'meu Melhor Amigo Fez Deepfake Pornô Contra Mim' 10/02/2025

‘Meu melhor amigo fez deepfake pornô contra mim’ – 10/02/2025 – Tec

Tecnologia

Aviso: Esta reportagem contém linguagem agressiva e descrições de violência sexual

Era uma noite quente de fevereiro quando uma mensagem ameaçadora apareceu na caixa de ingressão de Hannah Grundy, que vive em Sydney, na Austrália.

“Vou continuar a enviar e-mails, porque acho que isso merece a sua atenção”, escreveu o remetente anônimo. Na mensagem, havia um link e um aviso em negrito: “Contém material perturbador”. Ela hesitou por um momento, pois temia que fosse um golpe.

Mas a verdade era muito pior. O link continha páginas e mais páginas de pornografia falsa que retratavam Hannah, junto com fantasias detalhadas de estupro e ameaças violentas contra ela.

“Você está amarrada”, cita Hanna, ao lembrar um dos trechos da descrição. “Você parece assustada. Você tem lágrimas nos olhos. Você está em uma gaiola”, continua ela.

Algumas imagens traziam o nome completo de Hannah. O usuário do Instagram dela foi publicado, assim porquê o bairro em que ela morava.Mais tarde, ela descobriria que até seu número de telefone havia sido divulgado.

Esse e-mail deu início a uma saga que Hannah compara a um filme. Ela teve que se tornar a sua própria detetive, ao desenredar uma traição repugnante de alguém próximo a ela.

O caso mudou a vida de Hannah —e até os padrões da legislação australiana.

‘Puro choque’

A página da web era chamada de “A Devastação de Hannah”.

No topo, havia uma enquete onde centenas de pessoas votaram sobre as formas cruéis que preferiam desmandar dela. Inferior, havia uma sequência com mais de 600 fotos com o rosto de Hannah. Entre as imagens, apareciam ameaças assustadoras.

“Estou me aproximando dessa vagabunda”, dizia o pôster principal.

“Quero me esconder na moradia dela e esperar até que ela esteja sozinha, agarrá-la por trás e sentir as tentativas de luta dela.”

O incidente ocorreu há três anos, mas a professora de 35 anos se lembra muito do “puro choque” que sentiu quando ela e seu parceiro Kris Ventura, de 33 anos, abriram a página pela primeira vez.

“Você se sente imediatamente em transe”, diz Hannah, com os olhos arregalados enquanto segura uma caneca de chá de hortelã na sala de estar da moradia dela.

Ao acessar o site, Kris também encontrou fotos de amigas próximas, junto com imagens de pelo menos outras 60 mulheres, muitas também da cidade de Sydney.

O parelha rapidamente percebeu que as fotos usadas para fabricar os deepfakes eram das contas privadas das redes sociais dessas mulheres. Foi aí que a ficha caiu: o responsável deveria ser alguém que todas elas conheciam.

Desesperados para desenredar quem estava por trás das ameaças, Hannah e Kris passaram horas na mesa da cozinha. Eles identificaram as mulheres, pesquisaram as listas de amigos em geral e construíram metodicamente um dossiê de evidências.

Em quatro horas, eles consolidaram uma lista com três suspeitos em potencial.

O primeiro, que foi descartado inicialmente por Hannah e Kris, era Andrew Hayler, um companheiro próximo da universidade. Os três se conheceram enquanto trabalhavam em um bar do campus —e a equipe de funcionários rapidamente formou amizades profundas.

Andy, porquê o chamavam, era o supervisor da equipe e funcionava porquê uma espécie de “gavinha” que unia todo o grupo. Hannah lembra que ele era atencioso e brando —o tipo de faceta que cuidava das mulheres no bar e se certificava de que as amigas chegassem em moradia com segurança depois de uma noite fora.

Eles saíam regularmente, passavam férias juntos, se amavam e confiavam uns nos outros. “Eu pensava em Andy porquê um companheiro muito próximo”, lembra Hannah. “Tínhamos tanta certeza de que ele era uma boa pessoa…”

Mas rapidamente a lista de suspeitos foi reduzida a um único nome: o de Andy.

Pânico e atrasos

Quando Hannah acordou na manhã seguinte e foi até a delegacia, ainda sob os efeitos do choque e do horror, ela ainda tinha um pouco de “otimismo ingênuo”.

“Nós pensamos que os polícias iriam pegá-lo naquela tarde”, rememora Kris, com um sorriso irônico no rosto.

Em vez disso, Hannah relata ter sido recebida com desdém. Ela se lembra de que um policial perguntou o que ela tinha feito para Andy. Em um momento, eles sugeriram que Hannah simplesmente pedisse para ele parar.

Mais tarde, os investigadores apontaram para uma foto em que ela usava uma roupa curta e comentaram: “Você está formosa nesta”. Procurada pela reportagem da BBC News, a polícia australiana se recusou a comentar os detalhes do caso.

Hannah diz que a maneira porquê sua queixa foi tratada a fez sentir porquê se provocasse “um grande escândalo por zero”. “Para mim, foi uma mudança de vida”, diz Hannah.

Qualquer esperança que ela ainda tivesse em uma ajuda da polícia diminuiu rapidamente. Em meio aos atrasos, ela recorreu ao Comissário de Segurança Eletrônica da Austrália. No entanto, sob os poderes de um órgão regulador, ele só ofereceu ajuda para remover o teor da internet.

Desesperados, Hannah e Kris contrataram um jurisconsulto e um comentador judicial do dedo para fazer as investigações caminharem. Enquanto isso, para não levantar suspeitas de Andy e garantirem a segurança, eles ficaram mais retraídos.

“O mundo pareceu permanecer menor para nós. Deixamos de falar com as pessoas. Não saíamos mais”, detalha Hannah.

O susto intenso e a solidão preencheram o vazio.

“Nós já tivemos que suspender nossas crenças e confianças para entender o que ele tinha feito até ali. Portanto [a ideia de] ele realmente vir para tentar estuprar ou machucar não parece um excesso tão grande.”

O parelha instalou câmeras por toda a moradia e configurou o rastreamento de localização nos dispositivos usados por Hannah.

Ela começou a portar um relógio inteligente, com rastreamento 24 horas por dia, 7 dias por semana, para que alguém soubesse se os batimentos cardíacos dela aumentassem —ou fossem interrompidos.

“Eu parei de terebrar as janelas porque estava com susto. Talvez alguém entrasse por elas”, explica Hannah.

“Nós dormíamos com facas nas mesas de cabeceira porque pensávamos: ‘E se?'”

Com o sentimento de desamparo pela polícia, Kris assumiu o fardo de fazer um monitoramento em procura do menor sinal de escalada do risco em relação a Hannah e a qualquer uma de suas amigas —que, para preservar a investigação, ainda não sabiam de zero.

A culpa consumia a dupla. “Tínhamos uma angústia estável sobre se era patente não recontar a elas”, lembra Hannah.

Num momento em que consideraram que a investigação policial havia sido completamente suspensa, Hannah e Kris desembolsaram ainda mais quantia para um relatório judicial detalhado e ameaçaram fazer uma queixa formal ao órgão que avalia a atuação da polícia na Austrália.

No totalidade, eles gastaram mais de 20 milénio dólares australianos (R$ 72 milénio, na cotação atual) para se proteger e parar Andy.

Finalmente, um novo detetive foi nomeado para o caso. Em duas semanas, a polícia invadiu a moradia de Andy e ele admitiu que era culpado.

Enxurrada de consolação depois do susto, Hannah começou a vincular para as pessoas próximas para dar a notícia.

“Meu estômago simplesmente embrulhou”, relata Jessica Stuart, ao relembrar o momento em que soube o que Andy havia feito com as fotos dela.

“Eu me senti realmente violentada, mas acho que não compreendi completamente.” Para ela, mais uma vez, o golpe mais duro foi que um companheiro que ela amava porquê “família” estava por trás do transgressão.

Andy sempre pareceu “tão modesto” e “muito atencioso” —alguém a quem ela ligou para pedir ajuda em um momento difícil. “Tem sido muito difícil conciliar que essas duas figuras são, na verdade, o mesmo sujeito.”

Um caso marcante

O caso de Hannah era um território incógnito para a Austrália.

Por pelo menos uma dez, especialistas alertaram que os avanços na tecnologia levariam a uma vaga de crimes com base na IA (perceptibilidade sintético). Mas as autoridades foram pegas de surpresa, ao deixar as vítimas de deepfake —predominantemente mulheres— vulneráveis.

Na estação em que Andy foi recluso em 2022, não havia nenhuma infração definida por fabricar ou compartilhar pornografia deepfake em qualquer lugar na Austrália, já que o país nunca havia lidado com um caso dessa magnitude antes.

Andy foi formalmente criminado de ameaçar, assediar ou promover ofensa —uma infração de plebeu nível para muitos crimes na internet— e Hannah foi avisada para manter as expectativas baixas sobre a pena.

“Estávamos preparados para ir ao tribunal e ele levar um tapa na mão [sinônimo de um castigo leve]”, compara ela.

Mas Hannah e as outras 25 mulheres que decidiram fazer secção do caso estavam determinadas a responsabilizar Andy. Uma em seguida a outra, várias deram declarações esmagadoras durante a audiência judicial, ocorrida no ano pretérito.

“Você não somente traiu minha amizade, mas destruiu a sensação de segurança que eu costumava tomar porquê certa”, afirmou Jess no tribunal.

“O mundo parece estranho e perigoso, estou sempre ansiosa e tenho pesadelos quando consigo dormir.”

“Formar novas amizades parece impossível, porque sou sobrecarregada pela pergunta: ‘Será que essa pessoa poderia ser porquê você?'”, complementou ela.

Quando chegou a hora de Andy se desculpar com as mulheres que ele tinha porquê intuito, Jess e Hannah não conseguiram suportar e saíram da sala.

“Não há zero que ele possa manifestar que melhore as coisas, e eu queria que ele soubesse disso”, diz Hannah.

Andy disse ao tribunal que fabricar as imagens pareceu “fortalecedor”, porquê se fosse “uma saída” para uma secção “obscura” de sua psique, mas ele afirmou que não achava que elas causariam danos reais.

“Eu realmente fiz uma coisa terrível e sinto muito”, lamentou ele.

A juíza Jane Culver não se convenceu do remorso de Andy. Na avaliação dela, embora houvesse “qualquer compunção”, ele não parecia entender o sofrimento claramente “profundo e contínuo” que sua ofensa “extensa” e “perturbadora” tinha causado.

Ela sentenciou Andy a nove anos de prisão —no que foi considerada uma decisão histórica.

“O suspiro que percorreu o tribunal [após a sentença] representou um consolação”, diz Jess. “Foi a primeira vez que senti que realmente fomos ouvidas.”

Andy terá a possibilidade de uma liberdade condicional a partir de dezembro de 2029, mas disse ao tribunal que pretende recorrer da sentença em outras instâncias.

Nicole Shackleton, perito em recta que pesquisa tecnologia e gênero, disse à BBC que o caso “sem precedentes” estabeleceu um precedente lítico surpreendente e significativo para casos futuros.

Segundo ela, que atua na Universidade RMIT de Melbourne, o julgamento reconheceu que “isso não foi meramente alguma coisa que aconteceu na internet” e que tal comportamento estava “ligado à violência offline contra mulheres”.

Na avaliação da perito, a Austrália e outros países continuam a apresentar deficiências na regulamentação do uso de IA e nas formas de investigar proativamente as novas tecnologias.

A Austrália recentemente criminalizou a geração e o compartilhamento de pornografia deepfake em todo o território vernáculo.

Mas muitos outros países têm legislações acusadas de sofrear brechas —ou não criminalizam a pornografia deepfake de forma alguma. E diante de forças policiais mal treinadas e com poucos recursos, muitas vítimas porquê Hannah precisam contratar detetives particulares ou fazer uma investigação por conta própria.

Em uma enunciação solene, a Polícia de Novidade Gales do Sul afirmou que as investigações sobre crimes de IA são um processo provocador, “que exige muito tempo e recursos”, e o treinamento foi reforçado recentemente “com o objetivo de que cada policial possa responder a esses tipos de crimes de forma eficiente”.

A polícia lugar também trabalha com o comissário de segurança online e empresas de tecnologia para concluir com o desfeita das deepfakes, acrescenta a enunciação.

A comissária de Segurança Online, Julie Inman Grant, disse que a remoção do material é a principal prioridade para a maioria das vítimas sobreviventes, alguma coisa obtido com “uma taxa de sucesso extremamente subida”.

Mas a comissária não tem poderes para prosseguir com investigações criminais e penalidades, acrescenta ela em uma enunciação enviada à BBC News.

“Você pode fabricar as leis que quiser, [mas] se você tiver uma força policial que seja incompetente…”, diz Kris, que parou a frase pela metade.

“Estamos obviamente bravos com Andy. Mas também é repugnante que a única maneira de obter justiça com alguma coisa assim seja se vocês forem duas pessoas na tira dos 30 anos que podem se dar ao luxo de intimidar a polícia.”

O parelha segue determinado a mudar as coisas para as futuras vítimas.

Unicamente nos últimos seis meses, dois estudantes australianos foram denunciados à polícia por supostamente fabricar imagens deepfake em tamanho de colegas de classe.

Depois de vários anos de inferno, Hannah também tenta seguir em frente.

Mas o apelo iminente de Andy prenúncio o trabalho duro que ela fez para reconstruir a vida e a saúde mental.

No sofá de sua moradia, com as pernas dobradas e os joelhos perto do peito, ela diz que Andy recebeu a sentença que merecia.

“Porque para mim e para as outras garotas, é para sempre… As imagens sempre estarão na internet”, destaca ela.

Hannah ainda paga por um serviço que vasculha a web em procura das fotos e se preocupa com futuros amigos, empregadores, alunos —e seus próprios filhos— encontrando as fotografias falsas.

Um de seus maiores temores é que suas melhores memórias nunca sejam recuperadas.

“Você posta coisas no Facebook e no Instagram porque são os momentos mais felizes da sua vida. Você ganha um cachorro, compra uma moradia, fica prometida e posta uma foto.”

“Ele transformou cada um desses momentos para nós em pornografia. E logo, quando você vê aquela imagem de novo… Muito, agora eu me vejo sendo estuprada.

Texto originalmente publicado cá.

Folha

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