Morre wlamir marques, 87, gigante da história do basquete

Morre Wlamir Marques, 87, gigante da história do basquete – 18/03/2025 – Esporte

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O menino Wlamir, de dez anos, tinha terminado de mudar de vivenda em São Vicente, cidade do litoral paulista onde nasceu. Seus novos amigos batiam uma globo laranja e o chamaram para se juntar a eles. “Eu pulei o muro. E nunca mais saí de uma quadra de basquete”, contaria depois, recordando o momento em que despertou para sua vocação.

Wlamir Marques morreu nesta terça-feira (18), em seguida um período internado na UTI de um hospital pessoal de São Paulo. A informação foi divulgada pela CBB (Confederação Brasileira de Basquete). “Wlamir deixa um legado eterno, sendo lembrado porquê um dos maiores atletas a simbolizar o Brasil no esporte mundial”, escreveu a entidade.

Partiu porquê um dos maiores nomes da história do basquete –ou do basquetebol, porquê preferia– no Brasil. Provavelmente, porquê apontam muitos estudiosos da modalidade, o maior.

O polivalente fileira de 1,85 m foi bicampeão do mundo com a seleção brasileira e vice em duas oportunidades. Expoente de uma geração histórica, atuou entre os anos 50 e 60 com nomes porquê Amaury, Ubiratan e Rosa Branca e conquistou duas medalhas olímpicas. Uma trajetória mais do que suficiente para incluí-lo –muito tardiamente, é verdade, somente em 2023– no Hall da Notabilidade da Fiba (Federação Internacional de Basquetebol).

O talento o levou ao XV de Piracicaba e, de lá, ainda juvenil, à seleção. Já era um nome muito estabelecido no time pátrio quando, às vésperas do Mundial de 1959, abandonou a concentração para seguir o promanação de um de seus filhos, também Wlamir. Separado pelo disciplinador Togo Renan Soares, técnico mais publicado porquê Kanela, acabou sendo reconvocado.

“Voltei porquê se não tivesse realizado zero. Foi um ato de rebeldia. Concordo que merecia ter sido rachado, mas foi tudo de cabeça pensada. Não me arrependo. Depois que ganhamos o Mundial e estávamos voltando ao Brasil, o Kanela se sentou ao meu lado no avião e disse: ‘Alemãozinho, quase que nós jogamos tudo isso fora’”, recordou, em entrevista à Folha em 2019.

A saborosa conquista no Chile provavelmente não teria sido verosímil sem a desclassificação da invicta União Soviética –no contexto da Guerra Fria, os soviéticos se recusaram a enfrentar Formosa (hoje Taiwan), que jogava porquê pátria independente da China. Mas, em 1963, no Rio de Janeiro, no maior momento do basquete brasílico, não houve asteriscos.

O Brasil ganhou todos os jogos que disputou no Maracanãzinho, sacramentando o triunfo com uma vitória por 85 a 81 sobre os Estados Unidos, de Willis Reed, com cesta decisiva de Wlamir. De convénio com Nelson Rodrigues, cujos olhos míopes se encheram com a sarau que tomou conta do Rio, observou-se uma embriaguez coletiva antes só provocada pelo futebol. “A cada passo, via-se um brasílico com a faceta civicamente entornada na sarjeta. […] O basquete nos deu os seus primeiros bêbados”, escreveu o historiador, em O Orbe.

“Aquilo foi um negócio que foi crescendo. No primeiro jogo, não tinha tanta gente. Mas a gente foi ganhando, fomos campeões invictos. No jogo final, tinha gente pendurada em todos os cantos do Maracanãzinho, e nem é o Maracanãzinho de hoje, cabia muito mais gente. Teve invasão no termo. É uma memorial muito boa”, disse o Diabo Loiro, porquê era chamado o craque, em entrevista à Folha em 2023.

Ele sempre fez questão de valorizar também os dois vice-campeonatos mundiais da seleção, obtidos em 1954 e 1970. Suas medalhas de bronze nos Jogos Olímpicos de 1960, em Roma, e de 1964, em Tóquio, onde foi porta-bandeira, ajudam a erigir um currículo sem verdadeiro paralelo no basquete mundial, não só o brasílico.

Também não há um jogador de basquetebol do Brasil tão reconhecido por um clube quanto Wlamir é pelo Corinthians. Os boleiros Neco, Teleco, Cláudio, Luizinho, Baltazar, Basílio, Rivellino, Zé Maria, Wladimir, Sócrates, Ronaldo (o goleiro, óbvio) e Marcelinho têm bustos na sede social da junta, o Parque São Jorge. Wlamir não tem só um busto. O busto está no ginásio que é chamado desde 2016 de Ginásio Poliesportivo Wlamir Marques, o Wlamirzão. Nenhum jogador do time usa a camisa 5, aposentada em honra ao maior.

“A emoção de o Corinthians ter oferecido o meu nome ao ginásio é a maior que eu poderia ter recebido na minha vida esportiva”, repetiu muitas vezes Wlamirzão, que, morador da zona leste paulistana, virou frequentador assíduo do Wlamirzão. Viu, por exemplo, à cercadura da quadra, a sonhada conquista da Liga Vernáculo de Futsal, em 2016.

Não há nenhum excesso na coroação a um ídolo estimado pelo talento e por ter sido o portador da alegria preta e branca em um momento no qual o futebol alvinegro vivia o seu pior momento, em meio a 23 anos de jejum. Se a equipe do gramado não ganhava zero, aquela que tinha Wlamir na quadra ganhou três edições do Brasiliano (1965, 1966 e 1969), cinco do Paulista (1964, 1965, 1966, 1968 e 1969), sete do Paulistano (1964, 1965, 1966, 1967, 1968, 1969 e 1970) e três do Sul-Americano (1965, 1966 e 1969).

O jogo mais emblemático, porém, nem valeu título. Em 1965, o logo bicampeão europeu Real Madrid visitou a América do Sul e fez uma partida contra o Corinthians no Parque São Jorge. Wlamir precisou tomar injeções para moderar uma reação alérgica que o impedia de terebrar os olhos e marcar ao menos 40 pontos– o zelo estatístico não era o atual, e o próprio fileira dizia ter anotado 51– na vitória preta e branca por 118 a 109.

“Foi o maior jogo de basquete que eu fiz na minha vida”, resumiu o Disco Voante, outro dos apelidos do cidadão emérito de São Vicente que fincou raízes no Parque, onde será vizinho eterno de Neco, Luizinho e Sócrates.

O menino pulou o muro.

Folha

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