha porque tenho meus advogados.

Teme qualquer tipo de retaliação por segmento da Mundo, uma vez que não ser mais chamada para trabalhos na emissora? E do mercado uma vez que um todo?

Sinceramente? Não. Acredito que o meu tempo de Mundo foi suficiente, tempo no qual fiz inúmeros trabalhos de sucesso. Hoje, não temo mais zero. Temo, sim, que artistas continuem sendo calados pelo temor e pela subordinação. Tenho certeza de que estou certa: lutar pela minha pundonor, pelos meus direitos, por reverência e pela história de 40 anos de trabalho difícil, legado que deixarei para meus filhos.

Quer alongar um tanto?

Agradeço pela oportunidade de responder e pergunto: enfim, quem está enriquecendo ilicitamente?

Folha

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