Morre Ney Latorraca, Que Marcou O Teatro E A Tv,

Morre Ney Latorraca, que marcou o teatro e a TV, aos 80 – 26/12/2024 – Ilustrada

Celebridades Cultura

Ney Latorraca, que marcou os palcos e as telas, com a verve irônica e o humor refinado, morreu, aos 80 anos, na manhã desta quinta-feira (26).

Ele estava internado, há seis dias, na Clínica São Vicente, na Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, e foi vítima de uma sepse pulmonar, em decorrência do tratamento de um cancro de próstata. A informação foi confirmada pelo hospital.

Antonio Ney Latorraca nasceu em Santos, no litoral paulista, em 27 de julho de 1944, rebento de cantores de cassino. Ele começou a atuar aos seis anos, numa radionovela da rádio Record. Fez sua estreia nos palcos em 1964, aos 20, numa encenação de “Pluft, O Fantasminha”, de Maria Clara Machado, também em Santos.

Pouco depois, Latorraca partiu para São Paulo e procurou grandes nomes do teatro dos anos 1960, uma vez que Flávio Rangel, Maria Della Costa, Cacilda Becker e Walmor Chagas. Participou de “Reportagem de um Tempo Mau”, de Plinio Marcos, mas a peça foi censurada e teve só uma encenação, no Teatro de Estádio, na região mediano de São Paulo.

Ao longo dos anos 60, fez pequenas participações em novelas uma vez que “Beto Rockfeller”, “Super Plá”, “Audácia, a Fúria dos Trópicos” e no teleteatro da TV Cultura, em produções uma vez que “Yerma”.

Em 1967, entrou para a Escola de Arte Dramática da USP, onde se formou em 1969 e teve Marilia Pêra uma vez que madrinha. Naquele ano, encenou “O Balcão”, de Jean Genet, dirigido por Victor Garcia. Nos anos 70, participou, nos palcos, do músico “Hair” e de “Jesus Cristo Superstar”. Ainda no início da dezena, foi contratado pela TV Record, onde esteve em cinco novelas.

Em 1975, fez sua estreia na Mundo, na romance “Escalada”, de Lauro César Muniz, uma vez que o playboy Felipe. No ano seguinte, viveu o rebelde Mederiquis da romance “Estúpido Cupido”. O personagem só se vestia de preto e circulava em uma lambreta batizada pelo ator de Brigitte.

Nos anos 80, participou das novelas “Chega Mais”, “Coração Alado” e “Um Sonho a Mais” e nas minisséries “Avenida Paulista”, “Rabo de Saia”, “Anarquistas Graças a Deus”, “Memórias de um Gigolô” e “Grande Sertão: Veredas”.

No teatro, dedicou-se a “Rei Lear” em 1983 e, três anos depois, começou a participar do sucesso “O Mistério de Irma Vap”. Ao lado de Marco Nanini e sob direção de Marilia Pêra, foram onze anos ininterruptos em edital.

No término dos anos 1980, Latorraca viveu um de seus personagens mais populares e marcantes: o velhinho Barbosa, de “TV Pirata”. “Quando era o Barbosa, nunca imaginei que seria aquele sucesso. Ninguém esperava que aquilo fosse funcionar uma vez que uma mudança [no humor]”, disse o ator em entrevista à Folha, em 2007.

Entre suas participações no cinema, destacam-se “O Ósculo no Asfalto” (1980), “Ópera do Malandro” (1982), “Ele, o Boto” (1986), “Sarau” (1989) e “Carlota Joaquina” (1995).

Nos palcos, protagonizou “O Médico e o Monstro” (1994), “Don Juan” (1995), “Quartett” (1996) e “O Martelo (1999). Em 2011, atuou em “A Escola do Escândalo”.

Nos anos 1990, fez sucesso uma vez que o Conde Vlad de “Vamp” (1991), em que contracenou com Claudia Ohanna. Antes e depois da romance, passou pelo SBT na minissérie “Brasileiras e Brasileiros” e em “Éramos Seis”. De volta à Mundo, participou de “Zazá” (1997), “O Cravo e a Rosa” (2000), “O Ósculo do Vampiro” (2002), “Da Cor do Perversão” (2004), “Bang Bang” (2005) e “Negócio da China”

Certa vez, Latorraca foi convidado para apresentar a cerimônia de entrega de uma edição do Prêmio Sharp de Música. Momentos antes de entrar no palco, tentou grudar um de seus dentes que havia quebrado com uma daquelas supercolas que colam tudo, até o dedo de quem a está usando.

E foi exatamente isso o que aconteceu com o artista. Seu dedo ficou firmemente recluso ao dente, mas nem por isso o ator se desesperou. Entrou no palco uma vez que se zero tivesse ocorrido, com uma secção da mão dentro da boca e a outra apoiada no queixo, posando de intelectual a refletir. Fez o que tinha para ser feito e saiu do palco sem nenhum resquício de gafe. O público achou que era mais uma de suas graças.

Entretanto, o leonino, que nasceu rotundo, com seis quilos, em 1944, “um ano antes do término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945)”, em Santos, litoral de São Paulo, reinou em sua extensão por ter batalhado uma vez que um soldado determinado a vencer na arte de interpretar.

Dois anos depois de ter nascido, uma simples “canetada” do logo presidente Eurico Gaspar Dutra (1883-1974) fez com que os pais de Latorraca perdessem o ocupação. Ambos trabalhavam apresentando-se em cassinos, que foram extintos pelo decreto-lei 9.215, de 30 de abril de 1946, que proibia os jogos de contratempo no Brasil sob o argumento de que eram degradantes para o ser humano. Degradante, no entanto, ficou a situação financeira da família.

O pai do ator, Alfredo, era crooner, e a mãe, Nena, corista. Os dois escolheram o ator Grande Otelo (1915-1993) para ser o paraninfo de batismo de Latorraca.

O ator contava que vivia em pensões e que seus pais nunca puderam dar a ele gibis ou brinquedos. “Meus pais eram pobres e deixavam isso simples. Não tinha essa de permanecer magoado. Eu brincava com uma caixa de charutos e achava o sumo. Me sentia secção de um trio interessante e dissemelhante”, falou o artista para a poste da jornalista Mônica Bergamo, da Folha, em 24 de setembro de 2017. Ainda em Santos, o artista ajudava os pais com o “dinheirinho” arrecadado com a entrega de marmitas no Instituto de Ensino Canadá, escola onde estudou e repetiu de série três vezes por conta da matemática.

Para se manter enquanto estudava e participava da montagem de algumas peças, o ator trabalhou em uma boutique feminina, além de ter sido funcionário em uma sucursal bancária.

TV E TEATRO

Latorraca sempre se dedicou a atuar no teatro e TV ao mesmo tempo. O primeiro trabalho do ator na televisão foi fazendo figuração na extinta TV Tupi. As novelas “Beto Rockfeller” (1968) e “Super Plá” (1969) contaram com a participação do artista.

No auge do movimento hippie no Brasil, na dezena de 1970, o artista atuou nas montagens teatrais de “Hair” (1970) e “Jesus Cristo Superstar”(1972), entre outras. Na TV, por indicação da atriz Lilian Lemmertz (1937-1983), o ator foi contratado pela Record para participar de novelas.

Latorraca ingressou na TV Mundo para fazer secção do elenco das novelas “Escalada” (1975) e “Estúpido Cupido” (1976), que lhe renderam notoriedade. Daí em diante, virou ator consagrado, com participação garantida em diversos folhetins. Em “Um Sonho a Mais” (1985), assegurou sua versatilidade ao interpretar cinco personagens diferentes, entre eles uma mulher, Anabela Freire, figura de grande sucesso na trama.

Segundo revelava frequentemente em entrevistas, seu comprometimento com o trabalho gerava uma sofreguidão, que era controlada por meio de um concentrado trabalho de preparação, antes de gravar uma cena em estúdio ou interpretá-la no palco. “Antes de dormir, deixo a roupa que irei vestir no dia seguinte em uma cadeira. Quando me levanto, visto a roupa e o personagem que tenho de interpretar”, dizia o ator, que reconhecia a preço de trabalhar em equipe e fazia questão de passar o texto com os colegas antes de ouvir a termo “ação”.

Latorraca costumava proferir que “a turma toda” deveria estar sempre afiada com ele em um trabalho, desde o motorista que o apanhava em mansão. “Pego o texto das mãos dele [motorista], marco, convertido com o diretor batendo as cenas e senhoril gravar o experimento, porque o primeiro sentimento é o mais fidedigno”, falava.

Para desempenhar personagens tão marcantes, o ator dizia trabalhar primeiro com sua percepção, antes de ler o texto ou saber de qualquer informação vinda do diretor ou responsável. O nome do personagem já indicava uma vez que ele deveria ser.

Quanto a seu próprio nome, o artista costumava galhofar que era Antônio Ney Latorraca e não “Neila”, uma vez que alguns desavisados o chamavam nas ruas. “Quando me chamam de ‘seu Neila’, envelheço 200 anos”, disse aos risos ao participar do programa de Jô Soares certa vez.

No teatro, integrou com o ator, diretor e produtor teatral Marco Nanini o grande sucesso “O Mistério de Irma Vap” (1984), que teve produção de Marília Pêra. A peça permaneceu nos palcos tapume de 11 anos, entrando para o “Guinness Book of Records” em 2003 uma vez que a peça em edital por mais tempo no Brasil. Em 2006, a história foi adaptada para o cinema.

Em 1990, o ator se desligou temporariamente da Rede Mundo para trabalhar na romance “Brasileiras e Brasileiros”, produzida pelo SBT. Em 1991, de volta à Mundo, o artista fez grande sucesso no papel de Conde Vlad, superintendente dos vampiros da romance “Vamp”, antes de retornar ao SBT para fazer o remake da romance “Éramos Seis”, em 1994.

Mesmo com um intenso trabalho na TV, Latorraca nunca abandonou o teatro. Ele participou de vários espetáculos, entre os quais estão “O Médico e o Monstro” (1994) e “Don Juan” (1995), sucessos absolutos de público e bilheteria.

Antes de entrar em cena, Latorraca não deixava de executar um ritual: pedia sempre proteção à mãe, que, segundo ele, sempre estava a seu lado. Quando perdeu a amiga Marília Pêra, de quem sentia tremendamente a falta, passou a invocá-la também antes da ação. “Falávamos todo dia”, comentava.

MUSICAIS

Além da participação na primeira montagem brasileira de “Hair”, com Antônio Fagundes e Sonia Braga no elenco, dividiu o palco com seu paraninfo, Grande Otelo, no músico “Lola Trigueiro” (1979).

Aos 73 anos, Ney Latorraca, ao lado da atriz Claudia Ohana, estreou no início de 2017, no Rio, o músico “Vamp”, adaptação da romance da Mundo de 1991, retomando o mesmo personagem para a alegria dos muitos fãs. O espetáculo também foi montando em São Paulo, repetindo o sucesso.

Foi nessa ocasião que Latorraca anunciou sua aposentaria dos palcos, mas logo em seguida a desmentiu por meio da poste da jornalista Mônica Bergamo, na Folha, no dia 24 de setembro de 2017: “Foi uma frase de efeito, para invocar a atenção. Para o foco prefulgir em mim. Para as pessoas me perguntarem justamente sobre isso”, disse o ator.

Latorraca gostava de atenção e reconhecimento. “Viver é muito intenso. Falar é intenso, remunerar boleto é intenso. Não consigo permanecer só contemplando”, dizia. “Simbolizar é uma grande trepada. Talvez a melhor de todas. Porque tem o ovação no término. É o que me mantém, me dá tesão, é o ovação. Eu adoro.”

A complicação que enfrentou por desculpa de uma cirurgia na vesícula, em 2012, foi para o ator “um divisor de águas”. “Todo mundo achava que eu ia morrer. Mas voltei. Poucas pessoas têm essa segunda vida”, disse o ator em entrevista na qual afirmou que havia parado de fumar há 14 anos e que não bebia mais.

Latorraca também afirmava não ter susto da solidão. “Da morte, sim. Ela vai tirar de mim as coisas que eu tenho e que são lindas”, afirmou o ator, morto nesta quinta (26), que pretendia deixar seu patrimônio para quatro instituições de sustento a artistas e a doentes. Ele deixa o marido Edi Botelho, com quem foi casado por 30 anos.

Folha

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