Recentemente tomei a decisão de diminuir consideravelmente a minha presença nas redes sociais. Logo que coloquei a tal decisão em prática e abandonei o hábito nefasto de me obrigar a manar no Instagram diariamente, recebi mensagens perguntando se estava tudo muito. Porquê se minha reclusão do dedo talvez representasse uma reclusão também analógica, certamente decorrente de alguma fatalidade.
Não era o caso. Pelo contrário. A vida fora da internet estava boa. Não que eu estivesse com os pés para cima. Havia, evidente, os revezes normais da vida adulta, mas em meio a eles havia também belos dias de firmamento azul, risadas das crianças brincando na sala e música tocando na cozinha. A decisão de permanecer menos online era fruto de uma vontade de estar de corpo presente para viver aquela vida que se desenrolava ao meu volta. Era também um pedido de licença temporária para mim mesma deste trabalho (no meu caso em grande segmento não remunerado) que é produzir teor e a pressão de performance que vem a reboque dele. A cada post a permanente vigilância: quantos likes? Quantos compartilhamentos? Quantos seguidores a mais? Ou a menos?
Feliz com a minha mudança, ofereci explicações àqueles que se preocuparam com a minha repentina falta. E segui a vida.
Meses se passaram e, desobrigada da pressão de postar, voltei a manar nas redes ocasionalmente, uma foto ali, outra cá. E eis que recebo uma novidade mensagem: “Você parece triste nos últimos tempos. Vejo suas fotos e tenho a sensação de que você não está muito.”
Permita-me descrever a foto que que serviu de gatilho para que a tal pessoa tomasse a drástica atitude de me discursar sua preocupação. Nela eu aparecia deitada sobre a grama. Meus cabelos, recentemente tingidos de rosa, se esparramavam sobre o verdejante. O sol encostava na pele e os óculos escuros, posicionados na ponta do nariz, deixavam à mostra os olhos fechados. Por término, um sorriso humilde inclinava levemente os cantos da boca para cima. Se fechar os olhos hoje, semanas depois do momento vivido, consigo ainda sentir o calor suave do sol no rosto e ouvir o som da voz dos meus filhos procurando por insetos entre as flores.
A mensagem me intrigou por dias. De tantos momentos tristes que compõem a colcha de retalhos do cotidiano, aquele sem incerteza não havia sido um deles. Na verdade, nenhum dos momentos postados naquele retorno internético haviam sido tristes. Segmento do favor pessoal de não estar online a todo momento era a possibilidade de manter momentos tristes no contextura privado, caso esse fosse o meu libido. E, apesar de reconhecer que a exposição de nossas fraquezas e vulnerabilidades nas redes sociais é de extrema prestígio (e um tanto que já pratiquei muito num pretérito não tão distante), me permiti durante esse retorno soft ao Instagram, me poupar disso.
A pergunta portanto permanecia sem resposta. Será que eu estava triste e não sabia? Será que a felicidade da vida adulta, essa felicidade que convive com os boletos a serem pagos e a semi-constante dor na lombar, é simplesmente menos feliz? Talvez até um pouco triste?
Até que, dias depois, navegando por fotos alheias, me deparei com uma verosímil explicação. Em todas elas se via gente fazendo coisas dignas de compartilhamentos. Viagens a lugares onde é preciso ir de avião, pratos com os croquetes mais crocantes já fritos na face da terreno, eventos com playlists modernas, eventos com gente formosa, interessante e muito vestida, registrados por rolos de filme antigos pra dar um ar de nostalgia. Em todas uma felicidade que falava mais superior que a minha daquele sábado à tarde na grama.
Em contraponto, as tristezas que vejo salpicar minha timeline também são imensas, talvez também maiores do que essas que salpicam o meu dia a dia. E entre esses extremos, me pergunto se, em procura do clique, do engajamento, da performance do dedo, estamos esquecendo que rosto tem esse degradê de sentimentos que compõem a vida fora das redes.
Venho cá, portanto, exclusivamente lembrar a mim mesma que, na maior segmento dos dias, a felicidade tem mais feitio de silêncio do que de fogos de artifício, por mais que a vida nas redes faça parecer o contrário.
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